O uso crescente de imagens nos hospitais nos últimos anos, como raio x, ultrassom, ressonância e tomografia, levou à necessidade de desenvolvimento de sistemas para gerenciá-las. De olho nesse mercado, grandes empresas da área de tecnologia da informação como Siemens, Toshiba, Agfa, GE, Carestream e Philips criaram soluções chamadas genericamente de sistemas de arquivamento e distribuição de imagens (Pacs, do inglês picture archiving and communication system). Agora uma pequena empresa de Ribeirão Preto se posiciona ao lado das grandes ao desenvolver um Pacs próprio. O sistema já está em uso, com bons resultados, há mais de dois anos no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMRP-USP), naquela cidade.
Chamado de LyriaPacs, o sistema foi criado pela empresa i-Medsys, fundada em 2005 em Ribeirão Preto, por três jovens pesquisadores formados e pós-graduados pela USP nas áreas de tecnologia da informação e ciência da computação. “O Lyria é um sistema de armazenamento, comunicação, distribuição e visualização que segue especificações do protocolo Dicom (do inglês digital imaging and communication in medicine), que é o padrão para arquivamento e distribuição de imagens médicas”, explica Diego Fiori de Carvalho, sócio fundador da empresa. “É uma solução completa para o gerenciamento de imagens médicas em hospitais, centros de diagnóstico, clínicas e profissionais da área da saúde”, diz Carvalho.
“Com base nas funcionalidades do padrão Dicom, o Lyria garante a interconexão com os sistemas de informação de saúde do hospital e possibilita o controle do fluxo completo de dados de imagens”, diz o professor de informática biomédica e física médica Paulo Mazzoncini de Azevedo Marques, coordenador do serviço de física médica e radioproteção do HC de Ribeirão Preto. O Lyria se conecta com o sistema computacional do hospital e recebe as informações dos pacientes que irão fazer determinados exames em um dia específico e gera uma lista. Faz então a conexão com os equipamentos que geram as imagens daqueles exames – por exemplo, um aparelho de ressonância magnética – e insere os dados do paciente. Concluído o exame, o Lyria transfere as imagens para um sistema de arquivamento, mantendo a vinculação entre os dados do paciente, existente no sistema de informação do hospital, e os do exame gerado. “Eles ficam arquivados pelo tempo que for necessário, ou definido pela instituição segundo a legislação vigente”, diz Azevedo Marques.
Os exames podem ser visualizados por meio do sistema de informação do hospital, que regula os direitos de quem tem permissão de acessar os dados segundo os perfis dos usuários previamente definidos. É o caso do radiologista no momento de fazer um laudo, por exemplo. Com uma senha, ele se conecta ao Lyria, em um computador em qualquer local do hospital, seleciona um exame, baixa as imagens e faz o laudo usando a interface do sistema de informação do hospital apropriada. Depois o documento fica vinculado com seu respectivo exame e disponível para consulta, que pode ser feita por um clínico, por exemplo, para ler o laudo elaborado pelo radiologista ou ver a imagem.
Para desenvolver o Lyria, a i-Medsys recebeu financiamento de dois projetos do Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe) da FAPESP, ambos iniciados em 2005. No primeiro, sob a coordenação de José Antônio Camacho Guerrero, sócio da empresa, foi desenvolvido um sistema de ligação entre documentos, denominado Linkdigger, destinado a criar soluções inovadoras para indivíduos e empresas que precisam relacionar os dados disponibilizados por diferentes fontes de informação. O segundo foi o sistema ArcaMed para desenvolver vários softwares para uso hospitalar, que resultou, entre outros produtos, no Lyria.
O ArcaMed foi implantado como piloto no HC em 2007. “Em 2008 obtivemos recursos do CNPq [Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico], para contratação de profissionais”, conta Fiori. “Dentro do projeto-piloto no HC de Ribeirão Preto surgiu a necessidade de uma plataforma computacional que possibilitasse a troca e o armazenamento de imagens de forma consistente e automática. Assim, a i-Medsys criou o Lyria.” Segundo Fiori, existem poucas empresas no Brasil que desenvolvem esse tipo de solução. “A maioria é representante de sistemas estrangeiros, apenas com tradução do software para português”, diz.
Contrato e personalização
“No mundo existem Pacs interessantes, mas nem todos oferecem uma solução completa. Há, por exemplo, visualizadores muito utilizados, como o KPacs, Osirix (para Apple), E-Film, e servidores para armazenamento e distribuição desenvolvidos por grandes companhias. Essas soluções normalmente necessitam de personalização, demandando custos adicionais, além do gasto na aquisição.”
Na mesma universidade, em outro hospital, o das Clínicas da Faculdade de Medicina de Universidade de São Paulo (HCFM-USP) na capital, há um contrato de prestação de serviços com a Philips, para o fornecimento do sistema utilizado no gerenciamento das imagens médicas em todo complexo da instituição. “Nesse contrato de prestação de serviços toda a responsabilidade sobre o fornecimento de hardware, software e manutenção do sistema RIS/Pacs é da Philips, permitindo que a equipe do hospital mantenha foco nas atividades assistenciais”, explica Vilson Cobello Junior, gerente de Sistemas do Núcleo Especializado em Tecnologia da Informação do HC de São Paulo. De acordo com Cobello, o projeto teve início em 2007 e entrou em operação em dezembro de 2008. “Essa solução é responsável por gerenciar todo fluxo de atendimento do Departamento de Radiologia do HC”, diz. “O que inclui desde o cadastro do paciente, agendamento, preparo do paciente, realização do exame, armazenamento e distribuição de imagens até a execução e distribuição do laudo radiológico para todo complexo do HC por meio de um portal eletrônico, que consolida de imagens médicas e laudos a atendimentos e resultados de exames laboratoriais.”
No caso do Lyria, os resultados após dois anos de uso no HC de Ribeirão Preto, segundo Fiori, são bons e apresentaram custos competitivos em relação aos concorrentes. Até dezembro de 2012 foram armazenados 389.764 estudos – conjunto de imagens médicas de pacientes –, distribuídos nas diferentes modalidades, como raio x, ultrassom, tomografia e outras. “No total, esses estudos foram compostos por 53.020.858 imagens, que estão armazenadas no sistema do hospital”, informa Fiori. De acordo com a tabela de preços do mercado para armazenamento, impressão de imagens e dos laudos, uma instituição do porte do HC de Ribeirão Preto economiza cerca de R$ 7 milhões por ano com esse sistema. O hospital realiza perto de 600 mil consultas ou procedimentos por ano. “Os custos de implantação do sistema em um hospital que gera cerca de 14 mil imagens por mês é de R$ 1 milhão, com equipamentos, serviços de instalação e treinamento”, diz Fiori.
Projetos
1. Arcamed: um arcabouço para construção de sistemas de apoio a diagnósticos médicos (n° 2005/60038-5); Modalidade Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe); Coord. Diego Fiori de Carvalho – i-Medsys; Investimento R$ 164.733,15 (FAPESP)
2. Linkdigger: serviços de criação de ligações entre informações disponibilizadas na web (n° 2003/07968-9); Modalidade Programa Pesquisa Inovativa em Pequenas Empresas (Pipe). Coord. José Antônio Camacho Guerrero i-Medsys. Investimento R$ 397.632,09 (FAPESP)