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Engenharia do Petróleo

Sem areia

LNLS e empresa de Campinas desenvolvem filtro para a extração de óleo do fundo do mar

ADESTExtrair petróleo do fundo do mar não é tarefa das mais fáceis. A perfuração do solo marinho envolve os desafios de superar as rochas, a pressão e a água salgada. Os equipamentos precisam ser elaborados para esse ambiente e um cuidado pouco conhecido fora das áreas relacionadas à exploração petrolífera é a obtenção de óleo livre de areia. A retenção do material arenoso é feita com um equipamento chamado de Tela Premium que utiliza uma espécie de filtro até agora produzido por apenas três empresas no mundo, uma norte-americana, uma japonesa e outra alemã. “Somente a Petrobras gasta com esse equipamento cerca de US$ 80 milhões por ano”, estima Samuel Tocalino, sócio da Adest, empresa incubada na Companhia de Desenvolvimento do Polo de Alta Tecnologia de Campinas (Ciatec), no interior paulista, que firmou em outubro um contrato de transferência de tecnologia com o Laboratório Nacional de Luz Síncrotron (LNLS), da mesma cidade, para produzir a Tela Premium no Brasil.

A tela consiste em um tubo de até 12 metros de comprimento e 16,5 centímetros de diâmetro que é mergulhada no poço de petróleo. Ela está conectada na parte inferior da coluna de produção ligada à plataforma. Dependendo da extensão e da geometria, várias Telas Premium são acopladas, podendo chegar a alguns quilômetros de comprimento. Por meio de furos laterais, ao longo do corpo da parte externa do tubo, o óleo adentra o sistema e passa por um filtro formado por uma malha metálica que envolve a parte interna e retém a areia, deixando o petróleo passar (foto acima). “Esse meio filtrante é que envolve tecnologia de ponta para a produção, principalmente em relação à soldagem”, diz o engenheiro de petróleo Paulo Dore Fernandes, consultor sênior da área de engenharia de poços do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento (Cenpes) da Petrobras.

“Desenvolvemos um material por um processo chamado de Soldagem por Difusão, em meio a vácuo, em que átomos de um material migram para outro e vice-versa, num trabalho feito em altas temperaturas”, explica Osmar Bagnato, coordenador do Grupo de Materiais do LNLS. O grupo possui a experiência de produzir componentes para uso nos aceleradores de partículas nas linhas de luz do LNLS, como sensores, resfriadores e outros equipamentos eletroeletrônicos e estruturais. O Síncrotron é um acelerador de elétrons formado por um tubo de vácuo circular com 93 metros de circunferência. Os elétrons emitem, por influência de ímãs ao longo do anel, ondas eletromagnéticas que vão do raio X até o ultravioleta. Elas servem para análise, em estações de trabalho, de estruturas orgânicas e inorgânicas no nível atômico.

Plano estratégico
“O processo de soldagem resulta na união de telas metálicas para formar o filtro. Em laboratório, fizemos ensaios de corrosão, resistência mecânica e análise microestrutural para qualificar amostras e protótipos”, diz Bagnato. Os estudos realizados no LNLS foram propostos em conjunto por Bagnato e Tocalino. “Eu havia trabalhado como funcionário em uma empresa que prestava serviços e vendia equipamentos para a área de exploração petrolífera. Sabia da necessidade da Petrobras e de outras empresas que exploram petróleo no Brasil em ter a Tela Premium”, explica Tocalino. Desde 2003 o governo federal, por meio da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) com apoio do Fundo Setorial do Petróleo e Gás Natural (CTPetro) e do Programa de Mobilização da Indústria Nacional de Petróleo e Gás Natural (Prominp), elabora editais para incentivar empresas a produzir equipamentos da indústria petroleira e substituir os importados com vantagens tecnológicas e preços competitivos. “Comecei a pensar em produzir esses filtros e passei a procurar quem dominasse a tecnologia de soldagem por difusão. Na Unicamp indicaram-me o professor Osmar do LNLS.”

O Síncrotron solicitou o financiamento de um projeto à Finep com recursos do CTPetro, fundo formado com recursos da exploração de petróleo. Iniciado em 2007, o projeto teve  financiamento de R$ 800 mil da Finep e R$ 200 mil da empresa. Neste final de 2009  a Adest e o LNLS estão operando uma planta piloto para finalizar o produto. “Os primeiros testes serão provavelmente em Sergipe, entre fevereiro e março de 2010, num poço em terra onde os riscos e custos são menores. Se positivos, a etapa seguinte é no mar”, diz Dore. Depois de aprovados, a empresa nacional estará qualificada para produzir a Tela Premium e vender para a Petrobras.

A tecnologia do processo de soldagem do filtro está protegida por um acordo de confidencialidade acertado entre a Adest e a Associação Brasileira de Tecnologia de Luz Síncrotron (ABTLuS), operadora do LNLS para o Ministério de Ciência e Tecnologia. As partes também firmaram um contrato de transferência de tecnologia por um período de cinco anos em que o laboratório terá direito a 3% de royalties sobre o valor líquido das vendas dos produtos e serviços. Esse é o primeiro contrato de transferência de tecnologia do Sícrotron a gerar royalties que serão reaplicados em projetos de pesquisa.

Tocalino diz que além da Petrobras, natural compradora das telas, as empresas internacionais que exploram o mar territorial brasileiro também estão interessadas no produto. “Elas precisam, por exigência do contrato, ter um índice mínimo de nacionalização que varia de acordo com cada leilão da ANP [Agência Nacional do Petróleo]”. Uma empresa norueguesa, a Statoil, já manifestou interesse nas telas para uso no Brasil e no exterior e vai financiar um projeto de qualificação técnica desse material sob a coordenação do LNLS. O processo que utiliza a soldagem por difusão terá várias outras aplicações além da produção das Telas Premium. O filtro também poderá ser utilizado no saneamento básico, em esgotos, no processamento de polímeros e na produção de combustíveis. Ainda com a parceria do LNLS, a Adest solicitou um projeto ao programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe) da FAPESP, iniciado em 2008, envolvendo a tecnologia de soldagem por difusão no desenvolvimento de tecidos metálicos adaptáveis aos ambientes mais agressivos em relação à corrosão.

O Projeto
Desenvolvimento de elementos filtrantes para ambientes químicos agressivos encontrados na produção de petróleo (nº 07/59109-0); Modalidade Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Coordenador Samuel de Almeida Prado Tocalino – Adest; Investimento R$ 254.023,29 e US$ 84.567,73 (FAPESP)

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