No dia 6 de outubro de 1995, o mundo soube que havia mundos em que o Sol não era o astro-rei. Num congresso em Florença, os astrônomos suíços Michel Mayor e Didier Queloz, do Observatório de Genebra, anunciaram a descoberta do primeiro planeta fora do sistema solar em torno de uma estrela semelhante ao Sol, vencendo uma silenciosa disputa com colegas norte-americanos. “Todos podem agora olhar para o céu à noite, ver as estrelas e dizer: ‘Há planetas lá fora'”, afirmou Mayor.
Não havia imagens do companheiro celeste que circulava a estrela Pégaso 51, distante cerca de 40 anos-luz (9,5 trilhões de quilômetros é o equivalente métrico a um ano-luz). Havia, sim, evidências indiretas da presença de um objeto cujo campo gravitacional provocava uma sutil e periódica alteração no movimento da estrela com nome do cavalo alado e que, a cada 4,2 dias, dava uma volta completa em seu sol.
Ali havia um planeta. Em muitos aspectos, mas não em todos, o novo mundo lembrava o maior planeta solar, Júpiter, cuja massa é 318 vezes maior que a da Terra. Sem superfície sólida, desprovido de água, era gasoso e gigante, com cerca de metade do peso jupiteriano. Porém, ao contrário de Júpiter, que está muito longe do Sol, estava quase colado à sua estrela. Para usar o jargão dos astrofísicos, era um Júpiter quente, com temperaturas em sua superfície da ordem de 1.000ºC (o Júpiter original é gélido). Enfim, o companheiro da estrela Pégaso 51 era um lugar proibitivo para qualquer forma de vida.
Nos últimos nove anos, com pequenas variações, todo planeta descoberto ao redor de estrelas parecidas com o Sol – e foram cerca de 130 – era uma variação sobre o mesmo tema. Uma cópia, mais ou menos fiel, do primeiro mundo desvendado pela dupla helvética: uma bola gigante de gás, dezenas ou centenas de vezes maior do que a Terra. Um mundo tipo Júpiter, quente ou não, de acordo com a distância que o separava de seu sol.
No final de agosto, a monotonia de só encontrar pesos-pesados em torno das estrelas finalmente chegou ao fim: três mundos menores, distantes entre 40 e 50 anos-luz, foram localizados com o auxílio de telescópios baseados na Terra. Começou a era dos pesos-médios. Novamente capitaneados por Mayor e Queloz, os europeus foram os primeiros a dar a boa nova. No dia 25 daquele mês anunciaram a localização de um planeta com 14 vezes a massa da Terra – de massa, portanto, similar ao de Urano – nos arredores de uma estrela semelhante ao Sol, a Mu Arae, localizada na constelação de Altar. Com o senso de marketing típico dos cientistas norte-americanos, e talvez algum exagero, os astrônomos do Velho Mundo disseram que o companheiro da Mu Arae poderia ser uma Super-Terra, termo que caiu no gosto da imprensa. Para ser uma Terra, o planeta teria de ser um peso-leve, menor ainda.
Mesmo assim, o peso-médio nos calcanhares da Mu Arae agradou à platéia e jogou os oponentes dos suíços contra as cordas. Menos de uma semana mais tarde, no dia 31 de agosto, duas equipes independentes de pesquisadores dos Estados Unidos contragolpearam: apresentaram dois planetas de porte semelhante ao recém-descoberto pelos colegas (e rivais) do outro lado do Atlântico. Pela grandeza de suas massas, os mundos foram comparados a Netuno, que é 17 vezes mais pesado do que a Terra. O grupo chefiado por Barbara McArthur, da Universidade do Texas, localizou um corpo celeste com 18 vezes a massa da Terra em órbita de Cancri 55, estrela parecida com o Sol e pertencente à constelação de Câncer.
Três mundos gigantes e gasosos já haviam sido detectados ao redor de Cancri 55 e a chegada de um quarto irmão, menor, fez da estrela a detentora do maior sistema planetário extra-solar conhecido. O time liderado por Geoffrey Marcy e Paul Butler – astrofísicos, respectivamente, da Universidade da Califórnia em Berkeley e do Instituto Carnegie de Washington – encontrou um planeta com massa 21 vezes maior do que a da Terra em torno de uma pequena e fria estrela da constelação de Leão, a Gliese 436. “Esses mundos do tamanho de Netuno provam que lá fora não há apenas planetas gasosos gigantes”, comenta Marcy, principal concorrente dos europeus na caça por outras Terras. “Começamos a observar planetas cada vez menores.”
Além do talhe semelhante, os três planetas têm outro dado em comum: estão muito próximos de suas estrelas, mais do que Mercúrio, o primeiro mundo de nosso sistema, está do Sol. Seu período orbital, o tempo necessário para dar uma volta em torno de sua estrela, é menor do que dez dias, um indicativo de que devem ser planetas muito quentes. A Terra, como se sabe, demora 365 dias, um ano, para completar uma órbita ao redor do Sol.
Mercúrio, 88 dias. Por que a localização de uma Super-Terra e dois Netunos anima tanto os astrofísicos? Não foi só uma questão de massa e tamanho, mas também da possível constituição física dos astros recém-descobertos. Eles acreditam que essa trinca de novos planetas sejam os primeiros a ostentar uma característica ainda mais importante: podem ser sólidos, totalmente ou ao menos parcialmente sólidos.
“O planeta em órbita da estrela Mu Arae representa a primeira descoberta de um mundo rochoso mais parecido com a Terra”, diz o astrônomo português Nuno Santos, do Observatório de Lisboa, que faz parte da equipe européia. “Até agora não sabíamos se os planetas rochosos eram ou não freqüentes. Agora sabemos que devem ser. Demos o primeiro passo para encontrar uma verdadeira Terra.” Santos é o grande responsável pelo achado europeu e assina em primeiro lugar, na frente de seus colegas mais famosos, o artigo científico sobre a Super-Terra.
Os planetas descobertos pelos norte-americanos também podem ser fundamentalmente rochosos, ou, no caso do mundo em torno da fria estrela Gliese 436, talvez uma mistura de pedra e gelo. Não se pode, contudo, descartar por completo a hipótese de que os três novos planetas ainda sejam majoritariamente gasosos. Como seus primos maiores, os Júpiteres extra-solares. De qualquer forma, os pesquisadores estão otimistas quanto às perspectivas de localizar em breve um planeta como o nosso e, quem sabe, sinais de vida complexa.
“Essas descobertas mostram que estamos no caminho de encontrar a primeira Terra extra-solar”, afirma Barbara McArthur. “Se a tecnologia continuar progredindo, quem sabe possamos atingir tal objetivo em poucos anos.” Em nosso sistema, Mercúrio, Vênus, Terra e Marte – osquatro primeiros planetas – são rochosos. Os mundos mais afastados do Sol – Júpiter, Saturno, Urano e Netuno – são essencialmente gasosos, sem superfície sólida, com rochas apenas em seu núcleo. Mais longínquo dos planetas solares, o pequeno e denso Plutão é um caso à parte em termos de sua composição. Como um cometa, é feito essencialmente de gelo.
Quase todos os 130 planetas extra-solares conhecidos, inclusive os três de massa mediada, foram descobertos da mesma maneira: pelo emprego da técnica de velocidade radial, que mede o efeito exercido pelo campo gravitacional de um ou mais planetas sobre a movimentação de seu sol. É uma forma indireta de produzir evidências de que há um objeto celeste em órbita de uma estrela. A lógica por trás de tal procedimento é de fácil compreensão. A presença de um planeta, ou qualquer outro objeto celeste, produz periodicamente uma ínfima variação na velocidade de deslocamento da estrela. Em outras palavras, na posição de seu sol.
É como se a companhia do planeta fizesse a estrela dançar, indo, de tempos em tempos, para a frente e para trás. Quanto maior for a massa de um planeta, e mais perto ele estiver de seu sol, maior será o passo do balé espacial executado pela estrela. Medindo essa perturbação num sol, os astrofísicos podem inferir a massa mínima (mas não a máxima) e a órbita do planeta que o circunda. Objetos com massas jupiterianas provocam alterações na velocidade radial de seu sol da ordem de dezenas ou centenas de metros por segundo. Mundos do tipo Netuno fazem a sua estrela dançar alguns metros. “A perturbação da Terra sobre a velocidade radial do Sol é da ordem de 13 centímetros por segundo”, afirma Sylvio Ferraz-Mello, coordenador do grupo de dinâmica de sistemas planetários do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo (IAG-USP). Um nada.
As alterações na velocidade radial são calculadas a partir de dados obtidos por um equipamento chamado espectrógrafo (ou espectrômetro), que, como o nome indica, espalha a luz da estrela nas freqüências e comprimento de ondas que a constituem. Dessa forma, empregando os conceitos do chamado efeito Doppler, os astrofísicos têm uma idéia da influência causada na órbita de uma estrela pela presença de um planeta nas redondezas. Quando a estrela dança para perto de seu observador, a luz medida se torna mais azul.
Se ocorre o inverso, predominam os tons vermelhos. O sucesso do emprego do método da velocidade radial para encontrar planetas depende do acesso a um espectrógrafo de última geração. A equipe européia, por exemplo, encontrou evidências de sua Super-Terra com auxílio do Harps, um espectrógrafo capaz de medir variações na velocidade radial de objetos celestes da ordem de 1 metro por segundo. Tido como o mais poderoso instrumento de seu tipo, o Harps foi instalado no final do ano passado num telescópio de 3,6 metros do ESO (European Southern Observatory), em La Silla, no norte do Chile.
As equipes norte-americanas acharam seus Netunos também com a ajuda de potentes espectrógrafos.Hoje ainda não há meio capaz de detectar mundos como a Terra ao redor de outras estrelas. A técnica da velocidade radial favorece a descoberta de planetas com grandes massas e/ou que estejam bem próximos a seus sóis. Mas a limitação deve ser superada em breve.
A disseminação do método do trânsito planetário, forma alternativa de encontrar mundos que não apresenta o mesmo viés da velocidade radial, é uma das apostas para os próximos anos. A abordagem consiste em monitorar o brilho de uma estrela, a partir de um ponto fixo de observação, em busca de diminuições periódicas em sua intensidade. Essa redução, uma pequena zona de sombra, pode ser causada pela passagem de um objeto celeste de certo porte – talvez um planeta – entre a estrela e o observador.
A passagem é o trânsito, que, em termos práticos, provoca um microeclipse na estrela, detectável apenas por meio de telescópios sensíveis. “O método do trânsito é especialmente poderoso se usado em conjunto com a técnica da velocidade radial”, afirma o espanhol Roi Alonso, do Instituto de Astrofísica de Canárias. “Com ele, podemos estimar com maior precisão a massa de um planeta e ter, pela primeira vez, uma noção do seu tamanho e, por conseqüência, de sua densidade.” Em agosto passado, trabalhando com as duas técnicas e dados de uma pequena rede de satélites, Alonso descobriu um planeta gigante, do tipo Júpiter.
O astrofísico brasileiro Claudio Melo, que trabalha com os europeus no observatório ESO, no Chile, também participou recentemente da detecção de um novo mundo por essa dupla abordagem. Ajudou a localizar um Júpiter quente quase colado à estrela Ogle-TR-111. Apesar da descoberta, Melo diz que não foi fácil chegar ao resultado. Observaram 4 mil estrelas numa região do espaço, encontraram 40 estrelas com diminuições de brilho suspeitas e conseguiram confirmar, com o emprego da velocidade radial, apenas um planeta.
“O método do trânsito se presta mais para fornecer candidatos a planetas, que, num segundo momento, têm de ser ratificados ou não por outras técnicas”, pondera Melo. Há quase um consenso na comunidade científica de que o método do trânsito encontrará em breve planetas bem menores do que os atuais Júpiteres ou Netunos extra-solares: os primeiros candidatos a serem uma Terra. Projetos nesse sentido estão em curso e vão ganhar o espaço na segunda metade desta década.
Mais uma vez, os europeus estão na frente dos norte-americanos. Em junho de 2006 será lançado um pequeno satélite francês, de 670 quilos, o Corot, que, durante três anos, permanecerá em órbita polar e circular em torno da Terra. Sua missão será procurar, usando o método do trânsito, planetas em torno de milhares de estrelas próximas e estudar abalos sísmicos numa dezena de outras. Era para ser um projeto apenas do CNES (a agência espacial francesa), mas faltaram verbas e a empreitada foi aberta para outros países.
Áustria, Espanha, Alemanha, Bélgica e a ESA (a agência espacial européia) tornaram-se sócios do projeto. O Brasil também encontrou espaço na missão Corot e se tornou parceiro da iniciativa. A estação terrestre do hemisfério Sul que receberá dados do satélite fica em Natal (a do hemisfério Norte se situa na Espanha). Sua montagem está a cargo do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). “Sem a estação brasileira, o Corot conseguiria observar e enviar dados de 40 mil estrelas”, afirma Eduardo Janot Pacheco, do IAG-USP, coordenador da participação brasileira na missão. “Com a nossa estação, esse número aumentará para 60 mil.” Em razão da parceria, o país já enviou à França engenheiros de software para trabalhar em programas do satélite e terá a chance de participar de estudos científicos que talvez levem à descoberta do primeiro planeta do tamanho da Terra.
A Nasa entrará diretamente na corrida por uma Terra extra-solar no final de 2007, com o lançamento do satélite Kepler, que usará também o método do trânsito para caçar seus mundos. Sabe-se que planetas rochosos, de tamanho semelhante ao da Terra, existem. Até já se encontraram alguns. Só que em torno de um tipo de astro inóspito para fomentar a vida: pulsares, também chamados estrelas de nêutrons. Pulsares são estrelas densas, de alta rotação, que emitem pulsos de radiação. São estrelas mortas.
Em 1991, quatro anos antes do anúncio bombástico de Mayor e Queloz sobre a observação de um planeta em torno de uma estrela similar ao Sol, Alexander Wolszczan, da Universidade Estadual da Pensilvânia, descobriu três planetas – dois com massa similar à da Terra e um terceiro com o peso da Lua – ao redor de um pulsar localizado na constelação de Virgem, o PSR B1257+12. Esses foram, a rigor, os primeiros planetas encontrados em outra estrela que não o Sol. O achado é quase ignorado porque, como os astrofísicos sabem, a vizinhança de pulsares não é apta a suportar mundos com vida. No fundo, o grande interesse é por estrelas como o Sol, de brilho médio, que, segundo projeções, talvez possam abrigar milhares ou milhões de planetas de clima ameno como a Terra.
Historicamente, o homem enfrenta dificuldades para encontrar planetas. A começar pela própria natureza desse objeto celeste, que não favorece a sua localização no espaço. Com exceção de um breve período em sua juventude, planetas não emitem luz própria, característica que dificulta a sua visualização direta. Logicamente, um planeta pode ser iluminado pela luz de estrelas próximas, como acontece com alguns mundos do sistema solar, às vezes visíveis até a olho nu. Mas, como regra geral, os planetas extra-solares são ofuscados pelo brilho das estrelas.
Tornam-se objetos ocultos até para os mais avançados telescópios ópticos. Por ora, são mundos longínquos e sem face. A única cara que exibem é a que os desenhistas lhes emprestam nas “representações artísticas” destinadas a divulgar uma descoberta para o grande público. Ainda assim, os cientistas não desistem de tentar flagrar de forma direta os mundos descobertos nos últimos nove anos.
No mês passado, por exemplo, pesquisadores do observatório ESO divulgaram o que pode ser a primeira imagem de um planeta extra-solar o ponto menor, em vermelho, seria um planeta com cinco vezes a massa de Júpiter. A seu lado está uma estrela da constelação de Hidra, a 2M1207, a esfera maior e de brilho mais claro. Esse tipo anúncio, nem de longe o primeiro do gênero, ainda é visto com ceticismo pela comunidade acadêmica. Os astrofísicos acreditam que só será possível “tirar fotos” confiáveis de planetas extra-solares na próxima década, quando entrarem em operação dispositivos com novas técnicas, como a interferometria, capazes de produzir esse tipo de imagem.
Mesmo os últimos planetas do sistema solar, nossos vizinhos celestes, foram descobertos aos poucos, lentamente. No início do século 17, Galileo Galilei tornou-se o primeiro homem a esquadrinhar o céu por meio das lentes de um telescópio. Com a ajuda desse artefato, o astrônomo e matemático toscano, cuja defesa do heliocentrismo lhe valeria uma condenação no tribunal da Santa Inquisição, fez inúmeras observações inéditas. Mostrou o pouco brilho das estrelas da Via-Láctea, avistou manchas no Sol, divisou crateras na Lua, encontrou luas em Júpiter, distinguiu as fases de Vênus.
Planetas, não achou nenhum. Dessa forma, até o final do século 18, a humanidade contabilizava, fora a Terra, cinco mundos, todos em órbita do Sol e ocasionalmente visíveis a olho nu: Mercúrio, Vênus, Marte, Júpiter e Saturno. Oficialmente, esses planetas não têm descobridores. Seu registro se confunde com a história da civilização. Novos mundos só foram identificados mais de um século depois de Galileo, à medida que os telescópios se tornaram mais potentes. E a um ritmo de um planeta por século. Urano foi descoberto em 1781; Netuno, em 1846; e Plutão, em 1930.
Além de alimentar a esperança de localizar novas Terras em torno de outras estrelas, a descoberta de mais de uma centena de Júpiteres extra-solares, e de certo modo até dos três novíssimos mundos de tamanho médio, desafia a teoria mais aceita sobre o nascimento de planetas, formulada a partir da configuração do sistema solar. Esses novos mundos parecem estar fora do lugar. A maioria situa-se absurdamente próxima de seu sol e exibe órbita elíptica, não-circular.
Tudo diferente dos planetas gasosos e gigantes do sistema solar, que se encontram longe do Sol e apresentam órbitas circulares. A aparente incoerência levou o astrofísico inglês Martin Beer, da Universidade de Leicester, a propor recentemente, num artigo científico, que o sistema solar pode ser um lugar “especial”, não-típico, do Universo. Se essa idéia, polêmica, estiver certa, não haveria outras Terras lá fora. “Pensar que todos os planetas se formam basicamente da mesma maneira pode ser um erro”, especula o britânico. “Pode haver mais de um mecanismo que origine esses objetos.”
De acordo com o modelo mais aceito, planetas se formam a partir de um pequeno núcleo sólido, uma esfera de rocha e/ou gelo, de uns 10 quilômetros de diâmetro, chamada planetesimal. Núcleos rochosos situados a enormes distâncias de sua estrela conseguem, por meio de sua força gravitacional, atrair em torno de si grandes quantidades de gás proveniente dos setores frios de um vasto disco de matéria existente nos arredores de seu sol. Dessa maneira, distantes da estrela, formam-se sempre planetas gigantes e gasosos, como Júpiter e Saturno.
“Quase todo o Universo é composto de hidrogênio e hélio em temperaturas muito baixas”, comenta o astrofísico Gustavo Mello, do Observatório do Valongo, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Já os planetesimais mais próximos de sua estrela, ainda segundo o modelo, são capazes de originar apenas planetas rochosos. Muito quentes, não conseguem atrair, tampouco manter, um envoltório de gás em seu entorno por muito tempo. Resultado: dão origem a corpos menores e mais densos, como Mercúrio, Vênus, Terra e Marte (o longínquo Plutão é um caso à parte). “A formação de um planeta é uma corrida contra o tempo”, diz Gustavo Mello. “O material que o origina, resíduos do processo de nascimento das estrelas, pode se dissipar facilmente.”
Portanto, a teoria dominante não serve aparentemente para explicar a localização de quase todos os mundos extra-solares conhecidos – a menos que esses planetas tenham surgido pelo processo convencional em outro ponto do espaço, mais longe de sua estrela, e migrado para sua posição atual. Ou pode ser que os sistemas extra-solares conhecidos simplesmente não sejam representativos da maior parte dos mundos existentes ao redor de estrelas. Hoje os métodos de detecção favorecem a observação de planetas grandes que estejam perto de seu sol.
Isso pode ter causado uma idéia distorcida do perfil dos mundos presentes “lá fora”. O próprio Beer não descarta essa possibilidade, advogada de forma mais acentuada pelo astrofísico português Nuno Santos, o descobridor da Super-Terra. “Ainda é cedo para defender mudanças na teoria”, pondera o pesquisador do Observatório de Lisboa. “Suspeitamos que os mundos encontrados até agora sejam uma pequena parte dos planetas existentes. E a maioria deles deve ser semelhante aos do sistema solar.” Honrando as suas origens de além-mar, Santos define o que move um caçador de planetas. “No fundo, o que estamos a fazer é dar novos mundos ao Universo, tal como os portugueses deram novos mundos ao mundo no século 16. O ser humano gosta de explorar, e é isso que estamos a fazer”, filosofa.
Republicar