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Neil Geoffrey Turok

Neil Geoffrey Turok: Em busca de jovens brilhantes

Diretor de instituto canadense quer atrair físicos inovadores de todo o mundo e os motivar a fazer as descobertas fundamentais para as próximas décadas

024-029_Entrev_Turok_1Léo RamosEm 2002, o político sul-africano Ben Turok, aos 75 anos, ligou da Cidade do Cabo para o filho Neil Turok, professor de cosmologia na Universidade de Cambridge, na Inglaterra, para pedir que o ajudasse a melhorar a educação universitária na África. Então com 44 anos, Neil começou a idealizar um novo modelo de instituição acadêmica. Um ano depois nascia o African Institute for Mathematical Sciences (Aims), um instituto interdisciplinar criado em Muizenberg, próximo à Cidade do Cabo, onde estudantes de graduação de toda a África fazem cursos breves, em geral de um ano, centrados na análise matemática de dados científicos em qualquer área.

A ousadia de Neil Turok fez com que ele fosse convidado, cinco anos depois, a dirigir o Perimeter Institute for Theoretical Physics, um dos mais inovadores centros de física teórica, sediado em Waterloo, na província de Ontário, no Canadá. Criado em 1999 a partir de uma doação de US$ 100 milhões de Mike Lazaridis, fundador da empresa de celulares Blackberry, e mantido por doações particulares e pelo governo canadense, o instituto recruta físicos jovens e entusiasmados de todo o mundo – seis estudantes de graduação da América do Sul foram selecionados entre os 100 participantes de um workshop realizado em julho em São Paulo para fazer o mestrado conjunto entre o Perimeter e o Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista (IFT-Unesp).

“Precisamos de pessoas incomuns, com maneiras completamente diferentes de ver as coisas”, disse Turok, especialista em modelos teóricos sobre a origem do universo. Em 1996, com seu grupo, ele apresentou uma previsão das propriedades da radiação cósmica de fundo, confirmadas pelo satélite WMAP 10 anos depois. Coautor do livro de divulgação científica Endless Universe: Beyond the Big Bang (2006, não traduzido para o português), Turok esteve em São Paulo em novembro para participar de um simpósio internacional promovido pelo Instituto Sul-americano para Pesquisa Fundamental (SAIFR), que funciona em conjunto com o IFT e o Centro Internacional de Física Teórica (ICTP) em São Paulo. Após sua apresentação, ele conversou com Pesquisa FAPESP sobre suas estratégias para atrair e motivar os melhores físicos do mundo, em busca de avanços notáveis.

Idade
58 anos
Especialidade
Cosmologia
Formação
Graduação em física pelo Churchill College, Universidade de Cambridge, e doutorado em física no Imperial College, ambos no Reino Unido
Instituições
Professor de física na Universidade de Princeton, Estados Unidos, de 1994 a 1997. Cátedra de física matemática da Universidade de Cambridge, de 1997 a 2008. Diretor do Instituto Perimeter desde 2008
Produção científica
219 artigos, índice-h de 69

Você já disse várias vezes, em outras entrevistas, que seu maior sonho é ajudar a revelar o próximo Einstein. Como quer fazer isso?
Esse é meu objetivo de vida: quero criar um ambiente ótimo onde o próximo Einstein virá e conseguirá o que precisa para realizar a próxima revolução na física. Meu trabalho e o de todos no Perimeter é criar o ambiente em que um jovem brilhante possa um dia dizer: “Aha! Eu sei o que está faltando!”. Daqui 10 ou 20 anos, tenho certeza de que olharei para trás e pensarei: “Ajudei X a realizar essa descoberta”. E essa única descoberta vai justificar tudo. Como descobrimos a teoria da relatividade? O conceito é extremamente simples depois que você o entende, mas quase impossível antes de Einstein descobri-lo. Precisamos de pessoas incomuns, com maneiras completamente diferentes de ver as coisas. Digo a todos os funcionários do Perimeter: “Vamos tratar todo mundo, do mais sênior ao mais júnior, como se um deles pudesse ser o próximo Einstein”. As novas ideias provavelmente virão de novas comunidades, que trazem novas abordagens, frescor e entusiasmo, que são essenciais. O investimento em jovens tentando resolver os problemas mais difíceis é de retorno quase garantido. E esses jovens vão se tornar intelectuais e físicos bem-sucedidos e serão modelos para toda a sociedade. De certa maneira, as realizações de um Einstein são simbólicas e mostram o que os seres humanos podem alcançar. Ver um brasileiro fazer isso seria incrível, daria orgulho para todo mundo. Os cientistas deveriam ser tão valorizados pela sociedade quanto os atletas e os músicos. A diferença entre eles é que as descobertas da ciência afetam a sociedade para sempre.

Antes de ir para o Perimeter, você criou o Instituto Africano para Ciências Matemáticas. Como foi?
Meus pais, Mary Butcher e Ben Turok, faziam parte de um grupo de ativistas políticos contra o regime do apartheid [segregação racial] e corriam sério risco de morte. Foram presos, quando eu ainda era pequeno, e tivemos de deixar o país. Tive uma infância difícil como refugiado na Inglaterra. Mas eles estavam comprometidos com uma boa causa, com uma visão de longo prazo, e o que aconteceu em 1994, com as primeiras eleições gerais na África do Sul, provou que eles estavam certos. O exemplo político de meus pais foi fundamental para a minha atitude em ciência. Em 2002, quando era professor em Cambridge, meus pais, na época parlamentares na África do Sul, me ligaram perguntando se eu poderia fazer algo para elevar o nível da educação no continente africano. Respondi que não sabia o que fazer, eu era um cosmólogo estudando o Big Bang. Eles insistiram. Tive então a ideia de criar um instituto pan-africano em que estudantes brilhantes de qualquer lugar da África pudessem frequentar, de graça, por um ano. Traríamos os melhores professores do mundo para visitar o instituto, cada um por três semanas, para dar aulas, discutir e conviver com os estudantes. Para me ajudar a pensar como fazer isso na prática, tive ajuda de meu irmão, Fred Turok, um homem de negócios, gerente de uma das maiores cadeias de academias do Reino Unido, a LA Fitness.

Como seu irmão o ajudou?
Ele me deu conselhos valiosos sobre como fazer um plano de negócios e arrecadar recursos. Então, em um momento mágico, percebi, como físico teórico, que o planejamento é um exercício teórico. Você tem uma ideia e começa a planejar como fazer essa ideia funcionar, calcula quanto dinheiro precisa, tenta antecipar todos os riscos, coloca tudo no papel de maneira cada vez mais rigorosa até atingir o ponto em que é capaz de convencer qualquer investidor de que esse é o melhor investimento que pode fazer. Passei um ano planejando e testando ideias com meus colegas até entender por que os sistemas tradicionais fracassam. A África forma 1 milhão de estudantes de graduação por ano, mas a graduação oferece cursos muito tradicionais e não os prepara para o mercado de trabalho. É muito raro um departamento de universidade oferecer um curso em análise de dados, que é uma habilidade necessária em todas as ciências. Pensei então em fazer disso a base do instituto na África. Quando os estudantes chegam, a primeira coisa que ensinamos é como usar bem um computador, aprender os fundamentos de como programar e analisar dados. Depois temos cursos em resolução de problemas. Se lhe dão algum problema novo, você diz que essa não é sua área ou pede para examinar? Criamos um curso de mestrado focado nas habilidades de que os jovens cientistas precisam na prática, especialmente as relacionadas a dados. Foi um sucesso.

E os professores, o que acharam?
Os professores também se empolgaram em participar dessa abordagem interdisciplinar. Pensamento livre, resolução de problemas, abordagens novas. Criar novas instituições acadêmicas nos dá a oportunidade de revisitar as noções que assumimos como verdadeiras e ultrapassá-las. Em lugares na África sem linhas telefônicas fixas instaladas, começaram a usar telefones celulares. Não precisaram instalar cabos telefônicos na África, pularam essa etapa. Podemos fazer a mesma coisa intelectualmente. Não faça os estudantes aprenderem uma quantidade enorme de física clássica. Coloque-os direto na fronteira do conhecimento, para realizar trabalho criativo, agora. Se descobrirem que precisam aprender alguma coisa, eles vão parar e aprender ou encontrar quem conheça o assunto. Queremos transformar os jovens em empreendedores do conhecimento. A melhor ciência é feita hoje por gente com espírito de aventura, não por pessoas seguindo treinamento tradicional.

Turok festeja com os estudantes no African Institute for Mathematical Sciences, no Senegal, em 2011

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Vocês têm histórias de sucesso?
Muitas. Vou dar um exemplo: Martial Loth Ndeffo Mbah. É de Camarões, um país africano muito forte em matemática, em parte por causa do legado colonial francês, mas também por causa da cultura local, que valoriza o trabalho intelectual. Esse rapaz veio até nós querendo fazer matemática pura e aprendeu epidemiologia. Por ter uma consciência social muito forte, ele percebeu que poderia usar matemática para modelar doenças e informar ao governo quais intervenções de saúde pública seriam mais eficazes. Ele fez doutorado em Cambridge em biologia matemática e hoje trabalha como professor sênior em Yale, nos Estados Unidos, e é conselheiro dos países da África Ocidental para a crise do vírus ebola. Quando o surto do ebola eclodiu, ele foi chamado imediatamente para a África Ocidental e começou a levantar dados clínicos sobre os efeitos das intervenções. O trabalho dele teve um enorme efeito positivo. Martial Loth é uma pessoa muito religiosa e, como a igreja dele atua em bairros pobres do Rio de Janeiro, ele vem ao Brasil todo ano como voluntário para ensinar crianças.

O Perimeter é famoso por apoiar abordagens ousadas. Como fazem isso?
Em junho de 2016, no Perimeter Day, os pesquisadores do instituto apresentaram seus trabalhos aos colegas em um ambiente informal, promovendo uma discussão sincera entre amigos. O tema foi gravitação quântica, o cálice sagrado da física. Cada pesquisador, não apenas os especialistas, mas também os de outras áreas, apresentou sua perspectiva. Assim que cada um terminava de falar, a plateia respondia, indicando o que estava errado, inconsistente ou incompleto. Fiquei muito satisfeito. Em outros lugares, geralmente todos reforçam as ideias uns dos outros. Dessa maneira ninguém progride, apenas continua sustentando uma visão limitada. Sou muito crítico da maioria das linhas de pesquisa que perseguimos em física teórica, inclusive com muitas das ideias em cosmologia com as quais trabalhei. Nossas teorias não são boas o suficiente. Não estão nem perto do nível das ideias de James Maxwell [1831-1879], Max Planck [1858-1947], Einstein [1879-1955] ou Paul Dirac [1902-1984]. Temos de buscar teorias poderosas, que sejam comprovadas pelos dados experimentais de maneira indisputável, e isso é muito, muito difícil. A maioria dos meus colegas me pede para dar um tempo, mas não podemos. Não podemos dar espaço para baboseira e para especulações não construtivas.

Em 2012, o Perimeter patrocinou uma série de animações de grande sucesso no YouTube, o Minute Physics [animações curtas e bem-humoradas sobre conceitos de física], produzida pelo ex-aluno Henry Reich.
Aceitamos Henry porque era um cara interessante. Gostamos dos motivos que ele apresentou para ser aceito em nosso programa de mestrado: era curioso, queria aprender mais, gostava de cinema, não sabia se faria física, mas se empolgava com o assunto. No Perimeter ele desenvolveu um projeto de pesquisa com o físico Lee Smolin, mas uma hora decidiu sair e estudar cinema. Ele começou o Minute Physics em seu tempo livre e rapidamente abandonou a escola de cinema para trabalhar em tempo integral no seu canal no YouTube. Foi então que o contratamos de volta, para ficar por um ano, desenvolvendo o Minute Physics, porque é um serviço fantástico para o mundo. Pudemos fazer isso porque queríamos explorar nossa liberdade para fazer coisas que os outros não estão fazendo ou deveriam fazer, como compartilhar com o público nossa empolgação com a física, com o que estamos aprendendo sobre o Universo. Tento resumir o que o Perimeter está fazendo em um pequeno slogan: acesso à excelência. Devemos buscar a excelência, mas de maneira que a sociedade se sinta conectada.

Como vocês se conectam com outros grupos sociais?
Waterloo, no Canadá, é uma comunidade única, tem menos de 100 mil habitantes, mas todo mundo ama matemática e física. Todo mês, o Perimeter Institute oferece uma palestra pública sobre ciência. Já trouxemos Stephen Hawking, Roger Penrose e outros gurus. Os 600 ingressos de cada apresentação se esgotam assim que os colocamos à venda no site. Waterloo era uma cidade de pequenos fazendeiros até os anos 1950. Nessa época as companhias de seguro de Toronto, a cidade grande mais próxima, começaram a se mudar para lá, para reduzir custos. Mas as empresas de seguro precisavam de matemáticos, já que o negócio delas é todo baseado em cálculo de risco. Essas empresas e outras decidiram fundar a Universidade de Waterloo, uma instituição pública diferente, centrada na matemática e suas aplicações. Para criar o departamento de matemática, contrataram alguns membros da equipe de decifradores de códigos do matemático britânico Alan Turing [1912-1954], que decifrou o código usado pelos alemães para transmitir mensagens secretas durante a Segunda Guerra Mundial. O trabalho desses pesquisadores e seus alunos levou ao desenvolvimento da criptografia que permite os telefones celulares funcionarem de maneira segura. Desde o começo a universidade era a melhor em criptografia e em aplicações da matemática em codificação. Ao redor da universidade se desenvolveu o Vale do Silício canadense, com cerca de 2.500 empresas de alta tecnologia. A empresa de celulares BlackBerry começou em Waterloo, criada por um ex-aluno da universidade, Mike Lazaridis, o idealizador do Perimeter Institute. Ele doou US$ 100 milhões para fundar o Perimeter, em 2000.

O governo canadense também financia o instituto, não?
Desde que o instituto começou a operar, em 2001, o governo federal canadense e o governo da província de Ontário contribuem cada um com US$ 10 milhões. Enquanto isso, levantamos dinheiro com doadores particulares e investimos os recursos. Nosso patrimônio atual é de US$ 320 milhões e esperamos que seja de US$ 400 milhões em 10 anos. Assim, em uma década, retirando todo ano 5% do patrimônio e mais os US$ 20 milhões anuais do governo, teremos um orçamento anual de US$ 40 milhões. Somos uma instituição sem fins lucrativos e não estamos interessados em propriedade intelectual. Se descobrirmos algo, tomaremos a mesma atitude dos inventores da world wide web. Eles a fizeram pública, para que todos se beneficiassem dela. Acredito que um dia seremos capazes de conseguir doadores privados para pagar por todo o crescimento do instituto. Fazer física teórica custa pouco. Os gastos são essencialmente com as pessoas. No longo prazo esse tipo de investimento é garantido, pois um grande avanço em física teórica pode mudar tudo. Alguns colegas no Perimeter trabalham em computação quântica, elaborando formas de corrigir erros em cálculos realizados por meio de partículas subatômicas. É uma tarefa desafiadora, mas, quando funcionar, será a base para a indústria de computação do século XXI.

Os estudantes discutem em grupo problemas propostos no Perimeter

perimeterOs estudantes discutem em grupo problemas propostos no Perimeterperimeter

Como o Perimeter cresceu?
Em 2001, o instituto contratou os dois primeiros professores. Em 2008, quando assumi a direção, eram sete. Agora são 23 em tempo integral, mais 13 compartilhados com outras instituições. É assim que tem de ser, contratar lentamente, sem pressa, um ou dois por ano, convidando apenas pessoas excepcionais. Quando alcança uma massa crítica de 10 docentes fantásticos, começa a atrair os estudantes mais brilhantes e a qualidade se multiplica. Se você quer criar um centro de excelência espetacular, siga o exemplo das empresas startup. Precisamos de empreendedorismo aplicado à ciência fundamental, seguir assuntos de pesquisa não convencionais e desenvolver direções completamente novas. Os verdadeiros progressos em ciência acontecem por causa de ideias audaciosas. Noventa e nove por cento delas se mostrarão erradas, mas ocasionalmente uma dessas ideias criativas vai acertar e transformar tudo. A mecânica quântica, por exemplo, é uma ideia maluca. Sem ela, a física não teria progredido.

Como você administra o instituto para criar um ambiente não convencional?
Quando assumi a direção, em 2008, não havia nenhum programa de pós-graduação no instituto. Criei um programa de mestrado diferente, porque já tinha visto todas as coisas que Princeton, Cambridge e outros lugares excelentes fazem errado. Fizemos pesquisas de marketing e estratégias, como fazem as grandes empresas, para recrutar os estudantes mais brilhantes, animados e empreendedores do mundo. E os recrutamos de países diferentes, com culturas diferentes, garantindo uma boa proporção de mulheres. Em seguida, damos a eles um apoio muito especial. No Perimeter os estudantes têm três refeições diárias excelentes, um ginásio de esportes, concertos de música maravilhosos, um ambiente muito animado. Quando chegam, eles sentem que têm de fazer o melhor, porque sentem que é um lugar de alto nível. O prédio dos dormitórios tem uma sala em comum, com quadros-negros, na qual discutem ideias o tempo todo. A cada manhã assistem a aulas e à tarde trabalham em problemas em grupo. Seus tutores realmente cuidam deles, todos os dias, observando, ajudando e desafiando-os com novos problemas. Eles se sentem parte de todo o ambiente de pesquisa e interagem com os professores o tempo todo. Hoje, 68% de nossos convites são aceitos pelos estudantes. É uma das maiores porcentagens do mundo. Isso não acontece porque somos professores mais brilhantes que os outros. É porque todas as outras instituições têm programas muito tradicionais, que não mudam, não se modernizam.

E como atraem os pesquisadores?
Em 2010 criamos o programa Distinguished Visiting Research Chair (cátedra de pesquisador visitante distinto). Em física, quem é convidado a visitar uma instituição apresenta um seminário, mas só recebe reembolso pelas despesas, não ganha nenhum honorário. Fizemos diferente. Dissemos aos mais experientes físicos teóricos do mundo: “Por favor, venham, fiquem conosco por três ou quatro semanas por ano que vamos lhes pagar por semana”. É uma fração do salário deles, mas eles se sentiram respeitados, especialmente depois de Stephen Hawking ter sido o primeiro a aceitar nossa oferta e receber o título de catedrático visitante. Agora temos 52 dos mais importantes físicos do mundo passando pelo Perimeter todo o ano. Não custa muito trazê-los por quatro semanas. Eles vêm, discutem com os estudantes e dão aulas, a maioria deles simplesmente ama dar aulas o dia inteiro. E voltam.

Você mantém a excelência fazendo com que as melhores pessoas do mundo passem por sua instituição.
Exato, você precisa renovar o tempo todo. Ninguém pode ser complacente. Esse é um dos meus desafios. Digo ao nosso corpo docente que o maior perigo para o instituto é nos acomodarmos. Não podemos relaxar. Cada um de nós precisa manter os outros acordados, criticar os colegas. Somos avaliados todo ano. Cada um de nós entrevista seus colegas: sua pesquisa é ambiciosa o suficiente? Está realmente avançando nos limites de sua área de pesquisa? Talvez você devesse largar essa abordagem porque o resultado é muito previsível. Vá e arrisque. Achamos que pode fazer melhor. Se alguém o critica, você não toma isso como um insulto. Outra maneira de manter todo mundo desperto é um de meus slogans no Perimeter: Aqui não há grupos.

Como assim?
Quando cheguei ao Perimeter todo mundo se via em grupos de pesquisa. “Somos o grupo de gravitação quântica”, diziam. “Não há grupos”, disse a eles, “aqui estamos todos no mesmo barco”. Não é um professor que escolhe os estagiários de pós-doutorado. O instituto, coletivamente, recruta-os, sob o entendimento de que eles não estão trabalhando para ninguém. São pesquisadores independentes, livres para fazer o que quiserem, podem trabalhar com o corpo docente, mas nunca serão usados para fazer o trabalho deles. Os próprios pós-doutorandos podem convidar visitantes ou viajar para onde quiserem. Os pós-docs e os professores seniores são tratados de maneira muito similar. E funciona, porque quando damos todo esse apoio e liberdade eles entendem que nossas expectativas são altas, que esperamos que façam algo realmente interessante. A evidência disso é que quatro de nossos pós-docs já ganharam o prêmio New Horizons [prêmio de US$ 100 mil para jovens pesquisadores promissores, instituído em 2013 pela fundação Breakthrough Prize, dos Estados Unidos]. Além do Perimeter e da Universidade Stanford, nenhuma outra instituição ganhou esse prêmio mais de uma vez. O diretor da Breakthrough me ligou semana passada perguntando como conseguimos isso. A resposta é que estamos em busca de jovens incomuns, fazendo algo brilhante, mas que ainda não é totalmente reconhecido. Nove de cada 10 jovens fazem coisas incríveis. Enquanto isso as grandes universidades perseguem os pós-docs populares, requisitados em conferências e que publicam muitos artigos por ano. E dessa maneira elas não encorajam de fato os jovens a realizarem trabalhos originais. Somos o oposto, porque sabemos que são as pessoas que arriscam mais que realizam os grandes avanços e ganham os grandes prêmios.

024-029_Entrev_Turok_4perimeterO que você faz em cosmologia?
Tento compreender a origem do Universo. Agora temos observações a partir das quais podemos testar teorias com precisão. O futuro do Universo parece que será extremamente simples, dominado pela energia escura.

Quais foram suas principais contribuições?
Fiz previsões que foram confirmadas por observações. Em particular, a correlação entre a polarização [propriedade da radiação eletromagnética oscilar em direções preferenciais] e a temperatura da radiação cósmica de fundo. Previ também uma evidência independente [da evidência principal da energia escura, que é o afastamento acelerado das galáxias distantes], recentemente confirmada por observações [o chamado efeito Sachs-Wolfe integrado, segundo o qual pequenas variações nas frequências da radiação cósmica de fundo estão relacionadas à distribuição dos aglomerados de galáxias e são influenciadas pela energia escura]. Estou entre os primeiros que investigaram a ideia de que relíquias da época da grande unificação [período em que as forças fundamentais da física eram como uma só, logo após o Big Bang] poderiam ter sobrevivido até hoje. Propus vários cenários teóricos para explicar o Big Bang. Um deles é a idea de que podemos estar vivendo em uma bolha em um universo inflacionado. Outro, a ideia de que o Big Bang foi o resultado de uma colisão entre dois universos. O terceiro é o cenário do universo cíclico, que morre e se refaz continuamente.

Como você vê o futuro da cosmologia?
Com muito entusiasmo. As observações nos ensinaram mais nos últimos quatro anos do que nas últimas três décadas. As teorias do século XX estão fracassando em toda parte. A natureza é mais simples e mais unificada do que jamais acreditamos.

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