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Química

Tinta inteligente

Pesquisadores usam a nanotecnologia para criar pigmento que muda de cor

INSTITUTO DE QUÍMICA / USPPigmento feito com nanopartículas de ouro muda gradualmente de cor à medida que é aquecidoINSTITUTO DE QUÍMICA / USP

Um pigmento que possui a curiosa característica de mudar de cor após ser exposto à luz de um laser foi desenvolvido por pesquisadores do Instituto de Química da Universidade de São Paulo (USP). A pesquisa ficou com o primeiro lugar do Prêmio Abrafati-Petrobras de Ciência em Tintas 2006, o mais importante do setor, entregue pela Associação Brasileira dos Fabricantes de Tintas em parceria com a Petrobras Distribuidora. A substância, desenvolvida com tecnologia em escala nanométrica (1 nanômetro é igual a 1 milímetro dividido por 1 milhão), é constituída por nanopartículas de ouro depositadas sobre hidrotalcitas – um pó branco formado por hidróxido de magnésio e alumínio, com estrutura em forma de pequenas lâminas.

As nanopartículas de ouro, quando suspensas em água, formam soluções avermelhadas. Essa coloração resulta da interação da luz com os elétrons da superfície das nanopartículas, que se movimentam como ondas. Quando as nanopartículas se aproximam, ocorre uma espécie de interferência entre as ondas, dando origem a uma coloração violeta. Isso permite que elas sejam usadas como sensores químicos e biológicos pela modificação de suas superfícies, de forma que possam sinalizar a presença de moléculas e anticorpos por meio da mudança de cor.

No pigmento desenvolvido, em condição ambiente as nanopartículas de ouro se depositam sobre as bordas das lâminas e interagem mutuamente, dando origem a uma coloração violeta-azulada. Quando o pigmento é aquecido, a coloração muda gradualmente para o vermelho, indicando a formação de nanopartículas isoladas. A mudança de cor também pode ser induzida por um laser, que aquece o pigmento de cor azulada, provocando a fusão das nanopartículas de ouro. O trabalho, desenvolvido pelo grupo liderado pelo professor Henrique Eisi Toma, teve como ponto de partida a dissertação de mestrado de Leonardo da Silva Bonifácio, que, após a conclusão da pesquisa, foi trabalhar na Universidade de Toronto, no Canadá.

Ainda serão necessários vários testes para medir a variação de resposta do pigmento de acordo com o laser utilizado e o meio material em que ele será empregado. Antes de pensar na comercialização do produto, Toma explica que ele poderá ser utilizado para vários fins tecnológicos e nada impede que seja aplicado em tintas de parede. No entanto, o mais provável é que a tinta feita à base de ouro tenha uso mais restrito a obras de arte ou outros objetos cuja pintura precise durar por mais tempo. É que o ouro tem natureza inorgânica, resiste a altas temperaturas – suporta até 900°C -, não se desgasta nem perde o brilho com facilidade. Em comparação com os corantes orgânicos e outros pigmentos feitos à base de sulfetos de cádmio, que são substâncias tóxicas e apresentam risco cancerígeno, a invenção oferece a vantagem de não causar riscos ao organismo humano. Além disso, a preparação do pigmento é feita em água, sem solventes químicos e, portanto, lixo residual que possa agredir o ambiente.

Apesar da contribuição da descoberta para o setor de tintas, a grande novidade, na avaliação de Toma, ainda está por vir. “Esse foi apenas o primeiro passo. Por meio da nanotecnologia, que permite o controle molecular das substâncias, é possível a construção de um ‘pigmento inteligente’ com as mais diversas utilidades”, diz. Para dar continuidade à pesquisa, ele já pensa na possibilidade de criar um pigmento capaz de absorver a luz do sol e convertê-la em energia elétrica ou utilizá-la para decompor moléculas de sujeira.

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