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Resenha

A saúde nas cidades

Vida urbana e saúde: Os desafios dos habitantes das metrópoles | Paulo Saldiva | Editora Contexto | 128 páginas | R$ 27,00

Eduardo CesarO livro Vida urbana e saúde: Os desafios dos habitantes das metrópoles, de Paulo Saldiva, professor da Faculdade de Medicina e diretor do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo (USP), tem como objetivo discutir a saúde das pessoas que vivem nas grandes cidades. Dividido em 10 capítulos, faz uma discussão histórica dos principais problemas de saúde que afetam a vida de seus habitantes.

O texto mostra os benefícios oriundos da vida urbana, como acesso ao trabalho, renda, moradia adequada, tecnologia, cultura, lazer e convívio social, e discute os riscos de se viver nos grandes aglomerados populacionais. O autor, pesquisador da área de saúde ambiental e ecologia aplicada, baseia-se em diversos estudos científicos para relacionar os problemas de saúde pública com os problemas de saúde urbana e também se vale de sua experiência pessoal como habitante da megalópole São Paulo, o que deixa o texto mais atraente para os leitores.

O grande mérito do livro está no ecletismo usado para esclarecer a relação dos problemas de saúde das pessoas (saúde pública) com os problemas de saúde das cidades (saúde urbana). Para Saldiva, o adoecimento dos seres humanos tem forte relação com o processo de adoecimento pelo qual passam as cidades. Diversos problemas ambientais e sociais são abordados, dentre os quais se pode destacar a diminuição das áreas verdes, a verticalização das moradias com o excesso de prédios, o aumento das ilhas de calor, a poluição dos rios, a falta de água e as enchentes, o sucateamento dos transportes coletivos e a prioridade para os transportes individuais, o aumento dos congestionamentos e da imobilidade nas cidades, juntamente com a poluição do ar e a elevada emissão de ruídos, a violência, a iluminação precária e a piora na percepção de segurança. Todos esses fatores, na visão do autor, contribuem para mudanças no comportamento das pessoas como, por exemplo, diminuição dos deslocamentos a pé ou de bicicleta, baixos níveis de atividade física no lazer, ausência de crianças brincando livremente nas ruas, alimentação inadequada, com baixo consumo de alimentos in natura e alto consumo de ultraprocessados, resultando em maior prevalência de obesidade em todas as faixas etárias. Ao mesmo tempo, os habitantes das cidades convivem com surtos e epidemias de doenças infecciosas de séculos atrás, como a febre amarela e dengue, e boa parte das cidades brasileiras convive com a epidemia de uso de crack. Distúrbios do sono, estresse excessivo, ansiedade, medo de sair nas ruas e a falta de convívio social contribuem para o aumento da prevalência de doenças mentais.

As desigualdades e os problemas sociais e ambientais realmente estão deixando as cidades e seus habitantes doentes. Mas existem soluções. Bons estudos produzidos por especialistas apontam saídas. Em São Paulo, por exemplo, o plano diretor estratégico aprovado em 2014 tem como principal objetivo diminuir as iniquidades ambientais nas diferentes regiões da cidade. Nesse sentido, Saldiva discute pesquisas e ações já conhecidas e avaliadas para melhorar a qualidade de vida das pessoas nas urbes. A complexidade dos problemas exige ações interdisciplinares, intersetoriais e, principalmente, políticas. O principal problema apontado pelo autor é a falta de políticas de longo prazo que perpassem interesses individuais. O Brasil carece de boas propostas que transformem em ações as soluções. Aliás, a argumentação de que precisamos pensar mais no bem-estar coletivo em vez do individual é um dos pontos mais importantes do livro. É necessário que as ações sejam concebidas para o bem de todos, resgatando o conceito de cidadania. Na avaliação de Saldiva, por se tratar do hábitat natural dos seres humanos, “o ambiente construído das cidades deve ter forma plena, agradável, eficiente, prazerosa e sustentável como direito fundamental das pessoas”. Se os habitantes das grandes cidades estão vivendo um “experimento natural”, como propõe Paulo Saldiva, não se pode esquecer que os resultados serão conhecidos nas próximas décadas pelas futuras gerações.

Alex Antonio Florindo é epidemiologista, professor livre-docente da Escola de Artes, Ciências e Humanidades da Universidade de São Paulo (EACH-USP) e líder do Grupo de Estudos e Pesquisas Epidemiológicas em Atividade Física e Saúde da USP.

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