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pesquisa empresarial

Renovação química

Dow investe em cana-de-açúcar como matéria-prima renovável para produção de plásticos

A partir da esquerda, Henrique Noguchi e  Iris Tébéka (em pé), Fernanda Bueno e John Biggs (sentados) e Daniel Cardinali

Léo Ramos A partir da esquerda, Henrique Noguchi e Iris Tébéka (em pé), Fernanda Bueno e John Biggs (sentados) e Daniel CardinaliLéo Ramos

Criada no final do século XIX nos Estados Unidos, a Dow Química tem hoje em seu portfólio mais de 5 mil produtos que servem de matéria-prima para diversos setores, como automotivo, eletrônico, eletrodoméstico, de energia, tintas e revestimentos, agricultura e cuidados pessoais. Em 2012, a companhia empregou cerca de 54 mil funcionários e suas vendas atingiram US$ 57 bilhões no mundo. Os investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) chegaram a US$ 1,6 bilhão. No Brasil, onde se estabeleceu em 1956 com um escritório de vendas, conta atualmente com mais de 2,4 mil funcionários, 15 unidades fabris e quatro centros de pesquisa em que trabalham cerca de 300 pessoas, entre técnicos e pesquisadores. O escritório de São Paulo, onde também fica um dos centros de pesquisa, é a sede da América Latina. No ano passado, a empresa registrou no país vendas de US$ 3,3 bilhões. “Temos projetos globais para buscar matérias-primas renováveis e o foco está no Brasil”, diz o engenheiro químico John Biggs, de 58 anos, diretor da Dow para a América Latina.

Um desses projetos, em colaboração com a japonesa Mitsui, tem como objetivo a fabricação de polietileno de baixa densidade – utilizado na fabricação de embalagens flexíveis, filmes industriais e artigos plásticos – a partir do etanol da cana-de-açúcar. As duas empresas são parceiras em todas as etapas do projeto, iniciado com a formação de um canavial em uma área de 17 mil hectares e a construção de uma usina com capacidade para produzir 240 mil metros cúbicos de etanol por ano em Santa Vitória, Minas Gerais. O projeto prevê ainda a construção de uma fábrica de transformação de etanol em etileno e a produção de biopolímeros. A transformação do etanol em etileno é feita pelo processo de desidratação por meio de um catalisador, que acelera a reação química. “No final do processo, o etileno e a água já saem separados”, diz o inglês Biggs, que está na Dow desde 1985 e no Brasil há quase nove anos. “A água será utilizada no sistema de produção de vapor para geração de energia elétrica.”

Dow Química
Centro de P&G
São Paulo, SP
Nº de funcionários:
2,4 mil
Principais produtos:
Matérias-primas para setores automotivo, eletrônico, eletrodoméstico, de energia, tintas e revestimentos, agricultura e cuidados pessoais

Daniel Albuquerque Cardinali, de 28 anos, engenheiro de P&D de matérias-primas renováveis, faz parte da equipe de Biggs desde que entrou na Dow em 2011 como trainee. “Mais de 50% das novas contratações nessa área são feitas pela chamada anual do programa de trainee”, relata Biggs. São cerca de 14 mil inscritos para 50 vagas, das quais oito destinam-se à área de pesquisa. Cardinali cursava o primeiro ano de mestrado na área de engenharia e ciência dos materiais na Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) – onde também se graduou em engenharia dos materiais – quando ingressou na empresa. Seu trabalho se divide em duas vertentes: pesquisa e desenvolvimento de novas rotas tecnológicas para os renováveis e desenvolvimento de novos negócios, o que significa identificar oportunidades interessantes para a Dow, seja com outras empresas, institutos de pesquisa ou universidades para construção de parcerias. “A inovação na Dow é apoiada em colaborações com parceiros brasileiros e externos”, diz Cardinali.

Na área de renováveis, por exemplo, a empresa tem parcerias com o Laboratório Nacional de Ciência e Tecnologia do Bioetanol (CTBE) e com as universidades de Queensland, na Austrália, e do estado de Ohio, nos Estados Unidos. Entre as atribuições de Cardinali está, por exemplo, a negociação com possíveis parceiros sobre a divisão da propriedade intelectual na exploração de tecnologias. “Meu dia a dia é bastante dinâmico, com visitas a universidades, institutos de pesquisas, além de participação em eventos e simpósios com o objetivo de criar uma rede de colaboração.”

Duplo diploma
Henrique Formaggi Noguchi, de 25 anos, que trabalha atualmente como engenheiro de desenvolvimento e aplicação do grupo de elastômeros, também passou pelo processo de seleção para escolha dos novos trainees de 2012. Formado em engenharia de materiais pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), ele participou de um programa de intercâmbio da universidade com a École Centrale Paris para obtenção de duplo diploma. “Pelo intercâmbio, cursei quatro anos da faculdade aqui e dois na França”, diz. Aprovado na Dow para uma das vagas na área de P&D, Noguchi trabalhou inicialmente no grupo de pesquisa de renováveis. “Durante oito meses pesquisei tanto a parte agrícola como a química da palha da cana, que tem bastante celulose e hoje, após a proibição gradativa da queimada da cana crua, é deixada principalmente no campo”, relata. Os resultados de suas pesquisas passaram a integrar outros projetos da Dow, como o de produção de polietileno de baixa densidade com a Mitsui.

Teste de resistência a fungos e algas

Léo RamosTeste de resistência a fungos e algasLéo Ramos

Após a experiência inicial, Noguchi assumiu o cargo de engenheiro de desenvolvimento e aplicação do grupo de elastômeros e tornou-se responsável pela carteira de clientes de algumas aplicações na América Latina. Nessa função, ele presta assistência técnica para os clientes e acompanha também o desenvolvimento de aplicações para novos produtos desenvolvidos nos Estados Unidos e Europa, onde estão os principais centros de pesquisa e desenvolvimento da empresa. “O desenvolvimento de aplicações engloba, além da fórmula e do processamento do produto, o posicionamento do cliente no mercado”, diz Noguchi. “Trabalho com a equipe comercial e de marketing, porque uma invenção por si só não tem valor no mercado.”

Com menos de 10 meses na Dow e ainda na condição de trainee na área de P&D, Fernanda Bortolani Bueno, de 25 anos, também trabalha no grupo de elastômeros, com atendimento técnico aos clientes. “A partir da necessidade do cliente, analisamos se podemos adaptar os nossos produtos à sua demanda ou até a necessidade de criar novos processos ou tecnologias”, relata a engenheira química graduada na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Semanalmente ela fala com a líder do seu grupo nos Estados Unidos, que acompanha sua evolução profissional. No Brasil ela tem o respaldo de uma tutora (coaching), que também foi trainee cinco anos atrás.

Os principais parceiros nas pesquisas feitas no Brasil são a Escola Politécnica da USP e o Departamento de Engenharia de Materiais da UFSCar. “Temos uma relação de colaboração quase permanente”, diz Biggs. O estreito relacionamento também resulta no contato com alunos que posteriormente são contratados para a área de P&D, a exemplo do que ocorreu com a química Iris Raquel Maia Tébéka, de 27 anos, graduada pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE). Ela veio para São Paulo em 2007 fazer o doutorado direto na área de síntese orgânica na USP e, durante uma visita do pesquisador Rui Cruz – que na época pertencia ao grupo de matérias-primas renováveis da Dow – ao Instituto de Química teve um primeiro contato com o programa de recrutamento da empresa. “Não tinha ainda um caráter de seleção, mas o contato se manteve e resultou em uma entrevista antes de eu viajar para o pós-doutorado na Universidade de Estocolmo, na Suécia”, relata Iris.

Rotas alternativas
Quando ela retornou ao Brasil em fevereiro deste ano, após três anos em Estocolmo, já começou a trabalhar como pesquisadora de P&D de matérias-primas renováveis. “Fiz meu percurso acadêmico completo, mas sempre tive certeza de que queria trabalhar na indústria e em uma área em que a formação acadêmica fosse indispensável”, diz. Seu trabalho diário é pesquisar o desenvolvimento de novos processos e inovações que possam substituir as rotas petroquímicas por rotas alternativas renováveis. Não é uma pesquisa tradicional de laboratório. “Aqui tratamos, analisamos e aplicamos todo tipo de dados experimentais obtidos nas colaborações com laboratórios externos”, diz Iris. “Tudo o que analisamos, mesmo em termos de dados experimentais e de pesquisa bibliográfica, tem de ser cruzado com uma análise financeira do mercado e de dados internos da empresa, como custo de produção, mercado e logística.”

Diluição de produtos biossintéticos

Léo RamosDiluição de produtos biossintéticosLéo Ramos

A Dow também está à frente de um projeto de pecuária sustentável em Paragominas, no Pará, para aumentar a produtividade do rebanho bovino de forma sustentável, por meio de parcerias. Em 2010 teve início o primeiro piloto do projeto em seis fazendas na região, com intervenções simples como a fertilização das pastagens, a utilização de espécies forrageiras mais produtivas e o controle das plantas invasoras. “Um ano após o início do projeto, as fazendas já eram consideradas um exemplo em manejo sustentável e tiveram sua produtividade quadruplicada”, diz Biggs. A produção passou de 0,8 para 3,66 arrobas por hectare.

A empresa incentiva seus funcionários a participar do processo de inovação por meio de canais como o Idea Central, um portal em que todos podem dar sugestões, e o Innovation@Dow Challenge, que consiste em propostas de soluções para desafios reais. Anualmente promove o Innovation Award, que premia os projetos mais inovadores apresentados por pesquisadores da América Latina. No ano passado, por exemplo, o vencedor propôs o desenvolvimento de um revestimento impermeabilizante para lajes, telhados e coberturas, lançado com o nome comercial de Telhado Branco, para reduzir a temperatura nas cidades. “Estudos demonstram que, ao utilizar essa solução, há um ganho considerável em eficiência energética com redução de até 5ºC na temperatura interna e de até 18ºC na superfície externa do telhado”, diz Biggs.

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