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Robótica

Braço controlado

Pesquisadores estudam como corrigir falhas em robôs industriais e fazê-los operar em ambiente de microgravidade

MIGUEL BOYAYANDispositivo simula robô flutuando, como se estivesse no espaçoMIGUEL BOYAYAN

Mais de 1 milhão de robôs encontram-se espalhados atualmente pelo planeta, executando tarefas em usinas nucleares, plataformas submarinas, fábricas de automóveis e até em hospitais, ajudando médicos a realizar delicadas cirurgias cardíacas e neurocirurgias, de acordo com a Federação Internacional de Robótica. Alguns especialistas estimam que, por volta do ano 2010, o número de sistemas robóticos presentes em domicílios estará na casa dos 5 milhões de unidades. Com isso, aspectos relacionados à confiabilidade e à segurança dessas máquinas vêm recebendo atenção redobrada dos especialistas em robótica. O grupo de pesquisadores da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC/USP), comandado pelo engenheiro elétrico Marco Henrique Terra, tem se dedicado nos últimos anos a estudar como detectar e corrigir falhas em robôs manipuladores, o jargão técnico para os braços robóticos.

“Falhas em robôs manipuladores podem originar movimentos descontrolados, podendo causar danos ao equipamento, ao ambiente de trabalho e às pessoas presentes nele”, diz Marco Terra, um dos coordenadores do Laboratório de Sistemas Inteligentes (Lasi) do Departamento de Engenharia Elétrica da EESC. Eles desenvolveram protótipos que conseguem simular movimentos no espaço, graças a um dispositivo presente no próprio robô capaz de criar um colchão de ar, simulando um ambiente de gravidade zero. O colchão é uma fina lâmina de ar de 2 milímetros de espessura localizado entre o braço robótico e a superfície da mesa de mármore onde eles operam. Ele é formado a partir de um compressor e de um sistema de mangueiras conectadas à base do robô que sopram ar sobre a mesa.

Com isso, o robô flutua, sem atrito nenhum com a superfície, exatamente como se estivesse no espaço. “Com essa tecnologia é possível estudar aspectos de controle do robô em ambientes com ausência de gravidade. Nossos estudos são importantes porque, na ocorrência de falhas recuperáveis, a correção do problema deverá ser feita pelo próprio robô”, explica Marco Terra. “Acredito que a pesquisa pode ser útil para agências e institutos de pesquisas espaciais.”

Trabalho simultâneo – Os estudos, iniciados há cinco anos, têm contado com apoio da FAPESP, dentro da linha regular de auxílio à pesquisa. Desde 1998, Marco Terra trabalha na montagem e no controle de um braço robótico. A pesquisa é feita com a participação de pesquisadores do Robotics Institute da Carnegie Mellon University, da Pensilvânia, Estados Unidos. Foram eles que montaram os dois robôs existentes no Lasi, denominados UArm II. O segundo projeto, de 1999, teve como meta estudar o problema de detecção e isolamento de falhas em robôs cooperativos e a posterior reconfiguração do sistema de controle. Robô cooperativo é o nome dado a dois robôs que trabalham simultaneamente e de forma complementar numa mesma tarefa. Eles geralmente são aplicados em tarefas que não podem ser executadas satisfatoriamente por um único robô, como manipulação de cargas muito pesadas e montagens que envolvam diversas peças.

Os dois braços robóticos do Lasi medem, cada um, cerca de 1 metro de comprimento e têm o formato de um braço humano, com três juntas motrizes e dois segmentos – as juntas corresponderiam ao ombro, cotovelo e pulso, e os segmentos, ao braço e antebraço. Na simulação das falhas, costuma-se retirar a força de uma das juntas, provocando uma alteração no movimento do robô. A partir daí, os pesquisadores estudam de que forma podem corrigir a trajetória do braço – por exemplo, aumentando a força nas outras juntas – para que não haja prejuízo no desempenho da tarefa. Os diversos métodos desenvolvidos pelos pesquisadores para detecção e isolação de falhas e controle pós-falha são baseados em teorias de controle e de inteligência artificial.

As pesquisas também envolvem o desenvolvimento de um simulador no qual podem ser reproduzidos os mais diversos problemas envolvendo robôs manipuladores. Foram criadas três diferentes versões do programa, destinadas tanto a escolas de ensino básico e médio quanto a programas de doutorado, principalmente das áreas de engenharia elétrica, mecânica e mecatrônica. A primeira versão é orientada para o estudo de cinemática e dinâmica de robôs individuais. A segunda destina-se a experiências com robôs manipuladores que apresentem falhas e a terceira para robôs manipuladores cooperativos. “O simulador, denominado ambiente de simulação e controle de manipuladores, poderá ser utilizado para o ensino mais básico assim como para os tópicos mais avançados de pesquisa”, explica o pesquisador.

A versão mais simples do simulador já foi testada, com sucesso, por vários especialistas e é distribuída gratuitamente para pesquisadores e estudantes da área de robótica. A versão completa não está disponível por enquanto, uma vez que a legalização dos direitos autorais ainda está em andamento. A intenção dos pesquisadores é fazer com que o simulador seja incorporado como uma caixa de ferramentas ao Matlab, um dos mais utilizados programas de simulação e cálculos matemáticos, desenvolvido pela empresa norte-americana Mathworks. “Já estamos em conversações com eles”, afirma Marco Terra. O passo seguinte será o desenvolvimento do controle de manipuladores via Internet. O usuário projetará o controlador que deseja, utilizando os simuladores, e poderá testar remotamente tais técnicas nos robôs do Lasi.

Reconhecimento internacional
As pesquisas conduzidas no Lasi têm obtido reconhecimento internacional. Além da publicação de artigos em periódicos nacionais (Revista Automação e Controle) e internacionais (International Journal of Robotics), um dos membros da equipe foi homenageado pelo Instituto de Engenheiros Elétricos e Eletrônicos (IEEE) dos Estados Unidos, em dezembro do ano passado. Durante a 41a Conferência em Decisão e Controle, principal evento científico promovido pela entidade, um trabalhosobre técnicas de controle não linear de robôs manipuladores desenvolvido por Adriano Almeida Gonçalves Siqueira, aluno de doutorado do professor Marco Terra, foi selecionado entre os cinco melhores em uma categoria de premiação de artigos cujo primeiro autor é um estudante.

A importância da premiação fica clara quando se sabe que foram submetidos para a conferência cerca de 1.400 trabalhos, dos quais aproximadamente 850 foram aceitos.qSegundo Marco, a importância dos estudos desenvolvidos pelo Lasi pode ser medida pelo seleto clube de países que atuam nesse campo de pesquisa. “Apenas Estados Unidos, Japão, Alemanha e França têm apresentado resultados significativos para problemas de falhas de robôs manipuladores”, diz o pesquisador. Dominar esse conhecimento é fundamental para o bom desempenho de atividades que cada vez mais necessitam do auxílio dessas máquinas.

O projeto
Reconfiguração da ação de controle após falha em robôs manipuladores cooperativos (nº 99/10031-1); Modalidade Linha regular de auxílio à pesquisa; Coordenador Marco Henrique Terra – USP; Investimento R$ 23.411,25 e US$ 17.000,00

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