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Nobel da Paz

Acordo com guerrilha dá Nobel da Paz a presidente da Colômbia

Prêmio é anunciado poucos dias depois do referendo popular que rejeitou o resultado das negociações entre Juan Manuel Santos e as Farc

Nobel_Paz_AltaN. Elmehed. © Nobel Media 2016O presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, é o ganhador do Prêmio Nobel da Paz de 2016 por seu papel nas negociações de paz com os guerrilheiros das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc). O anúncio foi feito em Oslo na sexta-feira, 7, pelo Comitê Norueguês do Nobel. O acordo de paz a que Santos chegou com os guerrilheiros foi rejeitado no referendo do domingo, 2, por 50,21% dos eleitores colombianos, com 63% de abstenções. No anúncio do prêmio, a porta-voz do comitê, Kaci Kullmann Fiveen, afirmou que o resultado do referendo “não foi um voto contra a paz”, mas contra “um acordo de paz específico”. Acrescentou, no entanto, que “há um risco real de que o processo de paz se interrompa, o que torna ainda mais importante que todas as partes mantenham o respeito ao cessar-fogo”. No domingo, 9, Santos declarou que vai doar o dinheiro do prêmio às vítimas do conflito com as Farc. O valor é de 8 milhões de coroas suecas (cerca de R$ 3 milhões).

Para o professor Marco Aurélio Nogueira, coordenador científico do Núcleo de Estudos e Análises Internacionais da Universidade Estadual Paulista (Unesp), em São Paulo, “a premiação mostra quanto a comunidade internacional valoriza a busca de um entendimento na Colômbia que ponha fim a uma das mais antigas guerras civis dos tempos atuais”. De acordo com Rafael Villa, professor associado do Departamento de Ciência Política e do Instituto de Relações Internacionais da Universidade de São Paulo (USP), “o prêmio transcende a pessoa do presidente e premia o esforço de paz por todas as partes”. Villa considera ainda a distinção “um importante elemento de pressão para certos setores políticos e sociais colombianos que apostam nas formas tradicionais de resolução do conflito pela via militar”.

Ao aceitar o Nobel, Santos, de 65 anos, dedicou-o aos colombianos. “Recebo esse prêmio, em especial, em nome dos milhões de vítimas desse conflito”, disse. A luta do governo da Colômbia contra a guerrilha comunista das Farc vem desde 1966, quando foi fundada na esteira de um período de conflitos entre facções políticas que ficou conhecido na história colombiana como “La Violencia”. Nos 52 anos os embates com a organização deixaram cerca de 220 mil mortos. Segundo dados do Departamento de Estado norte-americano, as Farc dominam de 15% a 20% do território e controlam a maior parte do refino e distribuição de cocaína do país.

“Estamos perto de um acordo final”, declarou Santos após o prêmio. O líder da guerrilha, Rodrigo Londoño, conhecido como Timochenko, escreveu no Twitter que “o único prêmio ao qual aspiramos é o da paz com justiça social”. O Nobel para o presidente colombiano era considerado provável, embora se esperasse que Londoño fosse também premiado. O acordo de paz entre as duas partes foi anunciado em 24 de agosto, em Havana, Cuba, com a Noruega como país mediador. As negociações começaram pouco depois de Santos assumir o governo, secretamente e com a intermediação do então presidente da Venezuela, Hugo Chávez.

Santos foi ministro da Defesa de seu antecessor, Álvaro Uribe, que o ajudou a eleger-se, em 2010. As conversações com as Farc foram motivo de ruptura entre os dois. Santos se reelegeu em 2014. Uribe era um dos principais críticos internacionais do governo de Chávez e liderou a campanha pelo “não” no referendo, por considerar que os acordos fazem concessões excessivas às Farc. O resultado da consulta o fortaleceu. “Uribe estava se tornando o grande protagonista do novo processo de negociação, mas o prêmio voltou a fazer a balança pesar para o lado de Santos”, observa o professor Luís Fernando Ayerbe, do Programa San Tiago Dantas de Relações Internacionais da Unesp. O acordo com as Farc é rejeitado também por grande parte dos eleitores mais ricos. “Não entendo como meus companheiros da elite se deixam desinformar sobre os benefícios da paz”, havia afirmado Santos ao jornal espanhol El País.

“O presidente Juan Manuel Santos se empenhou de fato para conseguir fazer com que as negociações com as Farc avançassem, mas, ao que tudo indica, não tomou as devidas precauções para fazer com que a agenda dos entendimentos fosse assimilada pela sociedade colombiana, pela opinião pública e as demais forças políticas do país”, analisa Marco Aurélio Nogueira. “No mínimo por tal fato, a concessão do prêmio foi precipitada”, critica o pesquisador.

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