Reconhecidas pelo corpo marrom, pelas pernas longas e pelo hábito de se esconder na areia, as aranhas do gênero Sicarius formam populações isoladas há pelo menos 15 milhões de anos em áreas abertas e ensolaradas no Brasil e em outros países da América do Sul, de acordo com um levantamento de biólogos do Instituto Butantan, da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e do Museo Argentino de Ciencias Naturales Bernardino Rivadávia (MACN).
Com até 12 centímetros de envergadura, as Sicarius têm um veneno quimicamente muito similar ao das Loxosceles, as aranhas-marrom. Também com seis olhos, mas menores, as Loxosceles são temidas em razão dos acidentes que podem causar – a área metropolitana de Curitiba, no Paraná, a mais atingida, registra cerca de 2 mil casos de picadas por ano. Em 2013, outra equipe do Butantan relatou que o veneno das aranhas desses dois gêneros contém a enzima esfingomielinase-D, proteína responsável pela destruição dos tecidos na região das picadas. O único caso de acidente por Sicarius no Brasil foi relatado em 1992, em um rapaz de 17 anos.
Aparentemente as Sicarius não oferecem perigo por viver em ambientes diferentes, assegura o biólogo Antonio Brescovit, pesquisador do Butantan que coordenou o levantamento. “As Sicarius andam pouco e vivem em áreas desérticas, em geral afastadas de casas e de pessoas”, diz ele. “As Loxosceles se movem muito, entram nas casas e se escondem em roupas e calçados, mas só picam quando as pessoas se vestem e as pressionam, liberando o veneno.”
Os pesquisadores percorreram cerca de 50 mil quilômetros e fizeram coletas em 150 localidades do Brasil, do Chile, do Peru e da Argentina. Como resultado desse trabalho, detalhado em um artigo publicado em abril de 2017 na revista Zoological Journal of the Linnean Society, o total de espécies do gênero nas Américas passou de 15 para 21 e no Nordeste brasileiro, de uma para seis.
Na Caatinga, antes desse levantamento, só havia registro da Sicarius tropicus, coletada em quatro lugares. Os biólogos verificaram que dois exemplares eram de fato a S. tropicus, mas outros dois eram de outra espécie, a que deram o nome de S. cariri. Depois identificaram outras quatro espécies novas (ver mapa). “A Sicarius diadorim e a jequitinhonha são tão parecidas que só as distinguimos depois de comparar suas sequências de DNA”, diz o biólogo Ivan Magalhães, pesquisador da UFMG.
Projeto
Sistemática de aranhas haplóginas neotropicais (Arachnida, Araneae) (nº 11/50689-0); Modalidade Projeto Temático; Pesquisador responsável Antonio Domingos Brescovit (Instituto Butantan); Investimento R$ 1.200.792,13.
Artigo científico
MAGALHÃES, I. L. F. et al. Phylogeny of Sicariidae spiders (Araneae: Haplogynae), with a monograph on Neotropical Sicarius. Zoological Journal of the Linnean Society. v. 179, n. 4, p. 767-64. abr. 2017.