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Genoma-FAPESP

A proposta do Genoma-Cana: o país pode ser referência em genética de plantas

O genoma completo da planta não interessa ao Projeto Genoma-Cana. Sua meta é seqüenciar cerca de 50 mil genes que controlam o crescimento, o desenvolvimento, a produtividade, o teor de açúcar e outros parâmetros essenciais na cana-de-açúcar (Saccharum sp). Se esse objetivo for cumprido, o projeto terá um grande impacto não apenas na pesquisa de cana, mas, de forma mais ampla, também nos estudos de genética de plantas, segundo Paulo Arruda, do Centro de Biologia Molecular e Engenharia Genética da Unicamp, um dos pesquisadores envolvidos na montagem do projeto.

“O volume de informações que o Genoma-Cana tem potencial para gerar poderá colocar o Brasil como referência mundial em EST de plantas”, diz ele, entusiasmado. A sigla é de “Expressed Sequence Tags”, tecnologia de seqüenciamento rápido e incompleto que visa identificar porções dos genes que codificam proteínas.

Em relação à cana, especificamente, há uma grande expectativa de que a descoberta de genes da própria planta e metodologias para cloná-los possam tornar a transformação genética uma ferramenta mais valiosa do que ela já é para os programas de melhoramento. Isso porque, até agora, trabalha-se nessa transformação com um número limitado de genes, todos estranhos à cana-de-açúcar, e a mudança para genes próprios da planta amplia as possibilidades de dotar variedades convencionais de resistência a doenças e pragas.

Mais que isso: futuramente, a utilização desses genes podem resultar em melhores características agronômicas da planta, incluindo aí seu teor de sacarose, produtividade, despalha natural, resistência a seca e geadas, precocidade etc. “Imaginamos até mesmo se não vamos encontrar maneiras de a cana fazer açúcares especiais, ou seja, se não vamos chegar a identificar nesse projeto enzimas da cana capazes de modificar a sacarose”, especula Paulo Arruda.

Todos esses efeitos da transformação genética têm um grande significado econômico, em especial para o Brasil, que lidera a lista dos 80 países produtores de cana, garantindo 25% da produção mundial. Em São Paulo, responsável por 60% da produção nacional, o agribusiness da cana movimenta R$ 8 bilhões por ano e proporciona 600 mil empregos diretos. Este estado é, em nível mundial, líder em competitividade (menor custo de produção) e em exportações de açúcar. Não bastasse isso, a importância econômica da cana para São Paulo deve crescer muito em função de seu potencial para a produção de energia renovável.

Nesse quadro torna-se claro porque a Copersucar, entidade dos produtores paulistas, coordena o Consórcio Internacional de Biotecnologia de Cana-de-Açúcar, ICSB (cuja criação liderou em 1991), que reúne 13 entidades de 9 países e já desenvolveu dezenas de projetos científicos em sua área. E é justamente devido à experiência acumulada nos seis anos de trabalho no Consórcio, que o Centro de Tecnologia de Cana (CTC) da Copersucar deverá desempenhar um papel importante dentro do Projeto Genoma-Cana.

O projeto vem sendo desenhado com características extremamente interessantes. Uma delas é que a utilização da técnica de EST vai permitir a comparação das seqüências obtidas da cana-de-açúcar a outras seqüências de outros produtos depositadas em bancos de dados, gerando informações sobre genes homólogos em espécies diferentes e facilitando a descoberta de novos genes.

“Há coisas fascinantes nesse campo. Encontramos, por exemplo, em ESTs de Arabdopsis thaliana, um matinho, o mesmo gene que controla a temperatura em mamíferos. Nessa mesma planta encontramos um gene que é um transportador proto-sódio, ou seja que elimina o sódio no rim, que já havia sido identificado no rim de porco”, relata Paulo Arruda.

É precisamente por conta dessas analogias que o seqüenciamento rápido de genes da cana-de-açúcar expressos na raiz, colmo, folhas, em suma, nas diferentes partes da planta, depois de as seqüências serem comparadas ás de outras plantas, pode levar a um volume extraordinário de novas informações sobre genética vegetal.

A identificação dos genes da cana deverá contribuir para elucidar processos fisiológicos e bioquímicos, tais como os da produção, transporte e armazenamento de açúcares, assimilação de nutrientes e resistência a doenças, e todo esse conhecimento não serve apenas para a planta sob exame no Brasil, mas para os outros projetos genoma de planta em desenvolvimento pelo mundo.

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