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Engenharia Metalúrgica

Por dentro dos tubos

Nova metodologia para analisar equipamentos de petroquímicas

Um sério problema das indústrias petroquímicas é o desgaste sofrido pelos tubos de aço usados na produção de etileno, matéria-prima empregada na fabricação de polímeros como polietileno e polipropileno, usados, por exemplo, na confecção de embalagens e peças para a indústria automobilística. Produzidos a partir de uma família de aços refratários (resistentes ao calor), esses tubos sofrem desgastes com a ação das altas temperaturas e dos gases utilizados na síntese dos polímeros. Assim, a qualidade dos tubos é fator fundamental para evitar a constante troca das tubulações e a paralisação da produção. Foi para compreender com precisão esses desgastes que uma equipe do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) decidiu desenvolver uma nova metodologia de ensaios capaz de avaliar o comportamento de ligas metálicas resistentes ao calor sob as condições da produção dos polímeros.

O ambiente onde esses tubos em forma de serpentina funcionam é no interior de fornos de pirólise (decomposição pelo calor sem a presença de oxigênio). Na produção de etileno, a superfície externa dos tubos atinge temperaturas de até 1.150 graus centígrados. O resultado é o aparecimento de dois fenômenos, chamados de fluência e de carburação. No primeiro ocorrem deformações resultantes das tensões provocadas pelo aquecimento. No outro há uma acentuada degradação causada pela difusão de átomos de carbono no interior da tubulação. De uma forma geral, os tubos são projetados para uma vida útil de 100 mil horas (cerca de 11 anos), mas, devido à carburação, esse período reduz-se em até 50%.

Hoje, para garantir a vida útil original, os fabricantes aumentam a espessura das paredes dessas peças, encarecendo o produto.Os pesquisadores contaram com apoio da FAPESP, que financiou o projeto dentro do Programa Parceria para Inovação Tecnológica (PITE). A empresa parceira é a Engemasa, fabricante de tubos de aço refratário em São Carlos (SP). Ela, porém, não foi a primeira indústria envolvida no projeto. Quando foi concebido, em 1997, a parceria se deu com a Aços Villares, que tinha uma fábrica desses tubos. Enquanto o projeto era avaliado pela Fundação, a emprêsa encerrou as atividades dessa unidade.

Os pesquisadores do IPT, então, ofereceram o projeto à Fundinox, uma divisão da Sulzer Brasil. A empresa aceitou e a pesquisa foi iniciada em maio de 2000. Pouco tempo depois, a Fundinox foi comprada por um grande fabricante alemão, que não demonstrou interesse pelo trabalho.

Mudança na parceria
“Como o projeto já estava em andamento, a FAPESP concordou que ele prosseguisse sem a parceria de uma empresa, até que batemos na porta da Engemasa”, conta Mário Boccalini, pesquisador da Divisão de Metalurgia do IPT. O trabalho foi encerrado em abril deste ano e os resultados demonstram, em detalhes, as leis gerais sobre os dois fenômenos que afetam os tubos. “Fizemos um avanço metodológico inédito no Brasil. Conseguimos reproduzir com fidelidade as condições físico-químicas que acontecem nos fornos e, a partir daí, pudemos entender melhor a carburação e a fluência”, afirma a física Zehbour Panossian, coordenadora do projeto do PITE e chefe do Agrupamento de Corrosão e Proteção do IPT.

Para compreender a relevância dos ensaios e dos resultados desse projeto, é preciso antes conhecer os dois fenômenos que atingem os tubos. Segundo Boccalini, a fluência é uma deformação causada por dois tipos de esforços: a pressão provocada pelo gás que circula dentro do tubo e a tensão longitudinal exercida pelo peso da peça. Essas tubulações costumam ter em torno de 10 metros de comprimento e de 5 a 20 centímetros de diâmetro. Quando submetidos às altas temperaturas, elas podem sofrer deformações de até 10 centímetros no comprimento. A carburação, por sua vez, ocorre quando átomos de carbono presentes na nafta e no etileno penetram nas paredes dos tubos. “Ela é danosa porque afeta a integridade das tubulações, tornando-as frágeis e sujeitas a trincas. Os tubos perdem, assim, a capacidade de deformar-se, e tornam-se suscetíveis à ocorrência de fratura catastrófica (quebra da peça)”, explica Boccalini. Quando isso acontece, o material tem de ser reparado ou trocado, acarretando sérios prejuízos à empresa.

Para realizar os ensaios que permitissem avaliar o comportamento das ligas – compostas por ferro, cromo, níquel e uma pequena adição de carbono de 0,8% – quando submetidas à carburação, os pesquisadores fabricaram uma atmosfera sintética com metano e hidrogênio no interior de um forno contendo corpos-de-prova cilíndricos de 10 milímetros de diâmetro por 70 milímetros de comprimento. A temperatura dentro foi mantida em até 1.150 graus centígrados e cada ensaio (foram 25 no total) durou cerca de 100 horas. Depois que os pequenos cilindros saíam do forno, eram medidos para identificação da variação de massa. Em seguida, eram submetidos a uma análise microestrutural por meio de vários instrumentos.

Nessas análises, foram removidas camadas de metal para saber até onde e em que quantidade os átomos de carbono penetraram na liga. “Em alguns casos, 5% da massa do tubo era formada por carbono, que chegou a difundir-se 5 milímetros no corpo de prova”, conta o engenheiro metalurgista do IPT Marcelo Moreira, responsável pelos ensaios. Como resultado, percebeu-se que o teor de carbono cresceu de 0,8% para 5%. Com isso, a Engemasa passa a fabricar produtos com melhor capacidade de uso nas indústrias petroquímicas.

O Projeto
Desenvolvimento de metodologia de ensaios de ligas resistentes à carburação e à carburação catastrófica (nº 97/13118-5); Modalidade Parceria para Inovação Tecnológica (PITE); Coordenadora Zehbour Panossian – IPT; Investimento R$ 171.750,00 (empresa), R$ 27.146,00 e US$ 51.623,07 (Fapesp)

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