infográfico: ana paula campos / ilustração: alexandre affonsoPequenos feixes de luz laser dirigidos sobre a folha de uma planta ou porção de solo podem se tornar comuns nas lavouras dentro de alguns anos. O laser está se tornando um meio confiável para analisar elementos químicos presentes em um vegetal e trazer informações importantes sobre a adubação, por exemplo. O melhor é que o teste pode ser feito em tempo real no próprio campo, em poucos minutos, contando inclusive com o suporte de localização por GPS. Chamada de espectroscopia de emissão com plasma induzido por laser (Libs na sigla em inglês), essa tecnologia está sendo utilizada pelo robô Curiosity, da Nasa, em Marte, para verificação de elementos como ferro, carbono e alumínio das rochas marcianas. Um equipamento semelhante foi desenvolvido na Embrapa Instrumentação, localizada em São Carlos, no interior paulista. “É o primeiro sistema Libs embarcado construído no Brasil”, diz a pesquisadora Débora Milori, da Embrapa, coordenadora do projeto dentro do Centro de Pesquisas em Óptica e Fotônica, um dos Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid) da FAPESP. Além do Cepid, a fundação apoia a pesquisa com uma bolsa de pós-doutorado do físico Jader Cabral.
Uma versão mais sofisticada da técnica Libs é a com duplo pulso. Neste caso, existe um atraso entre os dois feixes de lasers de nanossegundos a microssegundos. A vantagem sobre o sistema de um pulso, mais utilizado pela comunidade científica, é a possibilidade de aumentar em várias vezes a intensidade do sinal, melhorando o limite de detecção da técnica para quantificação dos elementos. A Embrapa também construiu recentemente um sistema Libs com duplo pulso com a colaboração do físico Gustavo Nicolodelli e bolsista de pós-doutorado da Fapesp.
“Há vários trabalhos demonstrando que o sistema Libs com duplo pulso proporciona melhor desempenho analítico, com aumento de sensibilidade e limites de detecção entre duas e 20 vezes melhores que os obtidos nos métodos que empregam configurações com um pulso do laser”, diz o professor Francisco Krug, do Centro de Energia Nuclear na Agricultura (Cena) da USP. Ele coordenou um projeto financiado pela FAPESP entre 2005 e 2009 que avançou no conhecimento e desenvolvimento da análise de folhas e solo via espectrometria com plasma induzido por laser. O projeto contou com a participação de Débora e de outros pesquisadores da Embrapa. “Em geral, Libs com duplo pulso requer instrumentação um pouco mais complexa, mas ambos são relativamente simples. Atualmente, os sistemas portáteis, disponíveis no mercado, baseiam-se em medidas geradas por um pulso do laser”, diz Krug.
“De qualquer forma, certamente a tecnologia com duplo pulso incorporada aos equipamentos portáteis ampliará ainda mais o número de aplicações analíticas”, diz. “Já existem equipamentos comerciais que exploram outras áreas da espectroscopia instalados em máquinas agrícolas que possibilitam análise de solos em tempo real, e espera-se que o Libs possa contribuir muito em breve para avaliação do estado nutricional das culturas agrícolas também em tempo real.” O Grupo de Espectrometria Atômica do Cena-USP, sob a coordenação de Krug, é especializado no desenvolvimento e validação de métodos quantitativos para análise direta de amostras de interesse agronômico e ambiental.
“A quantificação pode ser feita por meio de modelos de calibração utilizando-se amostras de referência. A intensidade da emissão dos elementos é proporcional à concentração que ele tem na amostra. A calibração é bastante dependente da matriz, ou seja, é preciso construir um modelo para quantificar carbono no solo e outro para o carbono em plantas”, diz Débora. A análise com laser também é vantajosa em relação ao menor tempo gasto se comparada aos testes convencionais realizados em laboratórios, onde existe a necessidade de preparação da amostra com reagentes químicos. Sem esses produtos, o uso do Libs contribui para diminuir a geração de resíduos. “É uma técnica limpa”, diz Débora.
O objetivo dos pesquisadores da Embrapa foi construir um equipamento portátil e adaptá-lo a uma espécie de carrinho semelhante a um robô que pode ser levado ao campo. “Montamos um sistema robótico para demonstrar o conceito com a colaboração dos professores Marcelo Becker e Daniel Magalhães, da EESC [Escola de Engenharia de São Carlos] da USP.”
Quebra de moléculas
No robô, um laser pulsado é focalizado em amostras de folhas ou do solo. O local é aquecido e a temperatura chega aos 50.000 Kelvins (K). O efeito térmico provoca uma quebra das moléculas presentes no material e uma evaporação, formando assim um plasma, ou seja, uma densa nuvem gasosa de átomos, íons e elétrons. Depois de alguns microssegundos, o plasma esfria para temperaturas da ordem de 5 a 15.000 K e aparecem linhas de emissão de luz características de cada elemento químico presente na amostra. Essa luminosidade é captada por um conjunto de lentes instaladas no equipamento e focadas em um espectrômetro.
No espectrômetro a luz será detectada por um sistema optoeletrônico também presente em câmeras fotográficas digitais para captar as imagens. Conforme o espectro de luz emitido, é possível classificar no aparelho os elementos presentes na amostra, como fósforo, carbono e cobre, por exemplo. “As emissões produzidas pelos átomos e íons representam a impressão digital de cada elemento químico”, diz Débora. A análise com laser se insere dentro do conceito de agricultura de precisão, que utiliza cada vez mais instrumentos e recursos da tecnologia da informação como computadores, GPS e redes sem fio para implementar melhorias no âmbito da produção agrícola.
Projetos
1. Desenvolvimento e avaliação de um sistema Libs com pulso duplo: Aplicação em caracterização de solos (n° 2012/24349-0); Modalidade Bolsa de Pós-doutorado Bolsista Gustavo Nicolodelli/Embrapa; Coord. Débora Milori/Embrapa; Investimento R$ 163.082,88 (FAPESP)
2. Análise de solos utilizando técnicas fotônicas visando ao desenvolvimento de equipamentos portáteis para medidas in situ (nº 2012/22196-1); Modalidade Bolsa de Pós-doutorado; Bolsista Jader de Souza Cabral/Embrapa; Coord. Débora Milori/Embrapa; Investimento R$ 163.082,88 (FAPESP)
3. Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica (Cepof) (n° 2013/07276-1); Modalidade Programa Centro de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid); Coord. Vanderlei Bagnato/USP; Investimento R$ 1.000.000,00 por ano (FAPESP)