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Carta da editora | 275

Das redes neurais à inteligência artificial

No começo dos anos 1990, pesquisadores paulistas submeteram à FAPESP projetos de pesquisa da então pouco conhecida área de redes neurais artificiais, a simulação via computador do funcionamento do sistema nervoso central. Seu objetivo é reconhecer padrões que permitiriam que a máquina “aprenda”.

A inteligência artificial (IA) nasceu nos anos 1940, mas, como pode acontecer na ciência, estava à frente do seu tempo. Precisou do avanço da capacidade dos computadores para dar conta da imensa quantidade de dados a processar. Para contornar o empecilho, desenvolveu-se a vertente baseada em linguagem de programação, que cria regras para resolver um determinado problema.

Hoje, o conhecimento produzido por esse tipo de estudo é ubíquo, presente em soluções oferecidas por softwares para fugir do trânsito, recomendações do serviço de streaming de vídeos ou na leitura biométrica para saque no caixa automático, entre inúmeros exemplos. Não mais restrita à academia, onde segue como uma atraente área de pesquisa, inclusive por seu caráter multidisciplinar, a IA hoje domina projetos de empresas que resultam em novos produtos e processos industriais, recebendo financiamentos como do programa Pipe, da FAPESP, desde 1997.

Foi com a ajuda de um projeto Pite, outro programa de fomento à inovação da Fundação, em parceria com o SUS, que o Instituto Butantan se destacou no desenvolvimento de uma vacina contra dengue, doença que acomete 390 milhões de pessoas por ano no mundo, segundo estimativa da OMS. Há uma vacina no mercado desde 2015, produzida pela francesa Sanofi Pasteur, mas é recomendada apenas para quem contraiu a dengue anteriormente, apresenta efeitos adversos, além de baixa taxa de eficácia.

Há alguns anos, o Butantan e outros institutos de pesquisa e empresas começaram a desenvolver vacinas contra dengue usando material cedido pelos NIH, os institutos nacionais de saúde dos Estados Unidos. O projeto brasileiro avançou mais rapidamente, chamando a atenção da multinacional norte-americana MSD, uma das concorrentes. Hoje, na fase três dos testes clínicos, a última, tem apresentado resultados muito promissores, levando a MSD a propor uma parceria com a instituição paulista.

Um aporte de US$ 26 milhões no Butantan permitirá à norte-americana alcançar o estágio de desenvolvimento da vacina brasileira; se o produto for ao mercado e vender bem, o repasse poderá alcançar mais US$ 75 milhões ao longo de 24 meses. A multinacional deterá os direitos de comercialização no exterior.

Até o momento, foram investidos no projeto R$ 224 milhões, oriundos de fontes como o BNDES e o Ministério da Saúde, além da FAPESP. Se bem-sucedido, significará o reconhecimento internacional em pesquisa e desenvolvimento do instituto, que já produz 100 milhões de doses de vacina anualmente, de nove tipos diferentes.

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Tradicional forma literária publicada em folhetos desde o final do século XIX, o cordel foi reconhecido como Patrimônio Cultural Imaterial Brasileiro pelo Iphan. Eclética, essa forma de poesia não se esquiva de nenhum assunto – inclusive ciência. Fica aqui um simpático exemplo. Na obra Trigésimo aniversário da conquista da lua, declama o cordelista Gonçalo Ferreira da Silva: “Busca o homem conhecer/ A origem e dimensão/ Do universo e se está/ Em permanente expansão/ Pois conhecer nossa casa/ É a nossa obrigação”.

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