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Reconhecimento

FHC recebe Prêmio John W. Kluge

Obra acadêmica e trajetória política do ex-presidente são reconhecidas pela Biblioteca do Congresso dos EUA

Eduardo Cesar

Fernando Henrique Cardoso em 2008, durante entrevista concedida a Pesquisa FapespEduardo Cesar

O sociólogo e ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, 81 anos,  recebeu nesta terça-feira (10) o Prêmio John W. Kluge, da Biblioteca do Congresso dos Estados Unidos. O prêmio, no valor de US$ 1 milhão, foi criado para reconhecer a obra de estudiosos em áreas de ciências humanas e sociais não incluídas nas categorias do Prêmio Nobel, tais como história, filosofia, ciência política, psicologia, antropologia e filosofia. Concedido desde 2003, o prêmio já distinguiu, entre outros, o historiador norte-americano Jaroslav Pelikan (1923-2006), o filósofo francês Paul Ricoeur (1913-2005) e ao filósofo polonês Leskek Kolakowski (1927-2009).  “Estou profundamente comovido por este título inesperado. Sou o primeiro brasileiro – e o primeiro latino-americano – a receber o Prêmio Kluge. Isto é um verdadeiro privilégio”, disse Fernando Henrique, em seu discurso de agradecimento. “Tempos atrás, seria difícil para mim imaginar um prêmio como este. Passei boa parte da minha carreira acadêmica estudando as relações entre os países ricos  e os países da periferia – nações como o Brasil, economicamente e geograficamente distantes. Esta divisão entre rico e pobre parecia imutável”, afirmou.

Professor emérito da Universidade de São Paulo, Fernando Henrique governou o Brasil entre 1995 a 2002. Também foi senador da República (1983 a 1992), ministro das Relações Exteriores (1992) e ministro da Fazenda (1993 e 1994). O historiador James H. Billington, que comanda a biblioteca do Congresso dos Estados Unidos desde 1987, destacou o peso da obra de Fernando Henrique. “O presidente Cardoso tem sido aquele tipo de pesquisador moderno que combina conhecimento profundo com  respeito às evidências empíricas”, afirmou. “Sua aspiração fundamental é buscar a verdade sobre a sociedade, mantendo-se aberto a revisitar suas conclusões quando novas evidências se acumulam”.

Segundo comunicado da Biblioteca do Congresso sobre a escolha de Fernando Henrique, sua  análise acadêmica das estruturas sociais do governo, da economia e das relações raciais no Brasil “estabeleceram a base intelectual para sua liderança como presidente na transformação do Brasil de uma ditadura militar com alta inflação em uma democracia vibrante e mais inclusiva com forte crescimento econômico”. A instituição também ressaltou a “enorme energia intelectual” do ex-presidente do Brasil, autor ou co-autor de mais de 23 livros acadêmicos e de 116 artigos científicos. “Cardoso tornou-se internacionalmente conhecido pela análise inovadora desenvolvida com o chileno Enzo Faletto no debate das melhores alternativas para o desenvolvimento. Essa estrutura interpretativa abriu o caminho para novas ideias e alternativas e influenciou gerações de acadêmicos na América Latina, nos Estados Unidos e no mundo, antecipando o conceito posterior de ‘globalização’”, diz o comunicado. O trabalho em parceria com Faletto está no livro Dependência e Desenvolvimento na América Latina, de 1969.

Em seu discurso, Fernando Henrique lembrou a vida acadêmica e seu trabalho pioneiro em estudos sobre desigualdade e subdesenvolvimento na Universidade de São Paulo. “Eu e meu colega Enzo Faletto escrevemos Dependência e Desenvolvimento na América Latina,  que descrevia um mundo mais complexo e dinâmico. Hoje, isso é evidente, mas posso assegurar que era considerado uma heresia naquela época. Éramos um dos primeiros, ao final dos anos 60, a falar sobre a internacionalização dos mercados internos. Este processo foi o que mais tarde tornou-se conhecido como globalização.”

Abordou o sucesso do Plano Real, que lançou quando era Ministro da Fazenda em 1993, e teve o condão de acabar com a hiperinflação no Brasil. “O Plano foi conduzido por jovens economistas brilhantes em engenharia financeira. Minha maior contribuição foi na viabilização dos meios para apresentar o plano e assegurar apoio político necessário do Congresso e da Sociedade”, afirmou. “Como um sociólogo, eu sabia que em sociedades democráticas, cumplicidade é tão importante quanto competência técnica. Comunicação entre líderes e sociedade é tão crítica, quanto as políticas que estavam sendo implementadas. Eu acredito verdadeiramente que a transparência foi o fator determinante para o nosso sucesso.”

Também lembrou o trabalho de sua mulher, a antropóloga Ruth Cardoso (1930 -2008), no programa Comunidade Solidária, que rompeu com o habitual assistencialismo dos programas sociais. “O foco do problema passou meramente de uma satisfação de necessidades para um fortalecimento das pessoas e das comunidades”, disse. E, por fim, expressou sua confiança em relação ao futuro do Brasil. “Eu espero que as pessoas olhem para a experiência brasileira e percebam a importância da tolerância e da diversidade”, disse. “Tenho confiança que o Brasil, com sua criatividade e imaginação única, pode ser um importante agente na construção da ordem político-econômica, que possibilite não somente o crescimento do PIB, como também a felicidade das nações. Talvez eu tenha realizado minha pequena contribuição em promover esta discussão.”

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