Se permanecesse parado, livre de qualquer força elétrica ou magnética e a zero grau absoluto (-273º Celsius), o próton, uma das partículas do núcleo atômico, se manteria estável. E assim poderia ficar para sempre, de acordo com os atuais modelos teóricos. O cenário é mais animado quando o próton é submetido, por exemplo, a um campo elétrico: torna-se acelerado e pode se desintegrar. A explicação disso, do ponto de vista do próton – como se um observador estivesse sentado sobre ele -, faz parte de um estudo que ganhou destaque na edição de 8 de outubro da Physical Review Letters, assinado por George Matsas, do Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista (IFT-Unesp), e de seu doutorando Daniel Vanzella, hoje no Centro de Gravitação e Cosmologia da Universidade de Wisconsin, Estados Unidos.
Ao explicar a desintegração ou decaimento do próton, o estudo de Matsas e Vanzella confirma matematicamente o chamado efeito Fulling-Davies-Unruh, apresentado como hipótese em 1976: um observador inercial parado no laboratório não veria nada se estivesse no vácuo a zero absoluto, enquanto um observador acelerado veria partículas elementares em movimento, como se estivesse num forno de microondas com milhões de prótons, nêutrons, elétrons e outras partículas batendo nele.
Os pesquisadores basearam-se nesse efeito para explicar a desintegração do próton do ponto de vista de um observador acelerado sentado sobre ele. Nessas condições, assistiria ao surgimento de partículas que simplesmente não existem para observadores inerciais – mais um dos mistérios da mecânica quântica. À temperatura baixa, o próton absorve um életron e um antineutrino e forma um nêutron.
“À medida que a aceleração aumenta, o próton sente uma temperatura ambiente mais alta e outros processos de desintegração se tornam mais prováveis”, diz Matsas. O próton pode então transformar-se em nêutron, desta vez pela captura de um elétron, num processo que emite um neutrino, tipo de partícula aparentemente sem massa. Outra possibilidade é absorver um antineutrino e originar um nêutron e um pósitron, partícula com as mesmas características do elétron, mas de carga elétrica contrária.
Matsas e Vanzella calcularam o tempo de desintegração do próton também para observadores parados no laboratório que apenas vêem o próton em movimento. Por fim, viram que o tempo de desintegração coincidia com os resultados obtidos para observadores em movimento sobre o próton. “Se o efeito não existisse, não haveria como explicar a desintegração do próton acelerado do ponto de vista de um observador sentado sobre ele”, diz Matsas. A transformação em nêutron e outras partículas imensamente menores é rapidíssima – demora um décimo de segundo.
Mas só pode ocorrer se o próton estiver submetido a uma aceleração gigantesca, equivalente ao número 5 seguido de 34 zeros em centímetros por segundo ao quadrado, algo só concebível em pulsares, objetos cósmicos altamente energéticos. “Somente em condições astrofísicas haveria uma chance de observar a desintegração do próton”, diz o pesquisador da Unesp. Na Terra, ainda não é possível atingir essa aceleração, nem mesmo nos maiores aceleradores do mundo, como o do Laboratório Fermi, nos EUA, ou o franco-suíço Large Hadron Collider (LHC), em construção. Por enquanto, o próton continua uma partícula estável. “Na Terra”, diz Matsas, “o tempo que o próton precisaria para se desintegrar seria muito maior que a própria idade do universo”.
O Projeto
Espinores em Teoria de Campos em Espaços Curvos (nº 97/13261-2); Modalidade Bolsa de Pós-Graduação; Coordenador George Emanuel Avraam Matsas – Instituto de Física Teórica/Unesp; Investimento R$ 81.283,69