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Engenharia Eletrônica

Reconhecimento digital

Sistema desenvolvido pela empresa Griaule está entre os melhores do mundo

EDUARDO CESARControlar a entrada e a saída de funcionários na empresa, acessar caixas eletrônicos de bancos e proteger o computador doméstico ou profissional contra olhares indiscretos são algumas das aplicações de um software de reconhecimento de impressões digitais desenvolvido pela empresa Griaule, de Campinas, que já conquistou clientes nos Estados Unidos, México, Chile, Venezuela e Israel. Recentemente a tecnologia da empresa para a emissão de passaportes foi comprada pela Costa Rica, por meio da empresa francesa Oberthur, que produz esse tipo de documento para 80 países. Este ano a tecnologia da Griaule foi incorporada às 25 mil urnas eletrônicas com leitores de impressão digital entregues ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pela Procomp, uma das empresas parceiras, previstas para serem utilizadas nas próximas eleições.

O programa foi considerado o oitavo melhor do mundo em um teste de grande escala – 1 bilhão de comparações de impressões digitais – realizado em 2003 pelo Instituto Nacional de Padrões e Tecnologia (Nist, na sigla em inglês), nos Estados Unidos. Uma posição invejável para uma pequena empresa que disputou com gigantes do setor como Motorola e NEC. Algumas grandes, como a Raytheon, ficaram atrás da Griaule, a única empresa do hemisfério Sul a participar do teste. Os participantes selecionados tinham 21 dias para completar a prova. A classificação foi feita com base na qualidade do reconhecimento da impressão digital. Em outubro deste ano a Griaule participou de um teste semelhante realizado pela Universidade de Bolonha, na Itália. Segundo os pesquisadores da empresa, o programa deve ficar em terceiro lugar.

No Brasil, o sistema de identificação digital está sendo utilizado pelas secretarias de Segurança Pública do Tocantins, Rondônia e Goiás para a emissão de carteiras de identidade e pelo Departamento Estadual de Trânsito (Detran) de Pernambuco para evitar fraudes na emissão de carteiras de habilitação. O estado do Tocantins foi o primeiro cliente a adotar o software da empresa, quando a Secretaria de Segurança Pública decidiu substituir a tecnologia importada utilizada na identificação civil e criminal, por conta do alto custo para expandir e manter a base de dados.

O sistema utilizado atualmente captura eletronicamente as impressões digitais dos dez dedos, a foto e a assinatura de cada pessoa, ou permite a digitalização dessas informações colhidas em papel. Após a comparação no sistema da Griaule é emitida a carteira de identidade, processo que leva apenas dez minutos. Hoje já são cerca de 1 milhão de impressões digitais cadastradas no banco de dados da secretaria estadual. A Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) também adotou o sistema de reconhecimento digital da empresa para verificar a identidade dos candidatos aos exames vestibulares, realizados duas vezes por ano pela instituição e com cerca de 50 mil concorrentes cada um.

A conquista de tantos nichos de mercado impressiona pelo pouco tempo de existência da empresa, criada em 2002. Ela foi uma das primeiras a ser abrigada na Incubadora de Empresas de Base Tecnológica da Unicamp (Incamp). Antes disso, em 1999, os dois sócios da Griaule, o engenheiro eletricista Iron Calil Daher e o engenheiro de computação Alberto Fernandes Canedo, na época estudantes da Universidade Federal de Goiás, começaram a trabalhar juntos no desenvolvimento de componentes de software para reconhecimento digital, um dos métodos de identificação mais utilizados mundialmente nos sistemas biométricos, que substituem as tradicionais senhas pela análise de partes do corpo humano, como íris, face, mãos, voz e até assinatura.

Acesso liberado
A autenticação biométrica envolve duas fases. A primeira de registro da impressão digital, da imagem da íris ou da face, gravação de voz e outras particularidades pessoais. As características-chave são então convertidas por meio de algoritmos (conjunto de soluções e operações matemáticas construídas para resolver um problema) em um padrão único, armazenado como um dado numérico criptografado. Na prática isso significa que o sistema não grava a foto do rosto ou da impressão digital, mas o valor que representa a identidade biométrica do usuário. Na segunda fase, para poder ter o acesso liberado, o usuário deve apresentar ao sistema sua característica biométrica, que será comparada ao padrão registrado no banco de dados.

Para aprimorar os algoritmos e aperfeiçoar o processamento das informações nos computadores, a Griaule obteve financiamento da FAPESP na modalidade Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe). A empresa recebeu também aporte financeiro da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep), do Ministério da Ciência e Tecnologia, no valor de R$ 250 mil, para um projeto aprovado no âmbito do CT-Info, Fundo Setorial para Tecnologia da Informação.

O faturamento anual, que era de R$ 100 mil em 2003, hoje está na casa dos R$ 3 milhões. As exportações correspondem a 80% desse total, sendo os Estados Unidos o principal mercado, o que levou a empresa a abrir em fevereiro deste ano uma filial em San José, no estado da Califórnia, no Vale do Silício, sob o comando direto de Daher. A Griaule possui seis certificações do Federal Bureau of Investigation (FBI), a polícia federal norte-americana, o que a habilita a participar de licitações realizadas nos Estados Unidos.

“O nosso software não é um produto final”, explica André Nascimento de Paula, gerente de Cooperação Institucional da empresa. A Griaule desenvolve componentes de software para empresas que integram os componentes em um produto. Chamadas de integradoras, essas empresas se encarregam da formatação final do produto, de acordo com as necessidades dos seus clientes, que englobam pequenos estabelecimentos, grandes corporações e governos.

No ano passado a Griaule deixou a incubadora e foi para uma casa alugada próxima à Unicamp. Na entrada, um leitor de digitais instalado na parede ao lado da porta identifica os 20 funcionários, metade dos quais tem mestrado ou doutorado. A identificação funciona em duas etapas e não demora mais do que dois segundos. A primeira fase, chamada de captura, tem início quando o dedo é colocado no equipamento de identificação e leva um segundo. A segunda etapa, de pesquisa, avalia 30 mil digitais em um segundo.

EDUARDO CESARLeitor de digitais substitui senhas e crachásEDUARDO CESAR

Versão gratuita
O foco comercial da Griaule é amplo, abrangendo os clientes corporativos e os governamentais. Para os clientes corporativos e consumidores finais, a empresa desenvolveu o Desktop Login, que substitui a senha pela impressão digital para acessar o computador, o Desktop Identity, para pontos de venda e controle de ponto, e o Rex 2006, controle de acesso com leitor de identificação digital que funciona em rede e permite fácil integração com fechaduras elétricas e catracas. O Desktop Identity, que tem uma versão para distribuição gratuita pela internet, pode ser instalado em qualquer instituição para aperfeiçoar o controle e o tráfego de pessoal. A versão gratuita também traz um kit de desenvolvimento destinado aos engenheiros de computação interessados em criar novas aplicações sobre as tecnologias de reconhecimento digital da empresa.

Os clientes governamentais contam com o programa chamado Afis (Automated Fingerprint Identification System), que faz o reconhecimento digital em grande escala e permite a identificação civil e criminal, o controle de fronteiras e presídios, além da emissão de documentos como carteira de identidade, carteira nacional de habilitação, passaporte, título eleitoral e outros. Mesmo em gigantescas bases de dados, com centenas de milhões de impressões digitais cadastradas, o reconhecimento pode ser feito em poucos segundos. Como qualquer estado brasileiro tem milhões de impressões digitais, já que são dez impressões digitais por pessoa, a empresa desenvolveu o Speed Cluster, uma tecnologia em que dezenas de computadores trabalham paralelamente para processar o banco de dados, acelerando a resposta da pesquisa efetuada. No ano passado a empresa recebeu o Prêmio Finep de Inovação Tecnológica na categoria pequena empresa, concedido pela Financiadora de Estudos e Projetos.

Atualmente a Griaule trabalha em outro projeto de biometria, de detecção e reconhecimento digital da face humana. “Queremos fazer até 2008 um produto de multibiometria, o que engloba o reconhecimento de assinatura e voz”, diz Daher. Estudo realizado pelo International Biometric Group (IBG), empresa de consultoria do setor dos Estados Unidos, aponta que as vendas globais dos equipamentos de biometria vão saltar de US$ 2,1 bilhões em 2006 para US$ 5,7 bilhões em 2010. O reconhecimento de impressões digitais, o mais difundido e barato dos sistemas biométricos, deve responder por 44% do mercado global do setor neste ano, enquanto a autenticação da face aparece em segundo lugar, com 19%.

O mercado para os sistemas biométricos está em crescimento contínuo, mas ainda não atingiu um pico e também não tem uma empresa líder, o que coloca a Griaule em uma situação privilegiada. “Estamos no mercado há algum tempo, temos um algoritmo bem desenvolvido, clientes, cadeia de distribuição bem definida e uma estrutura de pesquisa e desenvolvimento organizada”, diz Daher.

O Projeto
Melhoramento da qualidade do reconhecimento e da disponibilidade (Speed Cluster) do Griaule Afis (nº 03/07972-6); Modalidade Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe); Coordenador Iron Calil Daher – Griaule; Investimento R$ 301.800,00 (FAPESP)

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