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Ambiente

Controle da paisagem

Softwares ajudam a monitorar a saúde das árvores das cidades

Podcast: Sérgio Brazolin

 
     
Árvores reduzem a poluição atmosférica e sonora, diminuem a temperatura em seu entorno, minimizam danos ao alterar a velocidade e a direção dos ventos, além de deixar as cidades mais bonitas. Se não forem bem cuidadas, podem cair, causando ferimentos e mortes, interrompendo vias e o fornecimento de eletricidade. Como exemplo, entre janeiro e maio deste ano, na cidade de São Paulo, caíram 2.192 árvores, o que dá uma média de 14,5 por dia. Para que os benefícios da floresta urbana superem as desvantagens, é preciso que ela seja bem cuidada. É o que pretendem três softwares desenvolvidos no Brasil para programar podas e cortes, saber qual a idade da árvore e até indicar se uma espécie pode ser plantada em determinado lugar.

O que está em estágio mais adiantado é o Arbio, criado no Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo (IPT) para gerenciar principalmente as árvores localizadas no sistema viário e em praças. “O programa permite fazer inventários, ao cadastrar as plantas de uma localidade, e o planejamento da arborização, ao definir os locais e as espécies mais adequadas para o plantio”, conta o biólogo Sérgio Brazolin, chefe do Laboratório de Árvores, Madeiras e Móveis do IPT, coordenador da equipe que desenvolveu o software.

Ele explica que o Arbio tem capacidade para conter as informações individualizadas de cada árvore, como localização, identificação botânica (nome científico e popular), condições de entorno, abrangendo as vias de tráfego, tipo de imóvel associado, condições da calçada, canteiro, interferências dos fios de eletricidade e telefonia na copa, situação do tronco e das raízes, dendrometria (medição da massa lenhosa) e existência de doenças ou infestação de cupins.

Em Belo Horizonte, a empresa Digicade criou, em parceria com o Google, o sistema Geosite, que também facilita o monitoramento de árvores urbanas. “Trata-se de um sistema integrado a informações geográficas, que torna mais eficiente a gestão, em uma só ferramenta, de operações de inspeção, poda e manejo de árvores em cidades”, afirma João Carlos Tavares da Silva, coordenador de Desenvolvimento da empresa.

A empresa CAA Tecnologia da Informação, de Botucatu (SP), está finalizando um software semelhante ao Arbio e ao Geosite, em termos de funcionalidades e objetivos. “O programa poderá ser usado no planejamento e na gestão das árvores, além de promover a interatividade com a população”, afirma o coordenador do projeto na empresa, o engenheiro florestal Guilherme Corrêa Sereghetti. Os três programas têm entre seus potenciais usuários prefeituras, universidades, concessionárias de energia, consultorias ambientais e condomínios e organizações não governamentais.

A coleta dos dados para alimentar os softwares pode ser realizada por técnicos treinados. A responsabilidade pela análise ou tomada de decisão de manejo, no entanto, cabe a biólogos, engenheiros florestais ou agrônomos. “O sistema móvel [software em smartphone] facilita a inspeção da árvore pelo técnico e o armazenamento das informações coletadas”, explica Brazolin.

Um diferencial do Arbio, segundo Brazolin, é a capacidade de analisar o risco de queda de uma árvore. “O software tem um modelo de cálculo probabilístico, elaborado pelo IPT”, explica. “O programa é alimentado com uma série de informações, como tamanho da planta e da sua copa, diâmetro do tronco e estado de deterioração, como apodrecimento ou cavidades no tronco. Utilizando conceitos de biomecânica, o software faz cálculos matemáticos que determinam a probabilidade de queda para 12 diferentes velocidades de vento e gera um gráfico com os resultados.” Para chegar a ele é preciso medir a altura total da árvore utilizando um aparelho chamado de hipsômetro e a largura da copa pode ser obtida pela medida projetada no chão com fita métrica. Com isso, o Arbio calcula a área estimada da copa para os cálculos no modelo estrutural de risco de queda.

Os softwares também podem ser alimentados com dados fenológicos das plantas, como época da queda das folhas, da floração e da frutificação, além de informações sobre pragas ou doenças. “Nosso programa possibilitará a participação da população, que poderá solicitar poda ou corte de uma árvore ou a inclusão de um exemplar ainda não cadastrado, inclusive com envio de foto pelo celular”, conta Sereghetti, da CAA.

Plano diretor
Os três programas estão em fases diferentes de desenvolvimento, nenhum ainda em uso comercial. O Arbio começou a ser criado em 2013 e já está pronto para uso. A primeira cidade a implantá-lo nos próximos meses será Mauá (SP), na Região Metropolitana de São Paulo, cidade com 457 mil moradores. “O desenvolvimento desse software resultou de um projeto de capacitação financiado pelo governo do estado de São Paulo para aprimorar a gestão da arborização”, explica Brazolin. “O IPT está estudando disponibilizá-lo gratuitamente para os municípios do estado de São Paulo.”

Em Mauá, o Arbio integrará o Plano Diretor de Arborização Urbana, com recursos de R$ 2 milhões do Fundo de Interesses Difusos da Secretaria de Estado da Justiça e Defesa da Cidadania. O objetivo é manter atualizada a base de dados sobre as árvores da cidade e fazer os plantios adequados, além de executar podas corretas, evitando que as plantas fiquem deformadas. Para operar o Arbio, a prefeitura conta com um biólogo, dois engenheiros florestais e um engenheiro-agrônomo. Ainda deverão ser contratados mais um biólogo e um engenheiro-agrônomo, além de outros profissionais como fiscais e técnicos ambientais.

Na cidade de São Paulo, a Secretaria Municipal do Verde e do Meio Ambiente utiliza um antigo sistema desenvolvido pelo IPT em 2004, o Sistema de Gerenciamento de Árvores Urbanas (Sisgau). Segundo a secretaria, existem cerca de 652 mil árvores na capital paulista, que são monitoradas com informações passadas por engenheiros-agrônomos das prefeituras regionais. Ele é utilizado para cadastrar informações geográficas, fitossanitárias e intervenções de manejo realizados ao longo da vida de cada árvore. Brazolin, do IPT, que participou da produção desse sistema, afirma que o Sisgau não tem funcionalidades presentes no Arbio como a de tentar prever ou gerenciar queda de árvore.

O Geosite, por sua vez, foi lançado em novembro do ano passado. “No momento ele está sendo testado, por meio de prova de conceito, em algumas prefeituras e por uma companhia de energia elétrica”, conta Silva. O programa da CAA começou a ser desenvolvido em novembro de 2016 e o primeiro protótipo está sendo finalizado. Os dois sistemas serão comercializados em breve, mas os preços ainda não estão definidos.

Sistemas no exterior
No exterior, já existem sistemas semelhantes em uso. Um exemplo é o Arbomapweb, criado na Espanha pela empresa Tecnigral, utilizado em cidades como Madri e Córdoba. Ele integra ações georreferenciadas de inventário, gestão e incidentes, fazendo planejamento, geração e acompanhamento da floresta urbana. Nos Estados Unidos surgiu o OpenTreeMap, um sistema de acesso via internet com o qual é possível criar projetos de arborização urbana, pagando US$ 164 ao mês. Ele foi desenvolvido por um pool de empresas, com recursos do fundo de apoio para pesquisa e inovação do Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (Usda). Além do inventário e fotos de árvores de uma localidade, o software calcula os benefícios da floresta urbana para a cidade como a quantidade de redução de dióxido de carbono (CO2), um dos gases do efeito estufa, nível da qualidade do ar e filtragem da água da chuva para o solo. É usado em vários países, além dos Estados Unidos, como Reino Unido, México e Portugal.

De acordo com o biólogo Marcos Buckeridge, do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP), que estuda a arborização em cidades, o sistema de monitoramento da floresta urbana usado em Nova York, chamado de New York City Street Tree Map, é um dos mais avançados do mundo. “Eles têm um bom mapeamento árvore por árvore e possuem um mecanismo de produzir um cálculo dos benefícios para a cidade”, comenta. O software estima o valor financeiro que cada planta dá de retorno à sociedade por meio de indicadores como, por exemplo, interceptação de água das chuvas, remoção de poluentes do ar e redução de CO2 e outros poluentes.

Para Buckeridge, seria um bom início passar a incluir um planejamento de arborização de forma mais séria e científica em planos futuros de uma cidade como São Paulo. Ele lembra que as cidades sempre terão características artificiais. “Mas elas podem pelo menos tentar ser mais integradas à biosfera do que são hoje”, analisa.

Projeto
Sistema RIA (Rich Internet Application) para planejamento e gestão de arborização urbana (nº 14/50612-5); Modalidade Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresa (Pipe); Pesquisador responsável Guilherme Corrêa Sereghetti (CAA Tecnologia da Informação); Investimento R$ 119.187,40.

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