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FÍSICA

Na linha de frente

Participação em projetos internacionais e visão de futuro: sinais de progresso

Nanofios de ouro: possível substituição dos atuais chips de silício

SÍRIO J. B. CANÇADONanofios de ouro: possível substituição dos atuais chips de silícioSÍRIO J. B. CANÇADO

O físico Carlos Ourívio Escobar, professor do Departamento de Raios Cósmicos da Unicamp, divide seu tempo entre as aulas dadas no populoso município de Campinas e as viagens a uma região semidesértica na Cordilheira dos Andes. Escobar é coordenador do projeto temático Observatório Pierre Auger, o observatório que está sendo instalado em Pampa Amarilla, Argentina, por 250 cientistas de 19 países. “É simplesmente o maior laboratório de estudo de raios cósmicos do mundo”, anima-se o pesquisador. Tem o desafio de decifrar as misteriosas partículas de altíssima energia que viajam 150 milhões de anos-luz antes de atingir a Terra, como um chuveiro cósmico – daí a importância da participação brasileira. “Só em São Paulo, temos oito pós-doutores com bolsa da FAPESP, cinco docentes e seis pós-graduandos da Unicamp, e um docente da USP participando desse temático”, enumera.

O Pierre Auger estudará um fenômeno astrofísico raro: as partículas de altíssima energia chegam à Terra na freqüência de apenas uma por século, por quilômetro quadrado. Um conjunto de 1.600 detectores vão captá-las, fornecendo subsídios para o estudo desse fenômeno ainda bastante desconhecido pela ciência.

Detalhe da estrutura do Observatório Pierre Auger: participação brasileira em projeto internacional que estudará misteriosos raios cósmicos

MIGUEL BOYAYANDetalhe da estrutura do Observatório Pierre Auger: participação brasileira em projeto internacional que estudará misteriosos raios cósmicosMIGUEL BOYAYAN

Segundo o professor Escobar, o Pierre Auger é um projeto de ponta que agrega várias áreas de conhecimento, como astrofísica, cosmologia e física de partículas. Por isso, tem enorme potencial de formação de recursos humanos, o que sempre foi prioridade nos projetos financiados pela FAPESP. Foi por intermédio de projetos como esse, avalia Escobar, que se formaram alguns dos físicos mais atuantes que temos hoje nas universidades. Ele toma como exemplo o projeto 93/05607 (o número ainda está na ponta da língua) de física de altas partículas que desenvolveu com apoio da FAPESP, em 1993. “Coordenei o primeiro grupo brasileiro a levar instrumentação feita totalmente no Brasil para um projeto no exterior”, lembra Escobar.Na época, conta o pesquisador, os projetos temáticos não abrigavam pós-doutores.“Tive que desenvolver todo o projeto só com alunos de iniciação científica”,o que, hoje, lhe é motivo de orgulho: “Com exceção de dois alunos, que mudaram de área, todos estão dando aula em faculdade”.

Não é só por essa iniciativa, porém, que a física brasileira vem recebendo reconhecimento internacional. A Physical Review Letters, uma das publicações especializadas de física mais importantes do mundo, reservou, em dezembro de 2001, sua capa para o pioneirismo de três físicos brasileiros. Edison Zacarias da Silva, da Unicamp,Adalberto Fazzio e Antônio Roque da Silva, ambos da Universidade de São Paulo, foram capazes de desvendar o comportamento de átomos de nanofios de ouro, estruturas que medem bilionésimos de metro. Por meio de uma simulação de computador – única maneira de trabalhar com fenômeno em escala tão pequena – eles demonstraram a maneira como os nanofios de ouro se rompem quando são estirados além do limite: partem de uma estrutura hexagonal para uma única linha com cinco átomos até o rompimento. A pesquisa tem importância estratégica para a próxima geração de computadores. A ductibilidade do ouro – sua capacidade de ser estirado longamente sem se partir – é um dos fatores que podem torná-lo material perfeito para formar os contatos elétricos entre os novos componentes que substituirão os chips de silício. Além da descoberta em si, a própria ferramenta do estudo, a simulação computacional, é um importante passo rumo ao futuro: além da nanotecnologia, será fundamental para as áreas de nanoquímica e nanobiologia

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O Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica desenvolve feixes de laser com aplicação médica

MIGUEL BOYAYANO Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica desenvolve feixes de laser com aplicação médicaMIGUEL BOYAYAN

Vanguarda e aplicação: receita de equilíbrio

Aliar pesquisa de ponta com formação educacional é, hoje, uma das metas mais arrojadas da Fundação, sistematizada por meio de seus Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids). Em número de dez, atualmente, esses centros terão a responsabilidade de desenvolver pesquisas inovadoras e multidisciplinares em várias áreas do conhecimento e transmiti-las à sociedade, seja contribuindo para a formação de novas empresas, seja promovendo atividades educacionais.Um bom exemplo dessa atuação é o Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica, formado por pesquisadores do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), do Instituto de Física da Universidade de São Paulo (USP), em São Carlos, e do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen). Pensado, a princípio, como dois centros autônomos, óptica e fotônica uniram-se para estudar juntos os fenômenos da óptica e suas aplicações nas áreas de telecomunicações, biologia, medicina e física atômica.

No Instituto de Física da USP-São Carlos, o pesquisador Vanderlei Bagnato lidera um grupo de quase 30 pessoas, entre físicos,médicos e biomédicos, que desenvolve um feixe de laser para ser usado em terapia fotodinâmica, um novo método terapêutico empregado no tratamento de pacientes de câncer. A terapia fotodinâmica pode ser usada em alguns casos para substituir cirurgias e até em tratamentos por quimioterapia e radioterapia, evitando os efeitos colaterais indesejáveis desses métodos terapêuticos convencionais. O laser atinge o tumor sem deixar cicatrizes nem provocar perda de cartilagem ou afundamento do local tratado.

No Laboratório de Fotônica da Unicamp, dirigido pelo físico Carlos Henrique de Brito Cruz, reitor da Unicamp e presidente da FAPESP, os recursos do laser também foram utilizados para produzir “ferramentas” de grande interesse para o setor biomédico. Elas se baseiam na capacidade que os feixes de laser têm de capturar, mover ou recortar componentes de uma célula.Além de permitir a manipulação de células vivas sem causar nenhum dano, o laser também pode ser usado para medir propriedades mecânicas e forças muito pequenas em sistemas biológicos, como a viscosidade de fluidos e a elasticidade de membranas celulares. O coordenador do estudo, professor Carlos Lenz César, espera expandir a técnica do uso da pinça e do bisturi óptico, que pode se tornar uma ferramenta básica na área de biotecnologia.

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A força do jovem pesquisador

Criado em 1995, o Programa de Apoio a Jovens Cientistas em Centros Emergentes, ou Apoio a Jovens Pesquisadores, concede bolsas a doutores que acabaram de se formar. O objetivo é incentivar sua permanência no estado e contribuir para a formação de novos núcleos de pesquisa em centros emergentes. Os projetos aprovados podem ter a duração de até quatro anos e representam o começo da carreira-solo de pesquisadores que, até pouco tempo, tinham o respaldo de seus orientadores. Por isso, eles trazem a especial dedicação de quem quer se firmar na carreira, buscando qualidade com criatividade. A seguir, uma pequena amostra dos projetos apresentados:

Projeto: Pesquisa em Visão Cibernética.
Autor: Luciano da Fontoura Costa, professor da Universidade de São Paulo, campus de São Carlos.

O engenheiro eletrônico com especialização em física dedicou-se a estudar modelos biológicos para desvendar a visão e depois ensiná-la a um computador. Hoje, como líder do Grupo de Pesquisa em Visão Cibernética, ele já produziu várias publicações sobre o assunto e trabalhos instigantes, como os neurônios virtuais, que criam vida própria dentro do ambiente virtual e podem ser controlados de acordo com as regras inferidas da pesquisa com células reais. Sua equipe também já construiu um olho mecânico com base no sistema visual de uma aranha. Atualmente, trabalham no desenvolvimento de um sistema de diagnóstico de leucemia.

Projeto: Implementação de Microelementos Ópticos Difrativos.
Autor: Luiz Gonçalves Neto, professor da Escola de Engenharia de São Carlos e Escola Politécnica, ambas da Universidade de São Paulo.

Gonçalves Neto conduziu dois grupos de pesquisadores a um prêmio internacional na área de óptica refrativa: o primeiro lugar na categoria Divisão Artística da versão 2000 do Diffractive Beauty Contest (Concurso de Beleza Difrativa), realizado em Quebec, no Canadá, e promovido pela Optical Society of America (OSA). O trabalho que ele coordenou chamou tanto a atenção dos participantes da mostra que formou fila na demonstração. As duas imagens projetadas (uma borboleta e uma cabeça de águia) criadas com a utilização de um feixe de luz laser, tinham uma qualidade incomum para a tecnologia empregada. A óptica difrativa utiliza técnicas que modificam um feixe de luz para criar uma nova fonte luminosa. Ela permite desenvolver tecnologias para fabricar, por exemplo, fotodetectores de câmaras fotográficas digitais, hologramas impressos em cartões de crédito, imagens artísticas e publicitárias.

Projeto: Estudo do Equilíbrio Postural e da Marcha de Idosos em Ambiente Terrestre e Aquático.
Autor: Marcos Duarte, professor da Faculdade de Educação Física da USP.

Baseado na teoria do caos, o físico Marcos Duarte propôs um modelo pelo qual se pode ensinar um robô a controlar uma bolinha de tênis. A habilidade da máquina equipara-se a de uma criança de dois anos. E já está ótimo assim. O movimento corporal humano, principal foco dos estudos de Duarte, é extremamente complexo. Os experimentos realizados com máquinas, portanto, têm ajudado o cientista a compreender melhor os mecanismos de controle da postura e equilíbrio humanos. Sua meta, agora, é entender a progressiva perda de controle que acompanha o envelhecimento, principalmente dos indivíduos que não praticam uma atividade física regular.

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