Quando teclamos um número no telefone ou enviamos um e-mail, nunca imaginamos o caminho que percorre nossa ligação até um bairro vizinho ou uma cidade distante. A transmissão de um ponto a outro sempre foi e continua sendo realizada por equipamentos, fios e, mais recentemente, por fibras ópticas, todos igualmente escondidos dos nossos olhos. Por isso, acompanhar as transformações tecnológicas das redes de telecomunicações nos últimos anos não é tarefa fácil para os não-iniciados. A mais importante revolução começou nos anos 70, quando as fibras ópticas apareceram.
Desde então, tudo que se relaciona a esse meio de transmissão continua a instigar os pesquisadores da área. Ao permitir a instalação de um fio com diâmetro um pouco maior que um fio de cabelo no lugar de centenas de cabos de cobre, e transmitindo por meio de luz, as fibras criaram outras necessidades tecnológicas. Atualmente, uma das grandes batalhas dos profissionais desse setor em todo o mundo é obter amplificadores capazes de suprir a demanda do crescimento do número de telefones fixos, do aparecimento do fax, dos celulares, das redes de dados e da Internet. O amplificador, instalado, principalmente, entre cidades e nas conexões internacionais, recebe, ao longo de um percurso – entre 20 e 100 quilômetros -, os sinais do laser que percorrem o interior das fibras. Ele recupera a onda luminosa, que perde potência ao longo da transmissão.
O desenvolvimento de novos amplificadores é imprescindível para aumentar a capacidade e a velocidade do sistema de telecomunicações e diminuir os custos de implantação de novas redes. Com essas metas, quatro laboratórios em todo o planeta estão em uma corrida tecnológica para o aperfeiçoamento de uma nova geração de amplificador óptico chamado de Fiber Optic Parametric Amplifier (Fopa) ou amplificador paramétrico de fibra óptica. Um desses laboratórios está no Instituto de Física (IF) da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), que faz parte do Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica (CePOF) financiado pela FAPESP. Os outros são os laboratórios da Bell, da empresa Lucent, e da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, e da Universidade de Tecnologia Chalmers,da Suécia.
O Fopa poderá aumentar em dezenas de vezes a capacidade de transmissão de uma fibra óptica. Hoje, nas conexões de longa distância, a transmissão acontece na faixa de comprimento de onda entre 1,53 e 1,56 micrômetro (µm), na região do infravermelho, onde as fibras têm perdas mínimas. Mas a capacidade dessa fibra vai de 1,10 até 1,75 µm. A fina estrutura da fibra também possui a capacidade de transmitir mais de 100 terabits por segundo (Tb/s; um terabit é igual a mil gigabits).
A atual transmissão acontece em, no máximo, 4 Tb/s. Como comparação, essa velocidade de transmissão (tecnicamente chamada de taxa de transmissão, porque a velocidade é sempre a da luz) é suficiente para 62 milhões de ligações telefônicas (de 64 kilobits por segundo – kb/s) ao mesmo tempo ou, olhando para o futuro, cerca de mil canais de televisão digital simultâneos ou o texto completo de todos os livros da maior biblioteca do mundo, também em apenas um segundo. Portanto, entre 100 Tb/s e 4 Tb/s existe muito espaço para ser aproveitado numa fibra óptica.
Aumento da banda
Em laboratório, o Fopa já consegue transmitir em 10 Tb/s. “Nossa intenção é chegar a 40, 50 Tb/s”, informa o professor Hugo Fragnito, coordenador do segmento do CePOF na Unicamp (os outros ficam no Instituto de Física da Universidade de São Paulo, em São Carlos, e no Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares – Ipen). Com o Fopa será possível trabalhar em outras faixas dentro do espectro entre o 1,1 e 1,75 µm. “Ele consegue amplificar em larguras de banda (de freqüências) maiores que o amplificador dopado com érbio – elemento químico classificado como terra rara – utilizado atualmente.
“O paramétrico é igual ou melhor que o érbio em várias regiões do espectro de transmissão.”O amplificador a érbio ou Erbium Doped Fiber Amplifier (EDFA), já havia provocado uma revolução tecnológica a partir de 1990. Anunciado em 1987, na forma de protótipo elaborado em conjunto pela British Telecom, a empresa DuPont e a Universidade de Southampton, na Grã-Bretanha, o érbio apresentou muitas vantagens em relação ao repetidor eletrônico usado desde o início da utilização de fibras ópticas, o 3R (de regenerador, reformatador e retemporizador). “A velocidade de transmissão subiu de 1 Gb/s para 4 Tb/s com o érbio”, diz Fragnito.
Outro fator importante foi a diminuição dos custos de instalação de redes. O preço de um amplificador caiu de US$ 500 mil para US$ 30 mil. O “milagre” desse elemento químico chamado érbio é que os seus íons absorvem luz de umlaser chamado laser de bombeio com comprimento de onda em 0,98 µm ou em 1,48 µm e (amplificam) a luz do laser de sinal (que faz a transmissão) na faixa de 1,53 a 1,56 µm. A revolução provocada por esse tipo de amplificador também se fortaleceu na adoção do sistema Wavelength Division Multiplexing (WDM) ou Multiplexação por Divisão de Comprimento de Onda. O érbio viabilizou o WDM, que, em vez de usar uma fibra para cada laser de sinal, como no sistema antigo, possibilita que vários lasers possam ser transmitidos pela mesma fibra óptica. Assim, a multiplexação permite que diversas bandas de transmissão (cada uma com dezenas de milhões de ligações ao mesmo tempo) possam ser enviadas por uma única fibra óptica.
O Fopa não precisa do érbioepode operar em qualquer comprimento de onda. Na amplificação paramétrica seaproveitam os efeitos que qualquer matériaexibe quando iluminada com alta intensidade, utilizando a transferência de energia de um laser para outro. “Os efeitos de alta intensidade da luz no interior das fibras geralmente distorcem os sinais de transmissão”, diz Fragnito.
O segredo no Fopa é aproveitar esses efeitos para o bem e não para o mal. Para isso, ele transfere a energia de um laser de bombeio, colocado dentro da fibra, para o laser de transmissão, amplificando o sinal. “Podemos colocar um ou dois lasers de bombeio em cada fibra para ter mais amplificação e maior largura de banda”, afirma José Manuel Chávez, pós-doutorando do laboratório de fibras ópticas do IF da Unicamp. “Com o Fopa conseguiremos aproveitar mais a imensa capacidade de transmissão das fibras”, diz Fragnito. Os benefícios do Fopa ainda não têm prazo para entrar no mercado. São precisos ainda muitos testes e ajustes.
Outra inovação surgida na Faculdade de Engenharia Elétrica e de Computação da Unicamp, que também faz parte do CePOF, está relacionada a um outro tipo de amplificador. Trata-se do amplificador óptico semicondutor ou Semicondutor Optical Amplifier (SOA), já fabricado pela empresa Alcatel, somente para uso em laboratórios. Esse equipamento faz a amplificação do laser por meio de um chip e deverá ser usado nas redes de telecomunicações em áreas metropolitanas. “Para esse amplificador desenvolvemos um redutor de tempo do chaveamento eletro-óptico que faz o sistema de liga e desliga do SOA”, diz o professor Evandro Conforti.
Esse chaveamento foi reduzido em dez vezes, de 2 bilionésimos de segundo ou 2 nanossegundos (tempo de outros sistemas usados atualmente nas redes de Internet) para 0,2 nanossegundo. Esse tipo de redução de tempo facilita e oferece maior capacidade ao sistema em receber e despachar a luz delaser com as transmissões.
Tudo óptico
A nova técnica teve a co-autoria do aluno de doutorado Cristiano Gallep, que ganhou um prêmio nos Estados Unidos com esse trabalho, e está em processo de patenteamento pelo Núcleo de Patentes e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec), da Fapesp. “Ainda não existem interessados, mas acreditamos no potencial desse sistema para melhorar os futuros amplificadores ópticos”, afirma Conforti.
“Principalmente, se daqui a alguns anos forem adotados sistemas totalmente ópticos, quando não haverá, como hoje, a conversão do sinal elétrico (dos fios de cobre) para sinais delaser .” Se isso acontecer, a transmissão de um e-mail, por exemplo, sairia do computador já na forma de luz e chegaria dessa maneira ao servidor e daí para outro computador, sempre correndo pelas fibras ópticas. Um futuro, em que o e-mail vai virar o-mail, o de óptica, e vai precisar muito de amplificadores ópticos eficientes, de banda larga e muito rápidos. Um futuro que já está em produção.
O projeto
Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica (CePOF), na Unicamp; Modalidade Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids); Coordenador Hugo Fragnito – Instituto de Física da Unicamp; Investimento R$ 1 milhão por ano