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Carta do editor | 37

A fé revigorada pela comunidade científica

A resposta da comunidade científica ao programa de Políticas Públicas, lançado há poucos meses pela FAPESP, foi surpreendente, qualquer que seja o parâmetro que se utilize para avaliar essa reação. Igual, se não melhor, no sentido de mais vigorosa ainda, foi a resposta dessa comunidade ao programa dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão Tecnológica, Cepids, também recentemente lançado.

De fato, nem os mais otimistas entre os responsáveis pela formulação e implementação dos dois novos programas ousaram prever qualquer número próximo daqueles que informam o número de propostas que terminaram sendo encaminhadas à Fundação para um e outro: são 227 projetos de pesquisa ligados a políticas públicas, que a FAPESP terá de analisar, e nada menos que 114 projetos de Cepids.

Ante esses números, mesmo quem reconhece a existência de uma especialíssima sintonia fina entre a FAPESP e o universo da pesquisa científica e tecnológica em São Paulo, que facilita à instituição a percepção antecipada de novas necessidades de investigação, ou de novas demandas ainda mal e mal expressas, pergunta-se como dessa vez foi possível tamanha precisão de alvo, como a Fundação conseguiu lançar-se, em cheio, bem no centro de um movimento de forças em formação, imperceptível para muitos, e captá-lo, impelindo sua objetivação na forma de novas propostas de pesquisa. Bem, vamos reconhecer que dessa vez a FAPESP acertou no que viu, mas também no que ainda não via.

E o que não via nitidamente era esse mover de forças revelado pelos números dentro dos dois programas. Sem possibilidade ainda de conclusões fechadas, pode-se arriscar que se trata do movimento vigoroso de forças que apostam – mais que isso, acreditam – que é possível empurrar a atividade de pesquisa no Brasil para um patamar mais alto, ambicioso, ousado. Pode-se arriscar que se está diante de uma potência, de certo modo desconhecida até começar a ser desvendada pela ousadia de uma proposta como a do Programa Genoma FAPESP, que agora se reafirma, se reapresenta, para responder a novos e diferentes desafios, capazes de provocar essa desejada escalada da pesquisa. E, claro, romper com a visão mesquinha, acanhada e provinciana sobre as reais possibilidades em C&T desse país ao sul do Equador, região da qual, diga-se, o mundo se acostumou a não esperar muita coisa.

Observe-se: 114 diferentes grupos de pesquisa no Estado de São Paulo consideram-se prontos para organizar, cada um, um avançado centro de pesquisa, inovação e difusão tecnológica, que, depois de um prazo de decisivo apoio financeiro, se tornará produtivo e auto-suficiente, no melhor estilo dos melhores centros de pesquisa dos países mais desenvolvidos. Será certamente tarefa dificílima para a FAPESP, dentre as excelentes propostas apresentadas, escolher apenas uma dezena que poderá ter seu apoio institucional ao longo de até 11 anos.

Veja-se mais: 227 grupos de pesquisa mostram-se prontos a articular concretamente e de maneira direta, com seu trabalho, pesquisa e bem-estar social – o que revela uma visão de extrema maturidade sobre a função social da pesquisa. E demonstra também disposição de levar adiante uma prática nova, num universo em que, não faz muito, levantava-se como maior valor a liberdade do cientista para escolher seus temas, reduzindo-se aqui liberdade a uma certa idéia de individualismo socialmente descompromissado. Registre-se que, dessa prática nova, faz parte a parceria de pesquisadores com entidades governamentais e ONGs, que dá a garantia de que os resultados dos projetos desenvolvidos serão efetivamente usados nas políticas públicas, em benefício da sociedade

Ora, num momento de conjuntura difícil, de justificado temor de profundos retrocessos econômicos e sociais, esse vigor com que a comunidade científica em São Paulo se apresenta para um desafio formulado pela FAPESP é, no mínimo, alentador. Para além dos desarranjos conjunturais e das perversidades estruturais da sociedade brasileira, há nas entranhas dessa mesma sociedade forças de transformação e de aposta no futuro de que os pesquisadores paulistas dão claras indicações.

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