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Resenhas

Angola como nação formadora do Brasil

Horizontes comunitários sobre o sistema econômico e social angolano

Amundialização da economia capitalista divide o mundo  nos incluídos em suas redes de articulação e nos excluídos. Nem sempre essa territorialização é perfeitamente configurada e ocorrem periferias no território dos países do centro e de centros pontuais nas áreas dos Estados periféricos. O fluxo da rede  vai de quem possui a hegemonia para os subalternos. O efeito é perverso: ou se aceita a hegemonia ou se é excluído. Para entrar na rede, formas de poder são descartadas, inclusive a soberania nacional.

Ao enfraquecer soberanias nacionais, as novas redes do capitalismo informacional têm favorecido articulações de ordem comunitária. Observa-se do lado hegemônico o crescimento do poder das corporações que têm seus pés em determinados territórios sob a égide imperial norte-americana; do lado subalterno, os movimentos comunitários supranacionais procuram contrapor-se a essa lógica corporativa do poder imperial. É assim  que os brasileiros podem relevar duas formas de articulações: aquela que aponta para os países da América Latina e a que se articula com o sentido de publicação de Mamma Angola: Sociedade e Economia de um País Nascente, de Solival Menezes  – a  comunidade dos países de língua portuguesa. São articulações que se respaldam politicamente em dois organismos ainda pouco operantes: a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa e as chamadas Cimeiras Ibero-Americanas onde os países africanos de língua portuguesa são observadores.

Esse livro é uma boa oportunidade para que os brasileiros conheçam a história econômica e social de Angola, que mantém simetrias com o Brasil.  Dessa maneira, um olhar sobre Angola significa descobrir um Brasil que lá está. Poucos sabem que Angola foi praticamente colonizada pelo Brasil até sua independência em 1822. A influência econômica brasileira fez-se sentir nesse país até os finais do século 19, atrelada ao tráfico de escravos. Houve manifestações das elites angolanas para fazer uma confederação com o império brasileiro.

Do ponto de vista simbólico, Mamma Angola é uma expressão da identidade de Angola, uma identidade feminina, associada à terra-mãe, contrariamente ao poder paterno que a dominou, vinculado à representação política colonial. Nesse nível simbólico pode-se dizer que os escritores angolanos viram na literatura brasileira manifestações de uma fratria comunitária. Para o autor de Mamma Angola, do lado de cá do Atlântico, Angola não deve ser vista apenas como um país irmão, mas como “pátria-mãe”, ao lado dos portugueses.

Solival Menezes apresenta nesse livro uma visão sistêmica da dependência política, econômica e social de Angola, desde os tempos coloniais até às novas formas de dependência da atualidade, após os impasses do período da independência em 1975. Angola – um dos países mais ricos da África por suas riquezas minerais (extração de petróleo e de diamantes), a par de seu solo propício para a agricultura (foi grande produtor de café) – tinha tudo para construir um Estado nacional forte após a independência. Acabou  vítima da guerra fria que exacerbou rivalidades étnicas, dando origem a uma guerra civil que desestruturou toda a economia – situação que se quer reverter com problemáticos acordos de paz sob mediação da ONU, necessária para que se supere a perversidade do estado de guerra e da destinação militar da maior parte do PIB angolano.

Benjamin Abdala Junior é professor de Estudos Comparados de Literaturas de Língua Portuguesa da Universidade de São Paulo.

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