A descoberta de uma nova espécie de golfinho pré-histórico na região da Patagônia argentina indica que as espécies que habitavam a região há cerca de 25 milhões de anos podem ser mais diversas do que se imaginava. A conclusão é de um grupo de pesquisadores brasileiros e argentinos, a partir da análise de pequenos pedaços do crânio e dos ossos do ouvido de uma antiga espécie de golfinho encontrados pelo paleontólogo argentino Mario Cozzuol, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), na província de Chubut, 1.300 quilômetros ao sul de Buenos Aires.
A descrição dos fósseis foi publicada em fins de março na revista Acta Palaeontologica Polonica. Com base em análises morfológicas e filogenéticas, os pesquisadores constataram que eles pertenciam a uma espécie até então desconhecida, batizada de Aondelphis talen, que significa pequeno golfinho do Sul. Até então, haviam sido encontrados registros fósseis de apenas uma espécie de golfinho primitivo naquela região, Notocetus vandenedeni, descrita pela primeira vez no século XIX pelo naturalista argentino Francisco Pascasio Moreno (1852-1919), fundador do Museu de História Natural de La Plata.
“Aondelphis talen é a primeira espécie de golfinho primitivo da Patagônia descrita em quase um século”, destaca Cozzuol, que encontrou os remanescentes fósseis agora estudados quando ainda morava na Argentina, há cerca de 20 anos. Como os ossos estavam bastante fragmentados, ele diz ter relutado em avaliá-los ou descrevê-los. Duas décadas depois, trabalhando em colaboração com pesquisadores do Instituto Patagônico de Geologia e Paleontologia do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas da Argentina e do Departamento de Biologia da Faculdade de Ciências da Universidade do Chile, ele retomou as análises. “Juntamos todos os pedaços e os analisamos ao longo de um ano”, comenta.
A nova espécie de golfinho é o representante mais primitivo de um grupo já extinto, segundo os pesquisadores. O animal teria habitado a região há cerca de 25 milhões de anos, no início do período geológico conhecido como Mioceno inferior. Teria em torno de 2 metros de comprimento e pouco mais de 120 quilogramas.
Apesar de seus fósseis terem sido encontrados no vale do rio Chubut, Aondelphis talen por muito tempo viveu nos mares. Cozzuol explica que o oceano à época cobria todo o sul da Patagônia argentina. Com o movimento da placa de Nazca, que teria se movido em direção à placa sul-americana, dando forma às montanhas que hoje compõem a cordilheira dos Andes, o mar que cobria parte da Patagônia teria se retraído. Devido à expansão dos golfinhos da família Delphinidae, tanto Aondelphis talen como Notocetus vandenedeni perderam território, tendo de se adaptar aos ambientes fluviais.
Os achados apresentados no estudo na Acta Palaeontologica Polonica são importantes, segundo os pesquisadores, porque sugerem a coexistência de pelo menos duas espécies de golfinhos ancestrais (Aondelphis talen e Notocetus vandenedeni) que teriam vivido naquela região na mesma época.
Artigo científico
VIGLINO, M. et al. A new dolphin from the early Miocene of Patagonia, Argentina: insights into the evolution of Platanistoidea in the Southern Hemisphere. Acta Palaeontologica Polonica. v. 63, n. 2, p. 261-77. mar. 2018.