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IMUNOLOGIA

Candidata a vacina do Butantan reduz em 89% o risco dengue grave

Composto é seguro e evitou que, em média, 67,3% dos imunizados desenvolvessem sintomas da doença

Renato Rodrigues / Comunicacão Instituto ButantanTécnica faz inspeção visual de lote da Butantan DVRenato Rodrigues / Comunicacão Instituto Butantan

Uma dose única e de apenas 0,5 mililitro (mL) da candidata a vacina contra a dengue do Instituto Butantan, a Butantan DV, proporcionou proteção duradoura e elevada contra a doença. Ela reduziu, em média, em 67,3% o risco de as pessoas apresentarem sintomas (leves, moderados ou graves) de dengue, mesmo passado um longo tempo de sua administração – em média, 3,7 anos.

Apresentado em artigo publicado em agosto na revista The Lancet Infectious Diseases, esse grau de proteção é um pouco inferior ao observado em um trabalho divulgado em fevereiro em The New England Journal of Medicine (ver Pesquisa FAPESP nº 324). Nele, a proteção geral da Butantan DV havia sido de 79,6%, mas medida dois anos depois da aplicação. Agora, com quase o dobro do tempo, a imunidade caiu um pouco, mas continua relevante.

O dado novo e mais importante revelado agora é que o imunizante proporciona proteção elevada contra os casos que mais preocupam. Ele diminui em 89% o risco de quem foi imunizado desenvolver dengue grave ou com sinais de alarme, uma vez exposto ao vírus. Produzida com uma versão atenuada das quatro variedades (sorotipos) do vírus da dengue, a Butantan-DV ofereceu proteção média de 64,6% dos 2 aos 6 anos de idade, de 70,6% dos 7 aos 17 anos e de 72,8% dos 18 aos 59 anos. Ela teve eficácia geral de 75,8% contra o sorotipo da dengue tipo 1 e de 59,7% contra o 2. Não foram detectadas infecções pelos sorotipos 3 e 4 durante essa fase de acompanhamento, concluída antes da epidemia deste ano, e, por ora, não se conhece o grau de proteção conferida pelo imunizante contra essas duas variedades do vírus.

“O ápice da proteção ocorre durante o primeiro ano da imunização, depois é normal haver uma queda na produção de anticorpos. Vamos seguir monitorando os dados, mas, até o momento, eles indicam que não há necessidade de se adotar dose de reforço”, explica Fernanda Boulos, diretora médica do Instituto Butantan e coordenadora dos ensaios clínicos com a Butantan DV, cujo desenvolvimento inicial teve financiamento da FAPESP.

Nos testes, 10.259 pessoas foram sorteadas para receber o imunizante, enquanto a 5.947 foi administrado um composto inócuo (placebo). Nem médicos nem participantes sabiam quem estava recebendo o quê. A frequência de eventos adversos foi maior entre os que tomaram a Butantan-DV (53%) do que entre os que receberam a injeção sem efeito (45,6%), em geral dor local, febre e manchas vermelhas pelo corpo. Já a taxa de eventos adversos graves foi semelhante nos dois grupos: 6,2% no primeiro e 6,6% no segundo.

“A vacina continuou bastante eficaz e com dados sólidos de segurança”, afirma o médico e virologista Maurício Nogueira, da Faculdade de Medicina de Rio Preto (Famerp), primeiro autor do artigo na The Lancet Infectious Diseases e coordenador de um dos centros de teste. “Não podemos nos dar ao luxo de ter uma vacina mais ou menos segura”, afirma.

Segundo Boulos, os novos dados estão sendo submetidos à Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), responsável pela aprovação de medicamentos e alimentos no país, e o pedido de registro do imunizante já foi solicitado. Agora, está em curso o processo de escalonamento de produção e de avaliação da qualidade do imunizante. “Concluída essa fase, conseguiremos dimensionar melhor nossa capacidade de produção”, afirma a pesquisadora. “Se tudo der certo, esperamos que a aprovação da Anvisa saia na primeira metade do próximo ano”, conta.

Em janeiro deste ano, o Ministério da Saúde incorporou a primeira vacina contra a dengue ao Sistema Único de Saúde (SUS), a Qdenga, fabricada pelo laboratório japonês Takeda, e destinada a crianças de 10 a 14 anos.

A reportagem acima foi publicada com o título “Proteção contra a dengue grave” na edição impressa nº 343, de setembro de 2024.

Artigos científicos
NOGUEIRA, M. L. et al. Efficacy and safety of Butantan-DV in participants aged 2–59 years through an extended follow-up: Results from a double-blind, randomised, placebo-controlled, phase 3, multicentre trial in Brazil. The Lancet Infectious Diseases. 5 ago. 2024.
KALLAS, E. G. et al. Live, attenuated, tetravalent Butantan-Dengue Vaccine in children and adults. The New England Journal of Medicine. 1º fev. 2024.

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