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Odontologia

Inovação dental

Grupos acadêmicos dão origem a três empresas que produzem material para dentistas

MIGUEL BOYAYANBloco cerâmico para próteses e sistemas de implantesMIGUEL BOYAYAN

Aquela dor na arcada dentária provocada por líquidos ou alimentos quentes ou frios é um problema frequente em todo o mundo, conhecido entre os dentistas como hipersensibilidade da dentina, um tecido vivo ligado ao nervo por microtubos que fica exposto quando o esmalte do dente apresenta falhas por desgaste natural ou por fatores relacionados a dietas ácidas, refluxo estomacal ou retração da gengiva. O tratamento realizado pelos dentistas deverá ganhar em breve um novo aliado com o lançamento de um material que promete combater a dor local com a reconstituição da dentina. A empresa Vitrovita Bio que está sendo formada por um grupo de pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) deverá produzir o Biosilicato, nome do produto registrado pela empresa. Ele é bioativo, formado por silício, sódio, potássio, cálcio e fósforo, na forma de pó, e capaz de se ligar ao esmalte dentário. Essa é uma das três empresas formadas a partir de projetos formulados em duas universidades paulistas.

As outras duas são a ProtMat Materiais Avançados, instalada na Incubadora para Inovação e Empreendedorismo (Inove) em Guaratinguetá, no interior paulista, especializada na fabricação de blocos cerâmicos usados na produção de próteses dentárias com projeto originado na Escola de Engenharia de Lorena, da Universidade de São Paulo (USP), e a Binderware, outra spin-off da UFSCar e da USP que tem foco na produção de um cimento reparador para aplicação na endodontia, especialidade da odontologia ligada às enfermidades na polpa e nos nervos dentais.

O Biosilicato da Vitrovita é um material depositado na abertura dos microtubos da dentina, formando uma camada contra a movimentação de fluidos quentes ou gelados até o nervo, situação que provoca a hipersensibilidade. A grande vantagem desse novo material em comparação aos usados nos tratamentos convencionais é sua capacidade de reagir e se fixar no esmalte dentário, o que possibilita um tratamento rápido e de longa duração. “Poucos minutos depois de sua aplicação, o Biosilicato induz a formação no local de uma camada de hidroxiapatita, substância que possui a mesma composição química e estrutura do tecido mineral dos dentes e ossos”, diz o engenheiro de materiais Edgar Dutra Zanotto, professor do Laboratório de Materiais Vítreos do Departamento de Engenharia de Materiais da UFSCar e um dos sócios da empresa. O Biosilicato não possui nenhum efeito tóxico e, segundo Zanotto, pode ser usado também para a remineralização do esmalte após tratamento de clareamento dental, recomposição da massa óssea em periodontia (tratamento da gengiva) e proteção pulpar, no caso de nervo exposto.

Os estudos que deram origem ao Biosilicato tiveram início em 2001 e fizeram parte da dissertação de mestrado do engenheiro de materiais Christian Ravagnani, sócio da Vitrovita, orientado por Zanotto e pelo professor Oscar Peitl. Também participaram do projeto pesquisadores da Faculdade de Odontologia e de Ciências Farmacêuticas da USP de Ribeirão Preto. O desenvolvimento recebeu financiamento dos programas Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe) e Apoio à Propriedade Intelectual, ambos da FAPESP.

MIGUEL BOYAYANCimento reparadorMIGUEL BOYAYAN

Barreira mineral
Também sediada em São Carlos, a Binderware espera colocar no mercado ainda este ano o cimento reparador chamado de aluminoso e desenvolvido sob a coordenação do professor Victor Carlos Pandolfelli, da UFSCar. O produto, que teve a patente licenciada pela universidade, foi batizado de EndoBinder. Ele é formado por uma composição à base de cimento de aluminato de cálcio (óxidos de alumínio e cálcio) com alta pureza misturado a aditivos que permitem aplicações na área da endodontia. “Até o momento, nosso cimento tem sido usado com sucesso em três casos clínicos: tratamentos de perfurações das paredes do canal da raiz do dente, obturação da ponta da raiz dentária e como selador em quadros que o dente passa a ser absorvido pelo próprio organismo. Nesse caso, o cimento cria uma barreira de proteção na região da absorção”, explica o engenheiro Hebert Rossetto, um dos sócios da Binderware.

“O EndoBinder é um agregado mineral que representa uma nova geração desse tipo de material ”, diz a engenheira Tathiana Moreira, diretora da Binderware. Segundo ela, o produto tem menor tempo de endurecimento do que o material usado no tratamento convencional, sua coloração é naturalmente branca, próxima à da estrutura dental, tem porosidade reduzida e possui boa resistência a compressão. A empresa começou a operar no início do ano passado na incubadora ParqTec, de São Carlos, e em dezembro último instalou-se em sede própria.

Criada em dezembro de 2007, a ProtMat aguarda o aval da Anvisa para comercialização de seus blocos cerâmicos usados para fabricação de pilares intermediários e próteses dentárias. Pilares são conectores entre implantes – os pinos introduzidos no osso – e a prótese. Os materiais cerâmicos escolhidos têm compostos de zircônia estabilizada com ítria ou alumina. A zircônia é uma cerâmica sintética fabricada a partir do minério zirconita. “A zircônia estabilizada com ítria é uma das cerâmicas com maior resistência à fratura. Além disso, ela possui boas características para sua aplicação como componentes de próteses dentárias, boa adesão com cerâmicas de recobrimento de próteses, porcelanas e excelente translucidez”, destaca o engenheiro Claudinei dos Santos, professor do programa de pós-graduação da Escola de Engenharia de Lorena da USP e sócio da ProtMat junto com o professor Carlos Elias, do Instituto Militar de Engenharia (IME), do Rio de Janeiro.

O desenvolvimento desse novo ma­terial cerâmico ocorreu durante o projeto Jovens Pesquisadores, da FAPESP, finalizado em setembro de 2008. “O objetivo do projeto era criar no país pilares intermediários de material cerâmico para serem utilizados em sistemas de implantes dentários”, explica Santos. “Esses pilares são usualmente metálicos, o que traz o inconveniente de reduzir a qualidade estética das próteses, pois escurecem quando observadas contra a luz. A ideia foi substituir esses pilares metálicos por cerâmicas de alta resistência mecânica que tivessem boa aparência. Criamos, então, os blocos cerâmicos de zircônia que são usinados e transformados em pilares ou nas próprias próteses.”

A partir das imagens digitalizadas de modelos de um dente, por exemplo, um software determina todos os parâmetros necessários para fabricação da peça. “Nossa empresa verificou que num futuro próximo vários centros de usinagem protéticos irão se instalar no Brasil. Assim poderemos fornecer materiais cerâmicos com propriedades mecânicas e preços competitivos para suprir o consumo desses centros”, diz Santos.

Os Projetos
1. Desenvolvimento e caracterização de pilares cerâmicos biocompatíveis à base de compósitos ZrO2Al2O3 (nº 04/13523-2); Modalidade Programa Jovens Pesquisadores; Coordenador Claudinei dos Santos – USP; Investimento R$ 233.935,00 e US$ 1.280,00 (FAPESP)
2. Desenvolvimento de processo otimizado e economicamente viável para a produção de biosilicato para tratamento da hipersensibilidade dentinária (nº 04/07435-3); Modalidade Pesquisa Inovativa na Pequena e Micro Empresa (Pipe); Coordenador Christian Ravagnani – Vitrovita; Investimento R$ 416.231,85 e US$ 121,64 (FAPESP)

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