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AMBIENTE

Boas práticas produtivas podem reduzir emissões de carbono no campo

Manter a palha sobre o campo e aprimorar os cuidados como o solo contribui para a redução de gases de efeito estufa na agricultura

Solo coberto de palha após colheita de cana-de-açúcar em uma fazenda do município de Altair, norte do estado de São Paulo

Léo Ramos Chaves / Revista Pesquisa FAPESP

Remover de forma indiscriminada a palha da cana-de-açúcar do campo após a colheita pode reduzir os estoques de carbono no solo e elevar as emissões de gases de efeito estufa (GEE). Já se sabia que a palha usada nas usinas para a produção de etanol celulósico (2G) e de eletricidade fornece vários serviços ecossistêmicos, como retenção de água no solo e controle de erosão. Agora, um estudo do Laboratório Nacional de Biorrenováveis do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBR-CNPEM), em Campinas, mostrou que também é importante para a garantia de estoque de carbono no solo.

Enquanto cresce, a cana captura dióxido de carbono (CO2) da atmosfera e o acumula na palha, no colmo e nas raízes. Quando a cana é colhida, a palha é deixada no campo e, com o tempo, o CO2 nela contido se transforma em carbono estabilizado no solo. A transferência de carbono da atmosfera para o solo favorece o balanço de emissões do setor.

“Foi a primeira vez que uma pesquisa incluiu os estoques de carbono do solo na contabilização das emissões de GEE do ciclo de vida da bioenergia derivada da palha”, conta o engenheiro-agrônomo Ricardo Bordonal, primeiro autor de um artigo com esses resultados publicado em julho na revista Science of the Total Environment. “Utilizando modelos de simulação e avaliação do ciclo de vida, concluímos que, dependendo da quantidade de palha removida, os benefícios ambientais quanto ao balanço de GEE variam.”

Entrevista: Ricardo Bordonal
00:00 / 10:26

Para Congio, é importante que as estimativas do balanço de carbono da agropecuária no Brasil adotem uma padronização nas unidades de fluxos dos GEE – recomendação feita no artigo científico de Bieluczyk. “Muitos estudos usam fatores de conversão dos GEE recomendados pelo IPCC [Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas], que são geralmente baseados em trabalhos desenvolvidos em condições de clima temperado e sistemas de produção distintos dos tropicais.”

Um dos propósitos do CCarbon-USP é identificar combinações de plantas e formas de ocupação do solo mais adequadas para compor um sistema de produção que proporcione maior retenção de carbono, torne o solo mais saudável e aumente a produtividade agrícola. Os pesquisadores miram as plantas de cobertura, como braquiárias, crotalárias, milheto e sorgo, usadas entre o plantio das culturas principais.

“Depois da colheita da soja, por exemplo, o agricultor deve utilizar uma dessas plantas para, literalmente, cobrir o solo”, explica Cherubin. “Elas têm um papel crucial, pois ajudam a ciclar nutrientes, fixar nitrogênio atmosférico, sequestrar carbono, controlar nematoides e proteger o solo contra o impacto das gotas da chuva e da erosão.” Segundo ele, na última safra, por causa das altas temperaturas, algumas lavouras de Mato Grosso precisaram fazer três replantios por não ter o solo coberto com a palhada.

Em julho, o grupo de pesquisa em manejo e saúde do solo da Esalq, associado ao CCarbon-USP, publicou o e-book Guia prático de plantas de cobertura: espécies, manejo e impacto na saúde do solo, com o propósito de auxiliar os agricultores a planejar melhor a janela de cultivo. “Imprimimos 3 mil cópias e entregamos a produtores rurais em um evento na Bahia”, relata Cherubin. Segundo ele, a agropecuária é bastante vulnerável às mudanças climáticas. “Hoje, é parte do problema, emitindo GEE. Pretendemos mostrar ao produtor que, adotando práticas de manejo sustentáveis, ele pode ser parte da solução, sequestrando carbono e revertendo esse carbono em ganho de produtividade. O maior beneficiário será o próprio produtor rural.”

A reportagem acima foi publicada com o título “Carbono como aliado” na edição impressa nº 343, de setembro de 2024.

Projetos
1.
Centro de Pesquisa de Carbono em Agricultura Tropical (CCarbon) (no 21/10573-4); Modalidade Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepid); Pesquisador responsável Carlos Eduardo Pellegrino Cerri (USP); Investimento R$ 26.319.364,85.
2. Efeito da mudança do uso da terra e das práticas de manejo de cana-de-açúcar no C do solo, na saúde do solo e nos serviços ecossistêmicos associados: Uma síntese de evidências (no 23/11337-8); Modalidade Bolsa de Pós-doutorado; Pesquisador responsável Maurício Roberto Cherubin (USP); Bolsista Carlos Roberto Pinheiro Junior; Investimento R$ 244.824,36.
3. Implicações da expansão e intensificação do cultivo da cana-de-açúcar nos serviços ecossistêmicos do solo (nº 18/09845-7); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Maurício Cherubin (USP); Investimento R$ 158.472,12.
4. Dinâmica do carbono do solo e balanço de gases de efeito estufa: Implicações da remoção da palha de cana-de-açúcar para produção de bioenergia (nº 17/23978-7); Modalidade Auxílio à Pesquisa – Regular; Pesquisador responsável Ricardo Bordonal (CNPEM); Investimento R$ 83.507,09.

Artigos científicos
BORDONAL, R. O. et al. Carbon savings from sugarcane straw-derived bioenergy: Insights from a life cycle perspective including soil carbon changes. Science of the Total Environment. 11 jul. 2024.
DENNY, D. M. T. et al. Carbon farming: Nature-based solutions in Brazil. Green and Low-Carbon Economy. v. 1, n. 3, p. 130-7. 4 mai. 2023.
BIELUCZYK, W. et al. Greenhouse gas fluxes in Brazilian climate-smart agricultural and livestock systems: A systematic and critical overview. Journal of Cleaner Production. v. 464, 142782. 20 jul. 2024.

Livro
CHERUBIN, M. Guia prático de plantas de cobertura: espécies, manejo e impacto na saúde do solo. USP. jun. 2024.

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