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Astrofísica

Comendo estrelas

Levantamento mostra que Via Láctea canibalizou 11 galáxias vizinhas

NASA / JPL-Caltech / R. Hurt, SSC & Caltech Ilustração representa correntes de estrelas ao redor da galáxiaNASA / JPL-Caltech / R. Hurt, SSC & Caltech

Cerca de 200 milhões de anos após o Big Bang, a explosão inicial que teria dado origem ao Universo 13,8 bilhões de anos atrás, as primeiras estrelas do que viria a ser a Via Láctea começaram a se juntar. Desde então, a galáxia não para de crescer. Por volta de 9 bilhões de anos atrás, por exemplo, seus característicos braços espirais surgiram. Um novo estudo indica que, ao se expandir e atrair matéria de suas redondezas, a Via Láctea canibalizou estrelas de 11 galáxias vizinhas de menor porte. Sua força de gravidade, em especial a do halo de matéria escura (não visível) que deve envolver a galáxia, arrancou populações de estrelas desses pequenos sistemas e as atraiu para sua órbita. Assim se formaram 11 correntes ou rios de estrelas, de origem externa, que giram em torno da Via Láctea, sem estar incorporados a seus braços ou a sua parte central, o bojo. “Essas correntes nos contam sobre a formação e a estrutura da Via Láctea”, afirma Nora Shipp, aluna de doutorado da Universidade de Michigan, nos Estados Unidos, primeira autora do estudo que está disponível no repositório arXiv.

A identificação dessas correntes de estrelas foi feita pelo Dark Energy Survey (DES), levantamento internacional, com a participação do Brasil, que tem como meta estudar a natureza da misteriosa energia escura, responsável por 71% do Universo (a matéria escura responde por 24% e a matéria normal ou bariônica, a dos astros e estrelas visíveis, por 5%). É a energia escura que faz a taxa de expansão do Cosmo se acelerar. Para tentar entender essa componente majoritária, mas enigmática do Universo, o DES procura por padrões que possam explicar a formação das estruturas cósmicas. Por isso, o levantamento produz imagens periódicas, de alta resolução, de uma área que corresponde a um oitavo do céu observável. Com o emprego de uma potente câmera de 570 megapixels instalada no telescópio Blanco, situado no Chile, o DES mapeou em seus três primeiros anos de funcionamento (de 2014 a 2016) 400 milhões de objetos astronômicos, como galáxias e estrelas do tipo supernova.

Um dos objetos estudados foi a Via Láctea. Foi assim que os restos das 11 galáxias foram identificados. “Como os cometas que deixam rastros quando passam perto do Sol, essas correntes de estrelas são resquícios dessas galáxias que foram engolidas pela Via Láctea”, compara o astrofísico Márcio Maia, do Laboratório Interinstitucional de e-Astronomia (Linea), que dá suporte à participação brasileira no DES e em outros levantamentos. Coautor do estudo sobre a Via Láctea, Maia conta que a cor das correntes de estrelas descobertas é diferente da maioria das estrelas da galáxia. Pela variação de tom, os astrofísicos conseguiram inferir a composição química e determinar que as correntes se originaram fora da Via Láctea. Até agora, cerca de 30 correntes de estrelas, com origem fora da galáxia, foram descobertas.

Artigo científico
SHIPP, N. et al. Stellar streams discovered in the dark energy survey. arXiv. On-line. 9 jan. 2018.

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