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ALIMENTAÇÃO

Carvão reduz colesterol do ovo

Galinhas ganham ração modificada e produzem ovos mais saudáveis

Galinhas poedeiras criadas na Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Jaboticabal estão produzindo ovos mais saudáveis para consumo humano, com 22% menos colesterol. A tecnologia, desenvolvida pelo professor Pedro Alves de Souza, da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias (FCAV), consiste em acrescentar à ração uma pequena quantidade de resíduos de carvão vegetal, o mesmo usado em churrasqueiras. Ele atingiu o melhor índice já alcançado em pesquisas de redução de colesterol com base na dieta das aves. Uma solução simples, barata e natural que também reduziu o colesterol da carne das aves em 34%, aumentou a postura em 2,55% e reduziu em 27% o número de ovos trincados.

Rico em colesterol, ao contrário da carne de frango, o ovo foi por muito tempo considerado um aliado da hipercolesterolemia – níveis elevados de colesterol no sangue -, fator de risco para o surgimento de doenças cardiovasculares. Um único ovo, mais exatamente a gema, contém em média 200 mg de colesterol. O controle da ingestão diária dessa substância é fundamental para quem está acima dos limites aceitáveis – 200 mg de colesterol por decilitro (um décimo de litro) de sangue – e também para portadores de diabetes.

Nesses casos, para evitar que o problema se agrave, cardiologistas recomendam uma dieta restritiva, com no máximo 200 mg de colesterol por dia. Isso significa que, ao consumir apenas um ovo, a pessoa terá consumido sua cota diária e não poderá comer nenhum outro alimento de origem animal durante todo o dia. Para a cardiologista Jaqueline Scholz Issa, do Instituto do Coração (Incor) do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), o ovo com 22% menos colesterol, ou seja, com cerca de 156 mg, é mais saudável e daria às pessoas uma margem para consumir ainda 44 mg de colesterol, o que corresponde a, por exemplo, cerca de 100 g de peixes como o salmão, o atum ou o bacalhau.

“Isso pode parecer pouco, mas, na prática, para quem é obrigado a seguir uma dieta rígida, faz muita diferença”, afirma. Além de reduzir o colesterol no ovo, o pesquisador demonstrou que a técnica é ainda mais eficiente em relação à carne das aves: o colesterol foi reduzido em até 34%. Embora a carne branca seja uma das menos problemáticas em relação ao colesterol – 100 g de peito de frango têm 75 mg de colesterol, enquanto a mesma quantidade de carne vermelha magra tem 90 mg -, essa redução também pode aliviar o peso das restrições impostas no tratamento.

Mais fertilidade
Mas os resultados da pesquisa não favorecem apenas o consumidor. A adição de resíduos de carvão vegetal na alimentação das galinhas também contribui para uma avicultura mais eficiente, melhorando a produtividade das aves e a resistência das cascas dos ovos. Segundo Souza, isso se deve a dois fatores. “Em primeiro lugar, sabe-se que a fertilidade é afetada por altos níveis de gordura. Portanto, é natural esperar que aves mais magras coloquem mais ovos. Em segundo lugar, o carvão vegetal é muito rico em cálcio, o que contribui para tornar a casca mais resistente”, explica.

Para obter esses resultados, Souza submeteu as aves a uma dieta composta de milho, farelo de soja, soja integral, farinha de carne, calcário, pedrisco, fosfato bicálcico, mistura vitamínica mineral, aminoácidos e medicamento promotor de crescimento. A essa mistura, acrescentou proporções de 1% a 3% de cinzas vegetais (resíduos de carvão de eucalipto moído). A dieta com 1% de carvão reduziu apenas 17% do colesterol no ovo e 26% na carne. Já com 2% de carvão, a redução foi de 21% no ovo e 29% na carne.E o carvão, ressalta o pesquisador, “é um aditivo natural, rico em cálcio, fósforo e potássio.”

O único efeito verificado foi uma mudança na consistência das fezes das aves, que se tornaram mais secas devido à ação adstringente do carvão. Isso é uma vantagem para o produtor, porque facilita a remoção dos detritos na granja e diminui a incidência de moscas. Para Souza, o método é comercialmente viável: pode haver um aumento de no máximo 2% no custo total da ração.

Ovos de ouro
Os ovos originados da pesquisa de Souza são bem diferentes de alguns tipos comercializados sob o rótulo de light. Esses são vendidos pelo dobro do preço dos ovos comuns e , na opinião do pesquisador, trata-se de uma mera jogada de marketing. Ele chegou a essa conclusão após analisar, no ano passado, três amostras de cada um dos vários tipos encontrados no comércio: o caipira, o comum, o pufa e o light.

No Laboratório de Tecnologia dos Produtos de Origem Animal da FCAV foram medidos e comparados os níveis de colesterol e lipídios totais de todas as amostras. Os resultados mostraram variações insignificantes. Para lipídios totais, as concentrações variaram de 27,96 gramas por 100 gramas de gema no ovo caipira para 26,65 g/100 g no ovo light. Em relação ao colesterol, os resultados não foram menos desanimadores: 11,97 mg e 11,15 mg. A redução na quantidade de colesterol do ovo light foi de apenas 6%, e não de 20% como anunciava a embalagem do produto.

Os ovos tipo pufa apresentaram variações semelhantes: 26,62 g/100 g de gema na quantidade de lipídios totais e 11,45 mg/100 g de gema no conteúdo de colesterol. “A diferença de colesterol entre esses ovos e os comuns também é insignificante. O fato de serem enriquecidos com ácidos graxos (formadores das gorduras) poliinsaturados ômega 3 não significa que eles tenham menos colesterol, mas que contêm uma substância que, em tese, seria capaz de ajudar o organismo a eliminar colesterol. Ainda assim, seria necessário avaliar se eles têm mesmo ômega 3 e em que quantidades”, afirma.

A família ômega 3 contém três ácidos graxos: o linolênico, cujas principais fontes são os óleos de soja e de canola, o eicosapentanóico-EPA e o decosahexaenóico-DHA, encontrados nos óleos de peixes marinhos. O mecanismo de ação desses ácidos graxos (além dos poliinsaturados,existem os saturados e os insaturados) ainda não é totalmente conhecido, mas sabe-se que eles podem reduzir a formação de coágulos, baixar os níveis de triglicérides no sangue e a pressão sanguínea, o que é benéfico ao sistema circulatório. Por esse motivo, algumas indústrias alimentícias passaram a adicionar ômega 3 a produtos como ovos, leite, pães, etc.

Na opinião do médico Raul Cavalcante Maranhão, diretor do Laboratório de Lipídios do Incor, o benefício desses alimentos enriquecidos com ômega 3 é questionável, porque a dieta habitual do brasileiro com o consumo constante de óleo vegetal já contém as quantidades necessárias desses ácidos graxos.O Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), ao conhecer a pesquisa realizada na Unesp sobre os ovos light, publicou as informações do trabalho na revista mensal mantida pela instituição, Consumidor S/A, orientando os consumidores para a propaganda enganosa referente a esses ovos. Mas, apesar da polêmica gerada com a divulgação dos resultados, eles continuam nas prateleiras dos supermercados, alguns prometendo até 40% menos colesterol, com preços de ovos de ouro.

Afinal, o importante para o controle do colesterol é evitar o excesso de peso e diminuir a quantidade de gordura na alimentação, principalmente as saturadas, como as de origem animal. Apesar de ser rico em colesterol, a vantagem do ovo em relação a uma churrascada de fim de semana é a pouca quantidade de gordura que possui. Melhor ainda agora que se abre a possibilidade aos criadores de galinhas de produzir ovos com menos colesterol.

O projeto
Redução dos Níveis de Colesterol no Ovo e na Carne de Aves (nº 96/12620-6); Modalidade Auxílio a projeto de pesquisa; Coordenador Pedro Alves de Souza – Faculdadede Ciências Agrárias e Veterináriasda Unesp-Jaboticabal; Investimento R$ 13.120,80

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