Depois de receber um impulso de desenvolvimento com os projetos genomas que se espalharam pelo mundo e pelo Brasil, a bioinformática começa a se destacar como uma importante área para a geração de inovação tecnológica. Um desses frutos originários da pesquisa genômica é um software produzido pela empresa Scylla, de Campinas, para o Instituto de Psiquiatria da Universidade de São Paulo (USP). É um sistema para identificar diferenças genéticas, chamadas de polimorfismo, nas seqüências de bases químicas formadoras dos genes, as famosas adenina, citosina, timina e guanina, também conhecidas como nucleotídeos. Uma seqüência ou apenas uma letra diferenciada – indicadora de uma dessas substâncias em determinado gene – pode levar, por exemplo, a uma predisposição para doenças mentais.
O software, chamado de Sistema de Identificação de Polimorfismos (SIP), vai servir para que os pesquisadores da USP possam identificar com mais facilidade essas diferenças e compará-las com a condição física da pessoa analisada, relacionando o polimorfismo à doença. “O SIP é uma ferramenta para verificar os polimorfismos de nucleotídeos únicos, ou SNPs, existentes no DNA. A grande maioria das pessoas tem sempre uma seqüência, como, por exemplo, ATTGCATG. Se acharmos no mesmo gene, mas em outra pessoa, a seqüência ATTGCTTG, portanto com uma troca do A pelo T, verifica-se primeiro se há algum erro no processo de obtenção dos dados e, se persistir a diferença, compara-se com a condição médica da pessoa”, explica o professor João Meidanis, do Departamento de Teoria da Computação do Instituto de Computação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e fundador da Scylla. Como sócios na empresa estão dois ex-alunos de Meidanis, Alexandre Corrêa Barbosa e Zanoni Dias. Eles formaram a Scylla em 2002 depois de um longo período como participantes da área de bioinformática dos projetos genomas das bactérias Xyllela fastidiosa eXanthomonas citri e da cana-de-açúcar, dos quais Meidanis foi um dos coordenadores.
Banco mundial
Somente no Genoma Humano são conhecidos mais de 4 milhões de SNPs. Eles são identificados como tal se estiverem presentes em 1% da população. O conhecimento sobre eles está registrado em bancos mundiais de polimorfismos, aos quais, com a ajuda do software, a equipe coordenada pelo professor Emmanuel Dias Neto, do Laboratório de Neurociências do Instituto de Psiquiatria do Hospital das Clínicas da USP, vai acessar para identificar e classificar os SNPs. “Essas informações serão úteis, por exemplo, para analisarmos um grupo de 500 pessoas, sendo 250 com esquizofrenia e 250 como grupo de controle sem a doença. Assim, verificamos as diferenças nas bases e as relacionamos com uma enfermidade”, explica Dias Neto. “Buscamos também polimorfismos que possam significar resistência a medicamentos.
Os SNPs podem ser responsáveis pela ineficácia de determinadas drogas em algumas pessoas. “A síntese de uma proteína alterada, causada por um determinado SNP, pode influenciar as ligações químicas que fazem o medicamento ser eficiente. “Existem indivíduos que respondem ao lítio (substância usada contra a depressão) e outros não. Queremos entender e caracterizar os genes ligados a essas respostas clínicas”, diz Dias Neto. Assim, o software desenvolvido pela Scylla poderá também servir a outros centros de pesquisa, laboratórios e para a indústria farmacêutica.
Clientes em rede
De forma prática, o software possui um servidor que permite a participação de vários clientes. Eles podem, assim, rodar o programa em rede local ou não, em ambiente Linux ou Windows. O SIP é o primeiro produto comercial da Scylla, empresa que recebeu investimentos financeiros da Votorantim Ventures, braço para capital de risco do Grupo Votorantim.