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Genética

Pesquisadores identificam alta diversidade genética em parasita da malária

Plasmodium vivax acumulou mutações que o teriam diferenciado das cepas do Velho Mundo depois de chegar às Américas

Imagem microscópica de célula infectada com P. vivax

Marcelo FerreiraImagem microscópica de célula infectada com P. vivaxMarcelo Ferreira

Após chegar às Américas, há 500 anos, Plasmodium vivax, parasita responsável por cerca de 16 milhões de casos de malária no mundo todos os anos, acumulou mutações genéticas que o diferenciaram das variedades africanas e asiáticas. A conclusão é de um grupo internacional de pesquisadores, entre eles o médico parasitologista Marcelo Urbano Ferreira, do Instituto de Ciências Biomédicas da Universidade de São Paulo (ICB-USP). Em artigo publicado nesta segunda-feira (27/06) na revista Nature Genetics, eles analisaram amostras do material genético do parasita obtidas em 11 países da África, Ásia e da América Latina. Os pesquisadores usaram uma técnica chamada de seleção híbrida para isolar o material genético do protozoário a partir do sangue de indivíduos infectados. As amostras extraídas foram sequenciadas e, em seguida, comparadas entre si. Os pesquisadores puderam avaliar o grau de diversidade populacional do Plasmodium pelo mundo do ponto de vista genético. Verificaram que as variedades de P. vivax do Velho Mundo (África e Ásia) divergem significativamente das do Novo Mundo (América do Sul, Central e México).

“O estudo identificou mutações genéticas nos parasitas do Novo Mundo que parecem ter sido fundamentais para que ele se adaptasse aos vetores das Américas, bastante diferentes dos da África e Ásia”, explica Ferreira. Segundo ele, os resultados também sugerem que, ao longo dos anos, o genoma do P. vivax teria acumulado mais mutações em comparação ao do P. falciparum, causador da forma mais agressiva de malária. Os pesquisadores ainda não sabem por que isso aconteceu, mas têm algumas hipóteses. Uma delas é que o genoma de P. vivax teria mecanismos de reparo de mutações menos eficazes. Outra possibilidade é que P. vivax e P. falciparum acumulem mutações de maneira semelhante, mas o primeiro tenha acumulado mais alterações ao longo dos anos por ser uma espécie mais antiga.

O protozoário chegou às Américas com os escravos e os colonizadores europeus, e seu ciclo de vida pode ter sido crucial para o sucesso na viagem. Ferreira explica que, no organismo hospedeiro, o protozoário se instala inicialmente nas células do fígado, nas quais amadurece e se multiplica, antes de ganhar a corrente sanguínea. Também no fígado alguns exemplares do P. vivax entram em estágio dormente, com baixa atividade metabólica. “O parasita pode permanecer nesse estágio por meses, até despertar, multiplicar-se e ganhar a corrente sanguínea”, explica. Isso lhe daria tempo suficiente para fazer a travessia do Atlântico e chegar em plena atividade ao novo continente.

O estudo na Nature Genetics foi feito a partir do trabalho dos Centros Internacionais de Excelência para a Pesquisa da Malária, financiados pelos Institutos Nacionais de Saúde dos Estados Unidos (NIH) para estabelecer uma rede de colaboração entre universidades norte-americanas e instituições da África, Ásia, América Latina e de ilhas do Pacífico a fim de fortalecer a pesquisa e a capacidade de treinamento em regiões endêmicas. Ferreira e sua orientanda de mestrado, Thaís Crippa de Oliveira, agora trabalham no sequenciamento de outras amostras do P. vivax obtidas no Acre. A partir delas, o pesquisador quer verificar diferenças e semelhanças entre elas e as de outras regiões das Américas, como Colômbia, Peru e México. “Pretendemos desenvolver marcadores genéticos que nos ajudem a saber a origem geográfica do parasita.”

Artigo científico
HUPALO, D. N. et al. Population genomics studies identify signatures of global dispersal and drug resistance in Plasmodium vivax. Nature Genetics. 27 jun. 2016.

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