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Ensino

Estudantes brasileiros se destacam em concurso da Nasa

Iniciativa pode estimular a integração de disciplinas

Representação 3D de base orbital com estrelas Gliese 667 ao fundo

Equipe E. M. Antonio Pedro Ribeiro Representação 3D de base orbital com estrelas Gliese 667 ao fundoEquipe E. M. Antonio Pedro Ribeiro

No final de março, a agência espacial norte-americana (Nasa) divulgou o resultado da 24ª edição de seu concurso anual no qual crianças e jovens até 18 anos devem elaborar uma estação espacial. “São trabalhos que envolvem todas as ciências naturais e também áreas de humanas, por envolver mérito literário e artístico”, destaca o biólogo Ivan Paulino Lima, pesquisador da Universities Space Research Association no Centro Ames de Pesquisas da Nasa. Ele se envolveu pessoalmente na divulgação do concurso em escolas brasileiras ao longo de 2016, se pondo à disposição para aconselhar estudantes sobre como participar. “Foi a edição mais competitiva de sua história, com mais de 1.500 trabalhos submetidos, e também com o melhor desempenho do Brasil.” O país nunca tinha figurado entre os ganhadores e desta vez foram cinco contemplados – três no estado de São Paulo e dois no Rio de Janeiro. O desempenho significou a quarta colocação mundial, atrás da Índia, da Romênia e dos Estados Unidos.

O regulamento permite uma variedade de formatos, desde que o trabalho tenha relação com o desenvolvimento de uma base orbital permanente. Podem ser desenhos, ensaios ou projetos, entre outros, feitos individualmente ou em grupo, desde que em inglês e entregues em cópia física até 1º de março a cada ano. Se o trabalho for um site ou jogo eletrônico, é necessário enviar uma descrição do projeto, já que somente o material impresso é usado para a classificação.

O destaque foi o primeiro lugar em mérito literário para o paulistano João Paulo Guerra Barrera, empatado com a indiana Nanitha Varma N. Em categoria para crianças até 18 anos, o menino que fez 7 anos poucos dias após o anúncio do resultado ganhou com um jogo eletrônico que elaborou baseado em um livro bilíngue que ele mesmo escreveu. Ele já cursa o 3º ano do ensino fundamental em uma escola bilíngue e foi alfabetizado também em inglês, durante um ano em que ele e os pais viveram nos Estados Unidos.

Isabela de Freitas recebeu menção honrosa em mérito artístico

Reprodução Isabela de Freitas recebeu menção honrosa em mérito artísticoReprodução

Ivan comemorou com igual entusiasmo a menção honrosa na categoria mérito artístico recebida por Isabela de Freitas, de 15 anos, estudante da Escola Estadual Amílcare Mattei, de Marília, onde ele mesmo se formou no ensino médio. O estímulo, além da visita do pesquisador da Nasa, veio do professor de biologia David Cristiano de Almeida. “Mostrei a Estação Espacial Internacional (ISS) aos alunos e comparei com criações futuristas exibidas em filmes”, conta. Ele sugeriu que os alunos pesquisassem para entender como funciona uma estação espacial, por exemplo as especificidades de se ir ao banheiro ou tomar banho em órbita. Obteve 17 projetos, dos quais o de Isabela foi destacado pela Nasa por sua originalidade. “Depois eu soube que ela foi a aluna que mais procurou a professora de artes, Sílvia Moura, para ajuda com o desenho”, diz David, orgulhoso por sua cidade representar o país em um concurso mundial. Ele considera que, além de integrar disciplinas, uma atividade desse tipo estimula os jovens a perseguirem sonhos. Por isso, pretende aumentar o número de participantes para a próxima edição.

Uma equipe de quatro crianças de 10 anos da Escola Municipal Antonio Pedro Ribeiro, de Mogi das Cruzes, também ganhou uma menção honrosa com a estação Mogi C I, em que 1.500 pessoas viveriam orbitando o sistema de estrelas Gliese 667. O projeto de Ana Beatriz Martins Costa, Ingrid de Oliveira, Kauan Barbosa e Luisa Rodrigues inclui desenhos a lápis e recriações em 3D ilustrando as residências, o sistema de transporte, produção de alimentos e de energia, entre outros aspectos. “Eles aproveitaram o software que temos para produção de jogos e fizeram os modelos tridimensionais”, conta o professor de computação João Kleber Martins, coordenador do projeto.

Ele auxiliou os alunos inclusive na parte de pesquisa conceitual para o trabalho, feito inteiramente durante as aulas de informática. “Eles precisavam saber o que é necessário para a sobrevivência: quanto uma pessoa come por ano, por exemplo”, explica. Professor e alunos tiveram um mês para fazer tudo a tempo da data limite para submissão. Por isso, já começou a se preparar para o próximo ano. “Estou conversando com alunos do 4º e 5º ano para desenvolvermos projetos com maior antecedência e apenas finalizar em 2018.”

O destaque recebido não é pouco para os integrantes dessa escola que fica na zona rural de Mogi das Cruzes, no meio do mato da serra do Itapeti. “A maior parte deles não conhece a praia nem tem acesso a shoppings ou à internet”, conta o professor. Grande parte dos pais dos 80 alunos trabalham como caseiros dos sítios das redondezas, mas o concurso permite às crianças aspirarem a outros horizontes.

Apesar de reunir ciências, português e artes, o laboratório de informática é um cenário onde projetos desse tipo se tornam possíveis. “Disciplinas com caráter eletivo ou optativo, como robótica, se baseiam em desenvolvimento de projetos e demandam pesquisa em áreas diversas”, conta Tatiana Nahas, professora de biologia no ensino médio do colégio Santa Cruz, em São Paulo. Ela não participou do concurso e explica que a grade curricular restringe os professores mesmo em escolas que valorizam a interdisciplinaridade. Projetos desse tipo exigiriam que professores se dedicassem e se coordenassem fora dos horários de aula, e por isso não são de simples execução. Por isso as crianças menores, com currículo mais flexível ministrado por um único professor, podem estar em vantagem.

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