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Recursos Hídricos

Impactos antecipados

Programa avalia cenários futuros para irrigação, geração de energia elétrica e obras em bacias hidrográficas

Vista aérea do rio Guandu, em Piraí (RJ): modelo hidrológico orienta a tomada de decisões em relação à água e ao sol

Ricardo Azoury/olhar imagemVista aérea do rio Guandu, em Piraí (RJ): modelo hidrológico orienta a tomada de decisões em relação à água e ao solRicardo Azoury/olhar imagem

Um modelo computacional criado pelo pesquisador gaúcho Samuel Beskow, professor da Universidade Federal de Pelotas (UFPel), no Rio Grande do Sul, consegue simular o comportamento de bacias hidrográficas brasileiras e a influência que a mudança no uso do solo exerce sobre ele. “O programa dá suporte para a tomada de decisões, como a permissão de usar água de um rio para irrigação, a mudança adequada de uso do solo e o potencial para estabelecimento de um reservatório”, diz Beskow, graduado em engenharia agrícola. Ele desenvolveu o modelo – chamado Lavras Simulation of Hydrology (Lash) – durante o seu doutorado na área de hidrologia e simulação hidrológica feito na Universidade Federal de Lavras (Ufla), em Minas Gerais, e na Universidade Purdue, nos Estados Unidos. “Com o programa é possível traçar cenários relacionados à irrigação, geração de energia elétrica, navegação e até fornecer informações hidrológicas para dar subsídio ao dimensionamento de obras hidráulicas, como bueiros, canais, pontes e barragens”, diz Beskow, que tem como parceiros no projeto pesquisadores das universidades do Tocantins, de Lavras e Purdue.

Os modelos usados atualmente no Brasil são importados dos Estados Unidos e da Europa, o que pode resultar em limitações, na avaliação do pesquisador. “Por conta do clima e do solo, dentre outras características, as bacias hidrográficas brasileiras, bem como seus regimes hidrológicos, podem apresentar características consideravelmente distintas das europeias e americanas”, diz Beskow. O monitoramento dos recursos hídricos no país foi implementado principalmente em bacias hidrográficas com grandes aproveitamentos hidrelétricos, para irrigação ou para abastecimento urbano, e os dados fluviométricos – que englobam medição dos níveis de água e vazão dos rios – ainda são insuficientes para a realidade econômica e ambiental do país. “Os grandes rios são monitorados, mas há inúmeras bacias de porte menor em áreas agrícolas onde a análise é escassa”, diz.

O programa Lash foi o vencedor do 34º Prêmio Fundação Bunge Juventude 2013 na área de recursos hídricos e agricultura. “O modelo é muito importante porque pode ser aplicado tanto a pequenas bacias hidrográficas como às de grande porte”, diz José Galizia Tundisi, professor aposentado da Universidade de São Paulo (USP) e orientador de pós-graduação da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), responsável pelo programa mundial de formação de gestores de recursos hídricos da Rede Global de Academias de Ciências (IAP, na sigla em inglês). “Ele é uma ferramenta de gestão muito avançada”, diz Tundisi, que atualmente ocupa o cargo de secretário municipal de Desenvolvimento Sustentável, Ciência e Tecnologia de São Carlos, no interior paulista.

Análise independente
A primeira versão do Lash foi concluída em 2009 e aplicada em pesquisas sobre modelagem de chuva e vazão em sub-ba-cias hidrográficas da bacia do Rio Grande – que contempla os estados de São Paulo e Minas Gerais –, com potencial para geração de energia hidrelétrica. Na segunda versão, desenvolvida desde 2011 e em fase de conclusão, o modelo hidrológico foi aprimorado para ser usado por empresas, comitês de bacias hidrográficas, associações de usuários de recursos hídricos e instituições governamentais ligadas ao setor.

O programa é dividido em módulos compostos por mapas, gerenciados no ambiente de sistemas de informações geográficas (SIGs), que caracterizam a bacia hidrográfica e bancos de dados com informações meteorológicas como temperatura, velocidade do vento e precipitação e também sobre tipo e uso do solo. Os usuários podem importar e armazenar dados de várias estações de monitoramento. “Um aspecto interessante é a divisão da bacia em sub-bacias, o que resulta na análise do balanço hídrico de forma independente.” O modelo também permitirá analisar a erosão e o transporte de sedimentos nos cursos d’água. “Com o cruzamento das informações conseguimos analisar a suscetibilidade de uma determinada bacia à estiagem e à cheia, eventos de chuva e o que elas causariam, com intervalos de horas ou de dias”, relata Beskow, que coordena o Laboratório de Simulação Hidrológica e Processamento de Dados e o programa de pós-graduação em Recursos Hídricos na UFPel.

O software permite identificar o comportamento de um curso d’água e prever o volume de água disponível durante época de cheias e de estiagens. “Além de gerar informações, o modelo é um instrumento para estudos de viabilidade técnica e econômica de empreendimentos que necessitam da utilização de recursos hídricos provenientes de cursos d’água.” Na avaliação de Tundisi, o Lash representa uma inovação tanto do ponto de vista da pesquisa como de ferramenta para gestão. “Entre as inovações do programa estão, por exemplo, a plataforma de geoprocessamento de drenagem, que envolve áreas críticas das bacias hidrográficas, e o fato de poder ser aplicado a diferentes regiões do Brasil.”

Artigos científicos
BESKOW, S. et al. Performance of a distributed semi-conceptual hydrological model under tropical watershed conditions. Catena. v. 86, n. 3, p. 160-71, 2011.
BESKOW, S. et al. Hydrological prediction in a tropical watershed dominated by Oxisols using a distributed Hydrological model. Water Resources Management. v. 27, n. 2, p. 341-63. 2013.

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