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Engenharia de materiais

Bonito, liso e impermeável

Empresa paulistana desenvolve novo material que substitui com vantagens o granito, o mármore e o aço inox

MIGUEL BOYAYANQuem não é do ramo da construção civil, arquitetura, decoração ou design de interiores provavelmente nunca ouviu falar de um produto conhecido como superfície sólida mineral, com a sigla SSM, empregado na fabricação de cubas para pias e lavatórios, balcões, tampos e bancadas para cozinhas, banheiros, hospitais, clínicas ou laboratórios químicos e farmacêuticos. Trata-se de um material bonito, agradável ao tato e que pode ser usado no lugar do granito, do mármore, do aço inoxidável e da fórmica.

Até há pouco tempo ele não era produzido no país. Mas uma conjunção de acasos e uma pitada de ousadia fizeram a empresa paulistana Perc Engenharia investir no desenvolvimento do produto e se tornar o seu primeiro fabricante nacional. Tudo começou em meados dos anos 1990, conforme explica o engenheiro Paulo Carlos Galin, sócio-diretor da Perc. “Ao fazer um orçamento para construção de uma loja, conheci um novo material vendido na forma de chapas pela Du Pont (multinacional da área química), batizado de Corian. Era um tipo de SSM, cujo processamento, percebi, era muito similar ao da madeira. Aprendemos a trabalhar com esse produto e iniciamos uma nova atividade na empresa”, recorda-se Galin.

A “descoberta” do material foi o primeiro acaso. O segundo surgiu a partir das preocupações ambientais de Galin. Inconformado com as sobras geradas na hora do corte das chapas de Corian – um tipo de serragem no formato de pétalas de flor -, ele procurou os pesquisadores do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen) para tentar desenvolver uma técnica para reciclar o resíduo. “O projeto, no entanto, não se mostrou viável. Naquela mesma época tomei conhecimento da existência do Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe) e pensei: “Por que, então, não tentamos desenvolver um produto nacional similar ao Corian?”. E foi isso que fizemos”, conta o engenheiro. Com suporte financeiro da FAPESP, os técnicos da Perc e do Ipen atingiram a formulação ideal do produto. Em seguida, desenvolveram o processo para fabricação de chapas e cubas de pias. De quebra, também criaram um adesivo feito do mesmo material – só que em estado líquido -, usado para unir as cubas de pias às bancadas.

Conhecida no exterior como solid surface, a superfície sólida mineral é um composto obtido a partir de resinas acrílicas especiais e cargas, termo técnico que designa certos materiais inorgânicos particulados, minerais, principalmente a alumina, um derivado do alumínio. É um material impermeável e, por não ser poroso como madeira, granito ou mármore, não absorve nenhum tipo de líquido e torna-se mais higiênico. Ao mesmo tempo, manchas e pequenos riscos podem ser removidos com limpadores abrasivos comuns e uma esponja de aço. “Além disso, suas emendas são imperceptíveis, já que as peças são coladas com o adesivo num processo de fusão a frio”, destaca Galin.

O detalhe das emendas é importante e, em certos casos, significa uma vantagem e tanto. “Para a fabricação de uma grande bancada em um hospital ou laboratório farmacêutico, por exemplo, as chapas de aço inoxidável são coladas com silicone e as emendas podem tornar-se pontos de alojamento de bactérias. Como as emendas de SSM são imperceptíveis, elas diminuem os riscos”, explica o dono da Perc.

Mercado de chapas
Embora domine o processo de fabricação tanto das chapas quanto das cubas de SSM, a Perc, por enquanto, está produzindo apenas as cubas. Trata-se de uma estratégia comercial. “Para fabricar as chapas, com dimensão padrão de 76 centímetros por 3,86 metros e 12,5 milímetros de espessura, é preciso fazer um importante investimento na linha de produção. Além disso, o volume de venda tem que ser grande, da ordem de mil peças por mês, para que haja economia de escala. Esse número é difícil de ser atingido, já que o mercado de SSM não é grande no Brasil”, afirma Galin. Talvez por ser um material mais caro. Por isso, a Perc optou por fabricar apenas as cubas, que são moldadas a partir da mesma solução polimérica usada para fazer as chapas e o adesivo. Os principais clientes da empresa são multinacionais que trabalham com materiais similares importados, como o Corian da Dupont, o Surrel da Pertech e o HiMacs da LG Electronics.

Para fabricação das cubas, a Perc precisou montar um laboratório químico. O processo de produção começa com a aquisição da resina acrílica, obtida a partir de polimetilmetacrilato (PMMA), e de outras matérias-primas, como aditivos, pigmentos e cargas. “Fazemos uma mistura dentro de um reator e geramos uma solução composta polimérica, viscosa como mel. Em seguida essa solução é colocada num molde, num processo conhecido como casting, para fabricação da cuba”, afirma Marcos Sobral Ribeiro, um dos dois químicos do Departamento de Desenvolvimento da Perc, junto com Jaime Valério Ferreira. A cura da cuba se dá em temperatura ambiente e a reação ocorre em torno de uma hora e meia.

“Depois de muitas tentativas, conseguimos refinar a fabricação sem necessidade de recorrer a elevadas temperaturas. Isso simplificou o processo e reduziu o custo de produção”, ressalta Ribeiro. A última etapa da fabricação consiste em colocar a peça moldada numa estufa, a cerca de 90 graus Celsius, para uma pós-cura, com a finalidade de eliminar monômeros livres (resíduos da resina acrílica) que não sofreram reação. A diferença entre a fabricação das cubas e do adesivo está na concentração de cargas minerais e alguns aditivos. Segundo Paulo Galin, a solução composta polimérica utilizada para fazer as cubas também pode ser empregada para a moldagem de outras peças. A Perc, inclusive, já recebeu encomenda para fornecer tampas para lixeiras e cinzeiros distribuídos nas áreas comuns de um shopping paulistano.

A meta inicial da Perc é comercializar 100 cubas por mês. O produto está disponível em seis diferentes modelos, com formatos e cores diferentes, e é fabricado com materiais que lhe conferem ação antibactericida. Um dos primeiros contratos foi firmado com o governo paulista, para quem a firma vai fornecer 16 cubas, que serão instaladas no berçário de um centro hospitalar atualmente em construção. Confiante no sucesso do produto, a empresa já esboça planos de exportar o produto para outros países, como Estados Unidos, Japão e Europa, onde materiais feitos à base de SSM são mais conhecidos.

O projeto
Desenvolvimento de compostos a partir de resíduos cerâmicos como substitutos de granito, madeira ou outros revestimentos nobres (nº 01/08476-7); Modalidade Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe); Coordenador Paulo Carlos Galin – Perc; Investimento R$ 273.934,00 (FAPESP)

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