
Mas essa não é a tarefa mais complexa que o CFlexTrains executa. Se o operador, por exemplo, quiser intervir e determinar que um certo trem tenha prioridade, o sistema consegue propor instantaneamente um novo escalonamento. Caso uma locomotiva quebre, o que acontece com freqüência, a reprogramação é feita imediatamente pelo software. O programa pode remodelar continuamente a utilização da linha de acordo com as necessidades impostas pelo operador. “Trata-se de uma ferramenta que ajuda o usuário a pensar melhor”, diz o engenheiro de computação Rodrigo Almeida Gonçalves, 34 anos, um dos fundadores da CFlex.
Para se ter uma dimensão do impacto produzido pela inovação da CFlex, até há pouco era totalmente manual o trabalho de definir quais trens ocupariam primeiro as linhas e quais ficariam esperando a passagem das composições prioritárias. A tomada de decisão cabia a um solitário controlador de tráfego de trens. Na prática, levavam-se em conta apenas os problemas de curtíssimo prazo. Se vários trens necessitassem compartilhar um mesmo trecho da linha ao mesmo tempo, resolvia-se quem deveria ter prioridade naquele momento sem levar em conta os entraves que tal decisão provocaria dali a uma ou duas horas — quando, então, os novos gargalos seriam administrados. “Quando alguém cometia um erro, às vezes era necessário dar marcha à ré em um trem por dezenas de quilômetros, causando enormes prejuízos”, diz Gonçalves. “Não era raro que o operador acabasse demitido quando isso acontecia. E seus colegas, com medo de ter o mesmo destino, passavam um tempo tomando decisões muito conservadoras, que provocavam lentidão extra às linhas”, afirma.

Convênio da Vale
A tecnologia e a mão-de-obra da CFlex têm origem na universidade e mantêm vínculos com ela até hoje. No final dos anos 1990, a Companhia Vale do Rio Doce encomendou a Fernando Gomide, a Rafael Mendes e a Luís Gimeno Latre, professores da Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), o desenvolvimento de um software que ajudasse a planejar a circulação dos trens em sua malha ferroviária. O trabalho foi realizado e inspirou a tese de doutorado de Rodrigo Gonçalves sobre o problema da programação de trabalho dos maquinistas nos trens. Em paralelo, a mestranda Magali Rondon González realizava uma pesquisa sobre o uso de sistemas inteligentes em transportes ferroviários. O convênio com a Vale não foi renovado após a privatização da companhia, mas a Unicamp seguiu investindo nessa linha de pesquisa até dar origem à CFlex, que tem como sócios os ex-alunos Rodrigo e Magali. A empresa foi criada em 1996 com o nome de Softel, dentro do Projeto Softex 2000, mas acabou mudando de nome para incorporar sua atual vocação. Em 2004, Luís Elesbão de Oliveira Neto, ex-diretor da Ferronorte, tornou-se sócio da CFlex. A partir daí, a empresa decidiu investir no aperfeiçoamento do sistema CFlexTrains, que teve apoio da FAPESP por meio do Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe). Já conseguiram vendê-lo para grandes operadoras. A mais recente foi a América Latina Logística (ALL), que irá implantar o software até em ferroviárias da Argentina. Além da ALL, o sistema também está em uso na Companhia Ferroviária do Nordeste e em implantação na Ferrovia Centro-Atlântica e na Estrada de Ferro Vitória-Minas.
Hoje, além do CFlexTrains, a empresa vende softwares que organizam a logística de pátios de minérios e de portos. Também desenvolveu um programa para formulação da mistura de gorduras e óleos em indústrias de alimentação, combinando matérias-primas de tipos e origens diferentes sem alterar a qualidade do produto final. A CFlex tem 24 funcionários, boa parte deles na área de pesquisa e desenvolvimento. Como alguns ainda estão na universidade, envolvidos com dissertações e teses, a CFlex adota horários flexíveis na empresa. Mas, para garantir que os clientes serão atendidos no tempo prometido, a empresa criou um software de uso interno que administra a agenda dos empregados, estabelece metas e programa reuniões. “Os laços com a universidade são vitais para a empresa, mas o mundo não espera a gente parar para estudar”, diz Rodrigo Gonçalves.
O Projeto
Supervision: Sistema de apoio a logística e operação ferroviária (nº 04/02901-6); Modalidade Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe); Coordenador Rodrigo Almeida Gonçalves — CFlex; Investimento R$ 86.249,16 (Fapesp)