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Sociologia

As medidas da mulher paulista

Banco de dados consolida informações sobre a identidade social feminina em São Paulo

MIGUEL BOYAYANA mulher paulista está prestes a colocar as mãos em um importante instrumento para a defesa dos seus direitos. São Paulo vai ganhar um banco de dados sobre a mulher, recheado de mapas, tabelas e gráficos para os 645 municípios do Estado. Pela primeira vez, indicadores de variadas fontes foram organizados de modo a trabalhar sob a perspectiva de gênero – a análise a partir das identidades sociais associadas às diferenças entre os sexos. O trabalho, denominado Perfil Sociodemográfico da Mulher Paulista, mas que deverá ser conhecido pelo nome SPMulheres em Dados, estará disponível a partir de 8 de março, não por coincidência o Dia Internacional da Mulher. Com ele, toda a população passará a ter acesso a informações integradas em um único sistema, sujeito a constante atualização. Há cidades do interior de São Paulo que não tem dado específico nenhum sobre a questão feminina.

O trabalho foi realizado pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) em parceria com o Conselho Estadual da Condição Feminina (CECF), dentro do Programa de Pesquisas em Políticas Públicas da FAPESP. O banco de dados era uma reivindicação do conselho, que sentia necessidade de uma fonte de informações capaz de revelar a situação da mulher no Estado, para, assim, poder acompanhar e formular políticas públicas. Por meio do SPMulheres em Dados será possível tanto monitorar cada cidade paulista quanto ter uma visão de conjunto do Estado. “O mais importante é propiciar aos municípios informações que permitem diagnosticar fenômenos e formular políticas públicas passíveis de serem implementadas pelas prefeituras, conselhos municipais e associações de mulheres. Abrem-se caminhos para o fortalecimento de ações de gênero em âmbito social”, diz Maria Cecilia Comegno, do Seade, coordenadora do projeto.

O trabalho foi dividido em grandes áreas: População, Saúde e Direitos Reprodutivos, Educação, Mercado de Trabalho, Violência contra a Mulher e Participação Política. Para escolher esses temas foram estudados documentos de conferências que tratavam da condição feminina no mundo todo, além de discutir as prioridades com o CECF. A equipe do Seade rastreou todas as informações disponíveis, dispersas e fragmentadas em diversas fontes, para construir esse serviço. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística é um dos colaboradores – estão sendo utilizados o Censo de 1991 e o de 2000, para poder estabelecer uma comparação.

Esse banco de dados será “inaugurado” no dia 8 de março, mas continuará em construção até o mês de setembro. Mesmo não estando totalmente pronto, já revela informações significativas sobre a situação feminina em São Paulo. Constata-se que houve uma redução da taxa de fecundidade. Por conta disso, a pirâmide etária tende a se tornar um barril: a base ficará estreita por causa da diminuição do número de nascimentos e o topo alargará porque a população está sobrevivendo mais (as idosas já representam 10% da população feminina). “A partir dessa constatação, devem ser pensados planejamentos para diversos setores, como saúde, educação e lazer”, afirma Lúcia Mayumi Yazaki, responsável pelo setor de População do projeto.

O setor de Saúde e Direitos Reprodutivos só confirmou a tendência da queda da fecundidade. Em 2000, a taxa correspondia a 2,16 filhos por mulher (em 1991 era de 2,4 filhos), sendo que a região que tem o menor índice é a de São José do Rio Preto, com 1,64 filho por mulher. Verifica-se também que 75 em cada 1.000 adolescentes de 15 a 19 anos foram mães na década passada. Na Europa, cerca de 10 em cada 1.000 meninas deram à luz.Os casos de Aids no Estado tiveram uma expansão em termos territoriais. Em 1991, 132 municípios tinham casos notificados de mulheres infectadas. Em 2000 esse número passou para 255. A incidência é ainda maior entre os homens – 29,9 por 100 mil homens, enquanto para as mulheres foi de 15,1. Zilda Pereira da Silva, do Seade, alerta sobre a situação das meninas, tema do Ministério da Saúde para a campanha pelo uso da camisinha para o Carnaval 2003: “De 1991 a 2000, o número de casos entre as adolescentes aumentou”.

Coração
O que mais mata as paulistas são as doenças cardiovasculares. Elas foram responsáveis por 36% das mortes em 2001. Em segundo lugar vêm os cânceres. O de maior incidência é o de mama (14,5 por 100 mil mulheres), seguido pelo de cólon (7,6); pulmão (6,6); estômago (5,9) e colo do útero (4,6). Quando se considera o período de 1980 a 2001, os cânceres de mama, pulmão e colorretal tiveram aumentos de 60%, 79% e 74%, respectivamente. “A elevação se deve não só ao estilo de vida das mulheres, mas também ao envelhecimento populacional”, diz Cecília Polidoro Mameri, responsável por esse setor no banco de dados. Em terceiro lugar vêm as mortes por complicações do aparelho respiratório e em quarto as endocrinológicas. As causas externas estão em quinto, com um dado surpreendente: considerando-se o período de 1980 e 2001, o índice de acidentes de trânsito diminuiu em 30%, mas o de homicídios aumentou 120%.

A área de Educação trata não só da mulher nos bancos escolares como das crianças. Dados de 2000 mostram que o atendimento à população de 0 a 6 anos ainda é insuficiente. Em mais da metade dos municípios paulistas (379), as taxas de atendimento situam-se entre 20,1% e 40%. Em contrapartida, o analfabetismo vem caindo. “As mulheres são as maiores beneficiárias da universalização do acesso ao ensino fundamental, uma vez que o Censo 2000, diferentemente do de 1991, aponta taxas de analfabetismo menores do que as dos homens já no grupo etário de 30 a 39 anos”, diz Catarina Aparecida Guarnieri Silvério, responsável por Educação no Seade.

Uma das boas formas de constatar as desigualdades entre os universos masculino e feminino é acessar os índices de Mercado de Trabalho. Em 2001, as mulheres correspondiam a 38,3% dos 8.185.857 empregados com vínculo formalizado no Estado de São Paulo, contra 61,7% dos homens. Mas esse índice cresce nas ocupações com vínculo não formalizado – elas representam 40% do total e atuam, em boa parte, nos serviços domésticos. A taxa de participação no mercado de trabalho vem aumentando. Era 45% da população feminina em 1995, foi para 47% em 1999 e pulou para 48,5% em 2001. “Na região metropolitana de São Paulo chega a 53%”, conta Paula Montagner, da área de Mercado de Trabalho no Seade.

Estupro
É difícil avaliar a área de Violência contra a Mulher, pois muitos casos não chegam às delegacias (126 municípios paulistas têm Delegacias de Defesa da Mulher). A equipe do Seade optou por averiguar os casos de estupro (os únicos em que as vítimas são apenas mulheres) e atentado violento ao pudor (em que elas são a maioria). Constatou-se que os números permanecem estáveis no Estado – a taxa de estupro por 100 mil passou de 29,18 em 1997 para 26,90 em 2001. Para Renato Sérgio de Lima, do Seade, como o índice é estável, as políticas públicas devem interferir a médio e longo prazo. “São necessárias estratégias para conquistar a confiança da população e, ao mesmo tempo, combater a criminalidade.”

Na área de Participação Política constatou-se que o número de candidaturas a deputadas federais aumentou 27,9% em relação a 1998. Mesmo assim, nem todos os partidos preencheram as cotas (no mínimo 30% e no máximo 70% para cada sexo). Houve um pequeno aumento de eleitas: em 1998 foram quatro, e em 2002, seis. Na Assembléia Legislativa, o volume de candidaturas femininas cresceu 37,5% em relação a 1998. Em 2002 elegeram-se dez – no ano passado, elas eram sete. Mas a força feminina é maior nas Câmaras de Vereadores. No ano passado, 13.317 mulheres se candidataram, representando 20% do total. Dessas, 812 foram eleitas.

Há um mundo de informações no SPMulheres em Dados e a preocupação dos técnicos do Seade é que elas sejam apresentadas de maneira simples, para facilitar a utilização. Integrantes do CECF já fizeram testes para avaliar a navegação e aprovaram. “A tabela não vem pronta, acabada, você pode montar do jeito que quiser, de acordo com seu interesse”, diz Maria Aparecida de Laia, presidente do conselho, que não será o único “consumidor” dessa valiosa fonte de informação.

O endereço eletrônico, disponível a partir de 8 de março, é: http://www.seade.gov.br ou http://www.condicaofeminina.com.br.

O projeto
Perfil Sociodemográfico da Mulher Paulista (nº 00/02038-5); Modalidade Programa de Pesquisas em Políticas Públicas;
Coordenadora Maria Cecilia Comegno – Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade); Investimento R$ 100.045,55

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