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boas práticas

O espectro da eugenia na universidade

nelson provaziA University College London (UCL), no Reino Unido, anunciou que irá investigar um pesquisador acusado de promover clandestinamente, no campus da instituição, conferências sobre inteligência e eugenia nos últimos três anos. Os eventos foram organizados por James Thompson, professor do Departamento de Psicologia e Ciências da Linguagem da UCL, que adotava medidas extremas para manter secretas as conferências. Segundo o jornal The Guardian, Thompson informava os convidados sobre o local do evento apenas no último minuto. Os encontros, com no máximo 25 participantes, eram realizados, em sigilo, em uma espécie de sala de espera.

Em 2017, participou do encontro o jornalista Toby Young, designado no início do ano para chefiar o Office of Students, órgão do governo britânico responsável pela regulação do ensino superior. Young foi afastado do cargo após o caso ser revelado pelo jornal London Student no dia 10 de janeiro. Segundo a publicação, Richard Lynn, professor da Universidade de Ulster, Irlanda do Norte, deu palestras nas conferências realizadas em 2015 e 2016, onde teria defendido ideais da supremacia branca.

Em nota divulgada em seu site, a UCL informou que os eventos foram pagos com recursos externos sem que funcionários da instituição fossem notificados:“As conferências não chegaram a ser aprovadas pela UCL. Somos uma instituição comprometida com a liberdade de expressão e com o combate ao racismo e ao sexismo”. A UCL proibiu professores que participaram dos eventos de organizar qualquer tipo de encontro científico até o fim da investigação.

“Os postulados da eugenia ferem a ética na pesquisa ao propor que há raças ou indivíduos superiores a outros, com base em princípios da hereditariedade”, explica a psicanalista Tamara Prior, que concluiu em 2016 um mestrado sobre o tema na Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (FM-USP). Segundo ela, a eugenia ganhou espaço nos meios científico e intelectual no final do século XIX, após o antropólogo e matemático inglês Francis Galton (1822-1911) cunhar o termo em 1883, em uma obra que propunha métodos de seleção artificial. Perdeu adeptos durante as primeiras décadas do século XX – mas não deixou de exercer influência em muitos ambientes, como o acadêmico e o médico, afirma Francisco Assis de Queiroz, pesquisador do Centro de História da Ciência da USP.

Ele recorda alguns casos notórios. “Na década de 1990, o sociólogo Charles Murray e o psicólogo Richard Herrnstein, dos Estados Unidos, defenderam a ideia de uma suposta inferioridade dos negros em artigos que discutiam inteligência e a estrutura de classes”, explica Queiroz. “Mesmo com documentos como a Declaração de Helsinque e a Convenção de Nuremberg, que tratam de ética em pesquisa em seres humanos e condenam estudos com viés eugenista, alguns pesquisadores continuam promovendo ideias para justificar, de forma determinista e racista, traços como a inteligência.”

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