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Carta da editora | 24

Um divórcio a ser superado

Alta qualidade e volume significativo da produção de Ciência e Tecnologia, combinados com capacidade contínua de expansão das fronteiras do conhecimento, são, indiscutivelmente, características marcantes das sociedades mais avançadas, no presente. Mas não menos marcante, parece-nos, é a capacidade de a maior parte da população, nessas sociedades, perceber a importância das inovações introduzidas em sua vida cotidiana pelo desenvolvimento científico e tecnológico.

Certamente não é confortável, talvez nem mesmo simpático, citarmos com excessiva freqüência os Estados Unidos para ilustrarmos determinada afirmação. Mas uma vez que, dentre os países mais desenvolvidos, é justamente desse que temos mais à mão estatísticas de toda espécie, admitamos uma vez mais o velho recurso. Feita a ressalva, o que queremos dizer é que possivelmente guarda estreita relação com a percepção geral do valor das inovações tecnocientíficas, o fato de os cientistas figurarem hoje como o segundo grupo profissional de maior prestígio junto à população norte-americana, posição só superada pelos médicos. Levantamento realizado este ano, pela National Science Foundation-NSF, chegou uma lista de 15 profissões de maior prestígio, onde os médicos receberam 87% das indicações e os cientistas, 86%.

Assim, há indícios fortes de que um dos pressupostos de uma sociedade efetivamente avançada é uma certa proximidade ou relação de identidade entre a população como um todo e sua elite produtora de conhecimentos e inovações – e não a espécie de divórcio ou fosso entre os dois níveis, a que de certo modo terminamos por nos acostumar no Brasil. Vale a pena retratar aqui que um sentimento de identidade não se constrói sem informação, e que um padrão geralelevado de educação na sociedade funciona como o melhor caldo de cultura para o surgimento contínuo de novas pesquisas em todos os campos e, principalmente, para o aparecimento de novos pesquisadores – cientistas e tecnólogos.

Quando o divórcio se estabelece entre produtores e potenciais usuários de C&T, estes só podem se relacionar com os “inexplicáveis” avanços científicos que terminam por alterar sua própria vida, com base na crença, e não no conhecimento, como é próprio desse campo. Trata-se, sem dúvida, de um relacionamento, anti-democrático e nada estimulante ou útil ao desenvolvimento social.

Por isso, seria de enorme significado num país como o Brasil – que hoje conta com apenas 4 cientistas e engenheiros por grupo de 10 mil habitantes, contra 41 no Japão, 38 nos Estados Unidos, 28 na Alemanha, 23 na França, etc – que cada pesquisador, ao definir um projeto de pesquisa, se preocupasse também com o processo de transferência do conhecimento para a sociedade como um todo. Ou seja, que se detivesse um pouco na questão sobre como aquilo que elo pesquisa poderá ser difundido para contaminar positivamente o campo mais amplo da educação – seja pelos canais tradicionais dirigidos para as crianças e jovens, seja pelos mais modernos, que atingem as mais diferentes faixas etárias, usando meios como a televisão, poe exemplo.

Aliás, levantamento da mesma NSF, feito em 19985, revela que os programas de C&T, na televisão, são a primeira fonte de informação do público, sobre Ciência e Tecnologia. (selecionados por 65% das pessoas ouvidas), seguidos de perto pelos noticiários de tv (cerca de 63%) e pelos museus de C&T (aproximadamente 61%). A cotação de outros meios é mais baixa: jornais, 46%; bibliotecas públicas, 41%; noticiários de rádio, 24%; revistas noticiosas, 20% e revistas de C&T, 10%.

São pontos que merecem reflexão quando não se pretende manter Ciência e Tecnologia como objeto de culto, mas como alavanca poderosa para o desenvolvimento social e econômico.

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