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Memória

Homenagem a Ulhôa Cintra

Médico e pesquisador, professor e formador de várias gerações de discípulos, um formulador de política científica. Assim foi Antonio Barros de Ulhôa Cintra, um dos principais responsáveis pela criação da FAPESP, em 1960, e seu primeiro presidente. Falecido em dezembro passado, o Museu Histórico da Faculdade de Medicina da USP e a Sociedade Brasileira de História da Medicina o homenagearão, no próximo dia 4 de junho, com a inauguração de seu retrato na galeria de grandes mestres da Medicina brasileira.

O professor Ulhôa Cintra nasceu em São Paulo, a 13 de setembro de 1907, tendo-se diplomado em 1930 pela Faculdade de Medicina e Cirurgia de São Paulo. Iniciou suas atividades no antigo Instituto de Higiene da Faculdade de Medicina, tendo, logo em seguida, começado a trabalhar simultaneamente no serviço de Pediatria da Santa Casa de Misericórdia. Em 1933, foi designado para a cadeira de Pediatria da Faculdade de Medicina, exercendo também as funções de responsável pelo laboratório de Clínica. Assumiu, em 1936, a cadeira de Clínica Médica, obtendo, em 1940, o primeiro lugar em concurso para livre-docência, com a tese Contribuições para o Estudo da Exploração Funcional do Fígado.

Mas, segundo o médico Emílio Mattar, em artigo publicado na Revista do Hospital das Clínicas, por ocasião das comemorações dos setenta anos do Prof. Ulhôa Cintra, ele foi, antes de tudo, “um investigador clínico da mais elevada qualificação”. Antes mesmo de se diplomar, começou a interessar-se por bioquímica, tendo estagiado no Laboratório de Química Fisiológica. E, posteriormente, em suas atividades, passou, ainda segundo Emílio Mattar, a introduzir uma “nova metodologia de investigação, com a aplicação das ciências básicas aos problemas clínicos”.

Seus trabalhos acabaram por levá-lo aos Estados Unidos, em 1941, com bolsa de estudos da Fundação Rockfeller. No Massachusetts General Hospital, da Universidade de Harvard, trabalhou com Füller Albright, considerado um dos mais importantes investigadores clínicos. Naquele país, estudou ainda no Pratt Diagnostic Hospital, em Boston. Em 1943, já no Brasil, foi nomeado médico chefe do Serviço de Moléstias da Nutrição e Dietética do Hospital das Clínicas, que ele organizou e chefiou até 1950. Ali, aplicou métodos de pesquisa bioquímica ao estudo de anormalidades metabólicas e orientou a formação de clínicos, químicos e analistas especializados em problemas de metabolismo, nutrição e endocrinologia, sendo um pioneiro nessa disciplina, no Brasil.

Em 1948, com uma segunda bolsa, estagiou em diversos hospitais dos Estados Unidos e do Canadá. No ano seguinte, assumiu a cátedra de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da USP, com a tese Doenças Ósseas Metabólicas. Até 1982, segundo o professor Carlos da Silva Lacaz, havia publicado 168 trabalhos de pesquisa clínica.

“O Professor Ulhôa Cintra liderou e foi, em grande parte, responsável pela formação de uma jovem equipe de investigadores que, primeiro no Serviço de Moléstias da Nutrição e, depois, na 13ª Cadeira da Faculdade de Medicina, se constituiu num dos mais ativos e produtivos centros de pesquisa do país”, escreveu Emílio Mattar, que foi seu assistente.

A Reitoria e a FAPESP
Seu dinamismo e sua visão da importância da pesquisa científica levaram-no, em 1960, ao cargo de Reitor da Universidade de São Paulo. De acordo com Hélio Pereira Bicudo, em depoimento prestado ao Projeto FAPESP – História e Memória, “a escolha de Antonio Barros de Ulhôa Cintra para Reitor da USP deu-se dentro da linha desse pensamento, de dar uma estrutura moderna à Universidade, capaz de torná-la num grande centro de pesquisa e ensino”. Teve participação decisiva na implantação do campus da USP, e na elaboração da lei de criação da Universidade Estadual de Campinas e da Faculdade de Ciências Médicas de Botucatu.

A criação da FAPESP, pela Lei 5.918, sancionada a 18 de outubro de 1960 pelo governador Carlos Alberto de Carvalho Pinto, também teve a participação do professor Ulhôa Cintra. Aliás, segundo o professor Alberto Carvalho da Silva, ex-presidente da Fundação, em depoimento publicado em Cientistas do Brasil, “ele teve uma influência decisiva nessa medida de Carvalho Pinto.”

“Sancionada a lei que instituia a Fundação de Amparo à Pesquisa, determinava-se um prazo de 90 dias para serem tomadas as medidas cabíveis. Como reitor da USP, Ulhôa Cintra foi incumbido pelo governador de tomar as medidas necessárias para o funcionamento da Fundação”, escreveram Amélia Império Hamburger e Walquíria Chassot em Projeto FAPESP – História e Memória (no prelo). As reuniões para a organização da Fundação realizavam-se no gabinete do reitor, naquela ocasião localizado na rua Helvétia. E ao ser formado o primeiro Conselho Superior da FAPESP, Ulhôa Cintra foi eleito seu presidente, cargo no qual se manteve até 1973.

Em depoimento prestado ao Projeto FAPESP – História e Memória, Antonio Barros de Ulhôa Cintra falou sobre o significado da criação da FAPESP para a comunidade científica: “Era simplesmente uma abertura enorme para quem trabalhava em ciência, de poder ter amparo para continuar a trabalhar. (…) A FAPESP foi criada para amparar a ciência que se quisesse realizar. A ciência é que ia bater à porta da Fundação para dizer qual o projeto que tinha”.

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