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Imunologia

Vacina fracionada contra febre amarela gera proteção na África

Estudo realizado por norte-americanos avaliou efeito da dose menor do que a padrão

OMS/E. Soteras Jalil Vacinação contra febre amarela em Kinshasa, capital da República Democrática do Congo, em 2016OMS/E. Soteras Jalil

Em teste realizado com 716 pessoas na República Democrática do Congo (RDC), uma equipe do Centro de Prevenção e Controle de Doenças (CDC), dos Estados Unidos, indicou que a vacina fracionada – de 1/5 da dose padrão ou 0,1 mililitros (ml) – contra febre amarela pode ativar a produção de anticorpos contra o vírus causador da doença em níveis similares aos da vacina padrão – 0,5 ml –, de acordo com um estudo publicado hoje (14/02) em The New England Journal of Medicine.

“Esse é o primeiro estudo de campo, de base populacional, sobre a vacina fracionada contra febre amarela”, afirmou o farmacêutico bioquímico Olindo Assis Martins Filho, pesquisador do Instituto René Rachou, unidade da Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) em Minas Gerais. “A conclusão é que a dose de 1/5 é muito boa, porque 98% das pessoas que não possuíam anticorpos os produziram depois de vacinadas.” Martins Filho não participou da pesquisa.

Com base em três estudos que indicavam o efeito protetor (imunogenicidade) de doses fracionadas em pessoas que não haviam sido submetidas ao vírus como neste estudo, o fracionamento foi adotado como estratégia de uma ampla campanha, iniciada em janeiro deste ano, para vacinar cerca de 20 milhões de pessoas nos estados de São Paulo, do Rio de Janeiro e da Bahia (ver Examinando a vacina contra febre amarela).

Antes, em 2016, em consequência da escassez de vacina, o fracionamento foi usado na epidemia que começou em Angola e na RDC. Como resultado, 7,6 milhões de pessoas, incluindo crianças com mais de 2 anos de idade, foram vacinadas, mas os resultados ainda não tinham sido avaliados.

Em colaboração com o Ministério de Saúde da RDC, a equipe coordenada pela norte-americana Jennifer Erin Staples, do CDC, recolheu amostras de sangue de 716 pessoas que receberam a vacina 17-DD, produzida pelo Instituto Tecnológico em Imunobiológicos (Bio-Manguinhos), da Fiocruz do Rio de Janeiro, na campanha realizada em 2016 em Kinshasa, a capital do país. As análises de amostras de sangue obtidas antes da vacinação e de 28 a 35 dias depois indicaram que 705 pessoas produziram anticorpos contra o vírus da febre amarela.

Entre os participantes que não tinham anticorpos contra o vírus, a soroconversão – a taxa de produção de anticorpos – foi maior no grupo com idade entre 6 e 12 anos (100% de soroconversão), com mais de 50 anos (99%) e entre 13 e 49 anos (97%). Crianças com idade entre 2 e 5 anos apresentaram 95% de soroconversão.

“Esta taxa de soroconversão sugere que o uso da dose fracionada é viável para fornecer imunidade e conter os surtos de febre amarela”, concluem os autores do artigo. Não houve grupo controle, já que todos os participantes receberam apenas a dose fracionada, mas os pesquisadores, com base em outros estudos, asseguram que os resultados obtidos são similares aos da dose padrão. Ainda não é possível saber quantos anos, exatamente, dura o efeito protetor da vacina fracionada.

Equipes da Fiocruz, das universidades de São Paulo (USP), Federal de São Paulo (Unifesp) e das secretarias de Saúde de São Paulo e do Rio de Janeiro começaram em fevereiro a colher amostras de sangue de 180 pessoas no Rio e de 1.200 em São Paulo que receberam a dose fracionada para comparar seu efeito com o da dose padrão, com base em amostras de sangue de do mesmo número de pessoas que devem depois receber a dose padrão nos dois estados. Segundo Martins Filho, coordenador do estudo, os resultados preliminares devem sair até o final deste ano.

Artigo científico
AHUKA-MUNDEKE, S. et al. Immunogenicity of fractional-dose vaccine during a yellow fever outbreak – preliminary report. New England Journal of Medicine. On-line. 14 feb. 2018.

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