Podcast: Dionne Bezerra Rolim
No estudo, os pesquisadores compilaram e analisaram 22.338 de casos de melioidose em seres humanos e animais, além de registros sobre os ambientes em que essa bactéria já havia sido encontrada, entre 1910 e 2014. Eles verificaram que durante esse período a B. pseudomallei se dispersou por muito mais países do que se imaginava. Isso porque os pesquisadores estimam ter havido uma significativa subnotificação dos casos da doença em 45 países onde ela é endêmica, devido ao fato de a doença ser pouco conhecida pelos profissionais de saúde. É o caso, por exemplo, do Brasil, México, Peru e Argentina. Além deles, outros 34 países que nunca tinham registrado casos de melioidose podem ser endêmicos, como Paraguai, Bolívia e Suriname. De acordo com o estudo, o número de casos por ano no mundo é de cerca de 165 mil, dos quais 89 mil resultam em morte.
Ao que tudo indica, a América Latina está entre as regiões mais vulneráveis. Os pesquisadores estimam que, por ano, 246 milhões de pessoas possam contrair a bactéria, por meio da inalação de partículas suspensas no ar contaminadas, ingestão ou aspiração de água contaminada, inoculação em pele e mucosas com lesão. Ambientes chuvosos com altas temperaturas são considerados mais suscetíveis à presença da B. pseudomallei. Além disso, solos argilosos e modificados por conta de ações humanas, sobretudo pela agricultura irrigada, também se mostraram mais associados à presença da bactéria.
“A melioidose é uma doença de transmissão ambiental”, explica Dionne. “As mudanças climáticas podem interferir em fatores relacionados à distribuição do microrganismo no ambiente como composição do solo, precipitações e temperaturas elevadas, o que pode aumentar a dispersão da doença.” Em países em desenvolvimento, segundo ela, essas alterações são ainda mais difíceis de controlar, o que poderia indiretamente interferir na distribuição da melioidose.
No Brasil, a primeira descrição da doença foi registrada em 2003, no Ceará. Desde então, o estado continua diagnosticando casos de melioidose. O diagnóstico da enfermidade é difícil pelo fato de a doença ser pouco conhecida e não apresentar quadro clínico característico, isto é, os sintomas podem ser confundidos com outras infecções comuns. O diagnóstico só é feito por meio de cultura microbiológica, que exige estrutura laboratorial não disponível em todos os serviços de saúde do país. Além disso, a B. pseudomallei é resistente a vários antibióticos.
Artigo científico
Limmathurotsakul, D. et al. Predicted global distribution of Burkholderia pseudomallei and burden of melioidosis. Nature Microbiology. jan. 2016.