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Novos materiais 

Maleável e não deforma

Espuma feita com óxido de grafeno e nitreto de boro é leve, resistente e retoma a forma original depois de comprimida

Associada a outras moléculas, a folha de átomos de carbono que dá forma ao grafeno pode adquirir propriedades ainda mais surpreendentes. Uma equipe de pesquisadores da Universidade Rice (EUA), com participação de físicos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), desenvolveu um tipo de esponja extremamente leve, resistente e maleável a partir de uma reação química que junta uma variante desse material, o óxido de grafeno (GO), e a forma hexagonal do nitreto de boro (BN), composto sintético usado como lubrificante e aditivo em cosméticos. Amostras da esponja de uns poucos centímetros de tamanho foram comprimidas com moedas de um centavo de dólar e retomaram sua forma inicial sem problemas. A estrutura nanométrica do novo material, denominado GO-0.5BN, se assemelha às entranhas de um prédio em construção: os pisos e as paredes se montam sozinhos a partir de uma base de folhas de óxido de grafeno reforçada por placas de nitreto de boro. A densidade do GO-0.5BN é 400 vezes menor do que a do grafite.

Formado apenas por ligações de átomos de boro e nitrogênio, o nitreto de boro apresenta uma configuração hexagonal semelhante à do grafeno, ao qual se encaixa sem maiores problemas e confere maior resistência e maleabilidade mecânica. “O novo material é estável do ponto de vista químico e térmico e pode ser usado em sistemas para armazenar energia, como supercapacitores e eletrodos de bateria, e absorver gases”, diz Douglas Galvão, do Instituto de Física Gleb Wataghin da Unicamp, que participou do estudo. “O nitreto de boro reforça a estrutura do óxido de grafeno, que apresenta alguns buracos e pode se tornar quebradiça em certos pontos”, explica o físico teórico Pedro Alves da Silva Autreto, que faz pós-doutorado na Unicamp com bolsa da FAPESP e passou uma temporada na Rice, onde realizou simulações computacionais sobre as características do GO-0.5BN. O processo usado para obter a esponja e suas propriedades foram apresentados em artigo científico publicado em 29 de julho na revista Nature Communications.

O óxido de grafeno mantém praticamente as mesmas propriedades do grafeno puro, mas sua obtenção é mais simples e barata. Por isso, os pesquisadores preferiram usá-lo em seus experimentos. Ele pode ser produzido em grande quantidade por meio da esfoliação química do óxido de grafite. A presença de átomos de oxigênio em meio à colmeia hexagonal de carbonos do grafeno confere outra vantagem ao composto: é mais fácil fazer pilhas de folhas de óxido de grafeno – e assim criar camadas ao mesmo tempo extremamente resistentes e finas – do que apenas de grafeno. “Esperávamos que a adição de nitreto de boro ao óxido de grafeno gerasse uma nova estrutura, mas não exatamente com o ordenamento de camadas que descobrimos”, afirma a engenheira elétrica Soumia Vinod, da Universidade Rice, primeira autora do paper sobre a esponja.

As placas de nitreto de boro hexagonal estão distribuídas uniformemente por todos os andares e as paredes da estrutura interna do material que compõe a esponja. Sua presença mantém unidas as folhas de óxido de grafeno que funcionam como uma espécie de esqueleto do GO-0.5BN. Segundo Vinod, as placas absorvem o estresse decorrente da compressão e do esticamento da esponja, evitam que os pisos de óxido de grafeno desmoronem ou apresentem rachaduras e aumentam a estabilidade térmica do composto.

Sem patente
Até chegar à formulação química da esponja apresentada no artigo científico, os pesquisadores testaram versões do novo material com diferentes proporções de seus dois ingredientes. Enquanto o pessoal da Rice misturava distintas quantidades de óxido de grafeno e de nitreto de boro, ambos os compostos na forma de pó, Autreto realizava simulações no computador tentando prever as propriedades do material em gestação e fornecer parâmetros para seus colegas refinarem o trabalho de bancada. “Eu era o único físico teórico em meio a 50 pesquisadores da área experimental do grupo do professor Pulickel Ajayan”, afirma Autreto, referindo-se ao período em que ficou na universidade americana. A versão mais estável da esponja foi a que devia metade do peso final à presença de nitreto de boro na mistura. O óxido de grafeno interage com o nitreto de boro devido à ação de catalisadores químicos. O produto final da reação, o material esponjoso, é liofilizado, ou seja, é congelado e perde sua água por sublimação. A esponja apresenta a forma do recipiente em que foi gerada. “Uma vez que tenhamos em mãos as quantidades necessárias de óxido de grafeno e de nitreto de boro hexagonal, gastamos de dois ou três dias para produzir a espuma”, explica Vinod.

Por ora, a esponja nanoestruturada que não se deforma e pode armazenar energia ou absorver gases não foi protegida por uma patente comercial. A parceria da Unicamp com a Rice deve continuar e render novos trabalhos. “Dois pós-doutores de nossa equipe vão se juntar ao grupo do professor Ajayan para continuar a colaboração”, afirma Galvão, que foi o orientador do mestrado e do doutorado de Autreto e supervisiona seu pós-doutorado.

Projeto
Propriedades estruturais, mecânicas e de transporte de grafeno e estruturas relacionadas (nº 11/13259-7); Modalidade Bolsa de pós-doutorado; Pesquisador responsável Douglas Soares Galvão (IFGW/Unicamp); Bolsista Pedro Alves da Silva Autreto; Investimento R$ 139.310,43 (FAPESP).

Artigo científico
VINOD, S. et al. Low-density three-dimensional foam usings elf-reinforced hybrid two-dimensional atomic layers. Nature Communications. 29 jul. 2014.

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