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CONSTRUÇÃO CIVIL

À prova de tempo ruim

Novo impermeabilizante reúne resíduos de estireno e aparas de alumínio

A construção civil ganha um novo tipo de impermeabilizante. O produto leva o nome de resina-compósito e é formado por dois tipos de resíduos industriais. O primeiro é originário da produção do estireno – um produto químico utilizado na indústria de plástico e já presente em resinas para a construção civil. O outro é uma apara de folha de alumínio, material usado na parede interna dos cabos telefônicos junto com um revestimento de plástico. A formulação do novo produto e os testes que aprovaram a ação impermeabilizante foram realizados em um projeto do Programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE) financiado pela FAPESP. O estudo conjunto foi realizado entre a Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da Universidade de São Paulo (USP) e a empresa Athena Engenharia da mesma cidade.

Coordenado pelo professor Fazal Hussain Chaudhry, do Departamento de Hidráulica da EESC, o projeto chega ao final e espera a confirmação dos pedidos de patentes realizados no Brasil e nos Estados Unidos com a intermediação técnica e financeira do Núcleo de Patentes e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec) da FAPESP.

Consertos demais
A concepção do produto nasceu da experiência do engenheiro Celso Martinez Junior, dono da Athena. Formado em engenharia civil na USP, em 1980, ele concluiu mestrado em 1986 e voltou-se para a aplicação de novos materiais em impermeabilização, preocupado com a freqüente necessidade de reparos em estruturas: “Sempre me incomodou o fato de que boa parte das estruturas impermeabilizadas, nas construções civis, sofria de uma crônica de faz-e-refaz, sem uma solução definitiva”.

Com o surgimento do PITE, Martinez procurou Chaudhry, seu antigo professor na USP, para ver se conseguia transformar uma idéia em produto. “Na verdade, a idéia é antiga – descobrir um meio de reaproveitar resíduos industriais -, mas eu pensava em gerar um novo sistema para coberturas, nem pensava em novos produtos”, conta Martinez. Por estudar processos de impermeabilização, Martinez sabia que os produtos usados no mercado precisavam ser melhorados. “Os resultados analisados não correspondiam às exigências técnicas e era preciso usar algum outro material para tornar o produto mais eficiente”, lembra o engenheiro.

Cem anos
Suas pesquisas produziram indagações que deram forma ao projeto. Juntando os dados teóricos do assunto, Martinez imaginou reunir alumínio às resinas conhecidas para uso em impermeabilização. Ele buscava um material metálico resistente à corrosão aliado a uma característica familiar aos engenheiros, a de adesão viscoplástica – capacidade de os materiais permanecerem ligados mesmo em condições adversas. O passo seguinte foi decisivo. Martinez conversou com o professor José Alexandrino de Sousa, da área de estudos de polímeros da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), que indicou um gerente de uma empresa produtora de alumínio (nome mantido em segredo). Foi assim que ele teve acesso a um compósito especial – a lâmina de alumínio revestida de plástico que tem na durabilidade sua principal característica. “Nós estamos usando as aparas desse alumínio por apresentar uma vida útil de uns cem anos”, explica.

Camada de resina
A etapa seguinte foi testar o compósito. De forma rudimentar, usando um maçarico, Martinez soldou duas metades de uma lâmina de compósito para moldar um sistema de impermeabilização junto com uma camada de resina de estireno (disponível no mercado) aplicada sobre uma pequena placa de concreto. Ele deixou este teste piloto exposto a intempéries e começou a estudar os resultados. Constatou que, apesar da construção rudimentar, a peça teve a estrutura preservada: “Não houve descolamento do compósito e os raios ultravioleta não conseguiram arruinar a camada de polímero na emenda das duas metades, conservando a integridade da impermeabilização”.

Testes exaustivos
Com a ajuda de Chaudhry, começou a nova etapa do trabalho. O primeiro grande teste foi a cobertura de um corredor do Departamento de Engenharia Civil da própria UFSCar. Com os recursos obtidos da FAPESP, Martinez e Chaudhry puseram em ação um soprador térmico capaz de emitir ar a 500ºC, o suficiente para amolecer o plástico e promover a junção das mantas de compósito sem danificar a essência – a fatia de alumínio presente no interior da lâmina. Também fizeram corpos-de-prova (amostras) para testes nos laboratórios do (DEMa) Departamento de Engenharia de Materiais da UFSCar, sob supervisão do professor Elias Hage Junior. Nos primeiros testes, produziram-se simulações para três condições ambientais – luz, calor e chuva – feitas por meio de equipamento provido de uma lâmpada de xenônio, para simular radiação solar, e de aspersão de água. Desse modo, foram simuladas condições de envelhecimento equivalentes a cinco anos. Depois, Martinez e Chaudhry rompiam os corpos-de-provas e analisavam as modificações ocorridas no material.

“Os resultados foram muito bons. Nenhuma emenda – o ponto mais crítico no material – se rompeu”, diz Martinez. Ainda era o início. Desenvolveu-se outro conjunto de corpos-de-prova destinado a uma nova série de testes, agora para simular condições de um dia de verão com sol intenso e em seguida chuva, o que foi feito com jatos de ar quente a 75ºC por um minuto e meio, seguidos de jatos d’água a 25ºC por seis segundos. “Fizemos testes equivalentes a cinco anos de exposição e de novo, não encontramos nenhum problema: todos os resultados anteriores foram confirmados”, relata Chaudhry.

Para comprovar a eficiência do novo produto em relação a impactos, os corpos-de-prova foram submetidos, segundo os padrões convencionais, a choques causados por um tubo cilíndrico de 2,5 kg lançado de 1,10 m de altura. “Então constatamos que, além de funcionar bem naquilo que deveria ser sua função básica, a vedação, o conjunto resina-compósito mostrou ser resistente e durável”, afirma Martinez.

Sucesso em obras
O novo processo já foi usado em várias obras na cidade de São Carlos. “Os resultados estão disponíveis. Nenhum problema ocorreu nas aplicações realizadas por técnicos da Athena. Uma das obras é uma laje de 440 m2 que recebeu uma camada de argila expandida para conferir proteção térmica ao conjunto”, explica Martinez. Para Chaudhry, além das vantagens técnicas, o novo material tem o mérito de envolver controle ambiental, ao promover a reciclagem de materiais (aparas de alumínio e resíduos de estireno) que normalmente são incinerados e acabam deixando o ar poluído.

Enquanto esperam a confirmação das patentes, Martinez e Chaudhry trabalham para tornar viável a nova tecnologia. “Estamos trabalhando em duas frentes: uma comercial, para definir estratégias de mercado, outra para tornar a idéia operacional.” Para isso, buscam financiamento para comprar equipamentos e construir uma fábrica modelo de onde sairá o novo impermeabilizante.

O projeto
Avaliação da Reciclagem de Resíduos Industriais Derivados da Síntese do Estireno, da Alumina e do Alumínio Metálico com Vistas à sua Aplicação na Proteção de Coberturas de Construções Civis (nº 97/07221-8); Modalidade Programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE); Coordenador Fazal Hussain Chaudhry – Departamento de Hidráulica da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) da USP; Investimento R$ 16.025,00 e US$ 399,00

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