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Sensoriamento remoto

Análise remota

Software automatiza a avaliação de queima de cana em imagens de satélite

O novo sistema poderá ser usado para verificação de desmatamento em florestas ao longo do tempo

Léo RamosO novo sistema poderá ser usado para verificação de desmatamento em florestas ao longo do tempoLéo Ramos

Descobrir um endereço qualquer, ver o traçado e os arredores de um lugar de destino de uma viagem próxima são usos que tornaram populares as imagens de satélite acessadas pela internet. No âmbito profissional, principalmente na agricultura, essas imagens já permitem monitorar grandes áreas e acompanhar e estimar a produção de uma plantação. Isso acontece por meio de técnicas de sensoriamento remoto usadas para processar e interpretar as fotos e dados obtidos por sensores a bordo de satélites. Recentemente, uma contribuição para esse tipo de monitoramento agrícola, relacionado à cultura da cana-de-açúcar, ganhou o primeiro lugar na categoria Trabalhos Acadêmicos na quinta edição do Prêmio Top Etanol, uma iniciativa da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica) em parceria com outras associações de produtores de cana, além de indústrias como Dedini, Basf, Monsanto e Syngenta. O grupo vencedor é do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos. À frente do estudo esteve o pesquisador Marcio Pupin Mello, que desenvolveu um software para automatizar o mapeamento por imagens de satélites de culturas de cana ao longo da safra.

O método, que foi publicado em 2013 na revista IEEE Transactions on Geoscience and Remote Sensing, começou a ser delineado na Inglaterra em 2000 pelo professor Carlos Vieira, atualmente na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que na época cursava o doutorado na Universidade de Nottingham. Em 2007, o método começou a ser adaptado em aplicações dentro do Canasat, programa do Inpe para monitorar via satélite o plantio de cana-de-açúcar na região Centro-Sul do país.

Iniciado em 2003, o Canasat, além de estimar e fazer o mapeamento do cultivado de cana, também tem a função de identificar se determinada colheita foi feita com ou sem a queima da palha na pré-colheita. A legislação agroambiental do estado de São Paulo prevê a gradual diminuição da prática da queima e a completa eliminação desse tipo de manejo agrícola em 2031. Para antecipar o estabelecido na legislação, a Secretaria do Meio Ambiente do Estado de São Paulo firmou em 2007 um protocolo com o setor sucroenergético para eliminar essa prática, em quase todo o estado, até 2014. Desde 2006, as imagens são utilizadas para avaliar a gradual redução da área queimada no estado de São Paulo. Entre 2006 e 2013, essa área foi reduzida de 65,8% para 16,3%, respectivamente. Essa análise é feita por técnicos que examinam imagem por imagem para obter as respostas sobre o tipo de colheita da cana-de-açúcar: com ou sem o uso do fogo. Apesar de atingir níveis muito altos de precisão, esse trabalho de mapeamento baseado em interpretação visual é moroso, porque os técnicos precisam interpretar e mapear cada área de cana colhida em várias imagens coletadas ao longo do tempo. O novo sistema permite que se faça esse mesmo trabalho, mas com análise automática. “Ele processa as imagens de satélites obtidas em datas diferentes ao longo da safra e permite identificar, de forma automática, se a colheita da cana-de-açúcar foi feita com ou sem a queima da palha”, diz Mello, que trabalhou no desenvolvimento do novo sistema durante seu mestrado e parte do doutorado no Programa de Pós-graduação em Sensoriamento Remoto do Inpe.

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“A partir de imagens dos satélites norte-americanos Landsat-5 e Landsat-7, identificamos mudanças na energia refletida nas áreas de cana”, explica Mello, que fez parte do seu doutorado no Instituto de Geoinformática da Universidade de Münster, na Alemanha, e atualmente é coordenador de pesquisa da área de sensoriamento remoto da Boeing no Brasil. “Identificamos a variação da energia refletida pela cana ao longo do tempo. Com essas informações podemos fazer a interpretação do que existe no campo, se palha, ou a planta em pé, por exemplo, e fazer a identificação de cada área colhida ao longo da safra sobre as imagens”, diz o professor Bernardo Rudorff, que se aposentou do Inpe, onde foi coordenador do Canasat, e agora é sócio da empresa Agrosatélite, em Florianópolis, Santa Catarina, especializada em sensoriamento remoto na agricultura.

Monitoramento ambiental
O novo sistema chamado de Stars, do inglês Spectral-Temporal Analysis by Response Surface, também poderá ser útil para análises de desmatamentos. A avaliação automática poderá ser feita por meio da verificação de mudanças dos padrões espectrais das áreas de vegetação ao longo do tempo, no caso de florestas para solo exposto. “Acredito que esse método possa trazer benefícios aos órgãos de fiscalização, tanto para verificação de queima da cana como para monitoramento ambiental de florestas”, diz Mello.

No momento o software ainda não está em uso profissional, mas os algoritmos podem ser acessados no site do Inpe em www.dsr.inpe.br/~mello. Para melhorar o processamento das imagens e tornar o software operacional, além da possibilidade de explorar outras aplicações, Mello diz que espera um próximo estudante de pós-graduação no Inpe, onde é coorientador, para continuar o trabalho. “Sou formado em engenharia e implementei o software para minha pesquisa, mas se agora um especialista em programação de softwares assumisse o trabalho poderia torná-lo um produto”, diz Mello. Automatizar softwares para a área de sensoriamento remoto principalmente para análise temporal de imagens é uma exigência do setor. “Existem cada vez mais satélites com ampla capacidade de obtenção de imagens da superfície terrestre, de dados do solo e de culturas agrícolas. Sendo assim, é preciso aumentar a automatização das análises”, diz Rudorff.

Artigos científicos
AGUIAR, D. A. et alRemote sensing images in support of environmental protocol: Monitoring the sugarcane harvest in São Paulo state, BrazilRemote Sensing. v. 3, n. 12, p. 2682-703. 2011.
MELLO, M.P. et al. Stars: A new method for multitemporal remote sensing. IEEE Transactions on Geoscience and Remote Sensing. v. 51, n. 4, p. 1897-913. abr. 2013.

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