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Genômica

O mapa da árvore do papel

Descoberta de 6.800 genes do eucalipto impulsiona a busca por aumento de produtividade no setor florestal

Eduardo CésarBaseada no eucalipto, a indústria de papel e celulose responde por 4% do PIBEduardo César

Em meados de fevereiro, o fim da primeira fase do projeto ForESTs, que previa o seqüenciamento parcial do genoma de árvores de eucalipto (Eucalyptus spp), bancado pela FAPESP em parceria com quatro empresas do setor de papel, celulose, aglomerados e laminados (Votorantim, Ripasa, Suzano e Duratex), trouxe duas boas notícias. A primeira foi o término dos trabalhos dessa etapa um mês antes do prazo previsto, depois de terem sido seqüenciadas 110 mil ESTs (etiquetas de seqüências expressas, fragmentos do código genético que ajudam a identificar os genes).

A segunda, mais importante, foi a descoberta, em meio aos prováveis 27.500 genes encontrados com o auxílio das ESTs, de 6.800 genes novos, nunca antes localizados em outros projetos mundial de seqüenciamento de genomas. “A maioria dos novos genes deve ser específica do eucalipto”, comenta Helaine Carrer, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) da Universidade de São Paulo (USP), coordenadora do projeto, que se utiliza da rede de 20 laboratórios do projeto Genomas Agronômicos e Ambientais (AEG), da FAPESP. “Consultamos os bancos de dados internacionais e não os encontramos no genoma de outros organismos.” Na fase inicial do ForESTs, a Fundação destinou US$ 530 mil ao projeto e o consórcio, R$ 500 mil.

Próxima fase
Justamente por não haver informação disponível sobre os novos genes, essas quase 7 mil seqüências capazes de codificar proteínas serão examinadas com atenção redobrada na segunda fase do ForESTs, que deverá se estender por três anos, com investimento previsto de mais R$ 1 milhão por parte das empresas. Na busca por genes de importância econômica para a indústria florestal, que possam ser úteis para aumentar a produtividade e reduzir custos nos processos de produção de papel e celulose, os pesquisadores vão, a partir de agora, vasculhar todo o material genético já mapeado do eucalipto.

Para isso, vão lançar mão de uma série de técnicas destinadas a jogar luz sobre a função de genes, entre elas o uso dos chamados microarrays ou chips de DNA (ácido desoxirribonucléico), diminutas lâminas especiais nasquais se colocam milhares de genes. A metodologia permite estudar simultaneamente o padrão expressão de um conjunto de genes nas mais diversas situações. Em outras palavras, ver quais genes são ou não usados (e com que intensidade) durante o desenvolvimento de um ser vivo. “Hoje em dia, trabalha-se cada vez mais com a noção de que a ação de um grupo de genes – e não de apenas um gene – determina os traços de uma pessoa, de um animal ou de uma planta”, diz Helaine.

No caso do eucalipto, o emprego dos chips de DNA deve ser útil na procura por genes envolvidos, por exemplo, nas sínteses químicas que regulam a produção das fibras de celulose, a matéria-prima do papel, e de lignina, substância que se deposita nas paredes das células vegetais e confere resistência à madeira. De acordo com o tipo de lignina, que pode responder por até 25% da composição da madeira, a extração da celulose do eucalipto torna-se fácil ou complicada, cara ou barata.

“Já são conhecidos os genes que atuam nesses processos”, afirma Helaine. Nessa segunda fase do projeto, também deverão ser estudados genes que possam conferir ao eucalipto maior resistência a doenças, à escassez de água e ao frio. Essas são apenas algumas das abordagens que deverão ser testadas pelos membros do projeto ForESTs, com o intuito de encontrar formas para melhorar a produtividade das indústrias de polpa, papel, celulose e painéis laminados, que emprega 150 mil pessoas no país, movimenta algo como 4% do Produto Interno Bruto (PIB) e responde por cerca de 8% das exportações anuais. Com o tempo, outras alternativas poderão se firmar, à medida que as pesquisas avançam.

Assim que descobrirem os grupos de genes relacionados a melhorias de produtividade, os pesquisadores informarão às empresas, que vão procurar esses genes nas plantas já cultivadas em viveiros e selecionar as variedades mais adequadas a seus propósitos. Os cientistas não descartam a possibilidade de produzirem espécies geneticamente modificadas, embora esse não seja o objetivo primordial. Para averiguar se um gene introduzido na planta foi incorporado e é expresso, não seria necessário esperar o eucalipto crescer, o que demora em média sete anos. Em laboratório, poucos meses após a alteração no genoma, já se consegue determinar, com o auxílio de marcadores moleculares, se o gene introduzido se manifesta na planta em formação.

Concorrência internacional
Ser rápido e eficiente é importante num projeto como o ForESTs. Até por que a concorrência internacional na área de melhoramento genético do eucalipto entre as empresa de papel e celulose é grande. De acordo com Mathias Kirst, pesquisador brasileiro do Grupo de Biotecnologia em Florestas da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, que visitou a Esalq no mês passado, uma iniciativa conduzida por uma empresa da Nova Zelândia já seqüenciou 500 mil ESTs do genoma dessa árvore. É um resultado quase cinco vez maior do que o projeto paulista. “Esses dados nunca vão se tornar públicos por que o trabalho foi feito por uma companhia privada”, comenta Kirst. Até o momento, a equipe de pesquisadores sob sua coordenação seqüenciou apenas 12 mil seqüências de genoma de eucalipto.

Também em fevereiro, dois dias após o anúncio do término da primeira fase do ForESTs, o governo federal lançou uma iniciativa nacional destinada a pesquisar formas de melhoramento genético do eucalipto, o Projeto Genolyptus. Um grupo de 12 empresas, sete universidades e a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) participa do projeto, previsto para durar cinco anos, em suaprimeira fase.

O orçamento inicial do projeto federal é de R$ 12 milhões, dos quais 70% deverão ser bancados pelo Ministério da Ciência e Tecnologia, com verba do Fundo Verde-Amarelo, e 30% pelas empresas. Os pesquisadores da rede Gelolyptus pretendem estudar em plantações espalhadas por todo o território nacional as melhores formas de aumentar a produtividade, diminuir a poluição das indústrias do setor florestal e criar plantas mais resistentes e adequados aos diferentes usos.

O projeto
FORESTs: Eucalyptus Genome Sequencing Project Consortium (nº 01/10251-3); Modalidade Programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE); Coordenadora Helaine Carrer – Esalq/USP; Investimento R$ 500.000,00 e US$ 530.000,00

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