Fungos e bactérias quando presentes em equipamentos médicos e alimentos podem causar sérios problemas de contaminação e intoxicação. A solução, como se sabe, é esterilizar, eliminando esses minúsculos organismos, capazes de se multiplicar rapidamente. Para isso, um grande arsenal já foi desenvolvido para combatê-los, com substâncias químicas, calor e até com elementos radioativos. Agora, chegou a vez do plasma. Considerado o quarto estado da matéria, ele é produzido aplicando um campo elétrico intenso sobre alguns tipos de gases. A ação desse campo fornece energia aos íons e elétrons, que promovem colisões com os átomos e as moléculas. Essa situação deixa as moléculas excitadas, gerando radicais livres e radiação ultravioleta.
O resultado é uma ação conjunta contra membranas, enzimas e ácidos nucléicos que compõem as células dos microrganismos, destruindo suas funções vitais. A novidade nesse tipo de esterilizador é um equipamento dotado de uma câmara em que o processo é realizado a seco e a baixa temperatura, desenvolvido em Campinas por pesquisadores da empresa Sterlily com o apoio financeiro do Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE), da FAPESP. O primeiro protótipo do aparelho, chamado de Esteriliza 1000, está instalado na Companhia de Desenvolvimento do Pólo de Alta Tecnologia de Campinas (Ciatec), incubadora que abriga a Sterlily.
Ele já foi utilizado na esterilização de mais de 12 mil recipientes plásticos para cultivo de plantas clonadas, além de seringas descartáveis e potes para análise clínica.A agilidade do processo é uma das vantagens em relação a outros métodos. O tratamento térmico não elimina completamente alguns tipos de bactérias, resistentes a altas temperaturas. Além disso, o aquecimento exagerado provoca danos em materiais de baixo ponto de fusão, como a maioria das peças produzidas com polímeros. A radiação ultravioleta, muito utilizada, é eficiente apenas para superfícies diretamente expostas à radiação. A esterilização com óxido de etileno (ETO) é a que mais se assemelha ao processo com plasma. Mas, como é considerada cancerígena, vem sendo progressivamente rejeitada. Esterilização por irradiação de cobalto, também utilizada em materiais termicamente sensíveis, apresenta alto custo e requer área isolada.
Processo rápido
O ciclo de esterilização com plasma, com cerca de uma hora e meia para materiais plásticos, é considerado rápido. Com vários tipos de plasma e de tempos de exposição, de cinco a 20 minutos, é possível verificar a destruição do corpo da bactéria. A eliminação total é importante porque microrganismos, como a Escherichia coli, mesmo mortos, podem produzir toxinas. “Como padrão de validação do processo, usamos a bactéria Bacillus subtilis variedade niger, a mais resistente aos processos de plasma”, afirma Tadashi Shiosawa, que dirige a Sterlily em parceria com Tony Sadahito China e José Alonso Corrêa Júnior.
O processo a plasma é adequado também para esterilizar materiais orgânicos. “Atualmente, fazemos testes com cogumelos comestíveis, verificando as propriedades ativas do produto após a esterilização. No caso desses alimentos, promovemos redução da carga microbiana e não esterilização completa, para não matar o cogumelo”, explica Shiosawa.
Por enquanto, a maior demanda é a esterilização de produtos plásticos. Mas vidros e produtos metálicos também podem ser esterilizados com plasma. Para atender a um amplo leque de aplicações, o Esteriliza 1000 foi planejado para adaptar-se a diferentes parâmetros. O processo é controlado por computador, a partir de um software desenvolvido para o equipamento e de um microprocessador, que monitora a fonte de energia.
“Durante o desenvolvimento do projeto, no Laboratório de Física de Plasmas do Instituto de Física da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), fizemos experiências para saber como seria o processo de caracterização do plasma, acertando sua potência de acordo com a fonte de energia elétrica”, comenta Shiosawa. Isso porque, dependendo dos componentes e do ambiente no interior da câmara, tipos diferentes de plasma podem ser criados. Definidas as características, foram adequados os parâmetros em testes feitos no Laboratório de Microbiologia da Faculdade de Engenharia de Alimentos da Unicamp.
O equipamento é composto por um cilindro de aço inox. No interior é criado um ambiente com pressão reduzida para gerar vácuo. Dentro, gavetas vazadas recebem os materiais. Eles são envolvidos em uma embalagem de polipropileno, desenvolvida no Brasil para esse uso, composta de Trilaminado Não-Tecido (TNT), que permite a passagem de gases, mas impede a de microrganismos. Em seguida, gás de peróxido de hidrogênio (água oxigenada) é liberado no interior da câmara, onde é aplicado um campo elétrico de alta freqüência, que gera radiação ultravioleta. Esse tipo de esterilização possui aspectos específicos, como a baixa temperatura, de 35ºC a 40ºC, tornando-o apropriada para aplicação em vários materiais.
Os pesquisadores não chegam a apostar que a utilização de plasma deva substituir os demais processos, mas vêem vantagens, sobretudo no caso dos alimentos, por permitir redução controlada da carga bacteriana. Shiosawa diz que o custo de produção do Esteriliza 1000 varia de acordo com o uso. Mas ele reconhece que o preço de venda inicial, estimado entre R$ 400 mil e R$ 500 mil, é alto para o mercado interno.
Por isso, o foco da empresa, inicialmente criada para comercializar o equipamento, desviou-se para a prestação de serviços. A tecnologia empregada, à exceção do sistema de vácuo, importado da Alemanha e Inglaterra, foi desenvolvida no país. Depois de receber o registro do Ministério da Saúde, o equipamento estará pronto para ser inserido definitivamente no mercado.
O Projeto
Desenvolvimento de Esterilizador a Plasma (nº 97/07411-1); Modalidade Programa de Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (PIPE); Coordenador Tadashi Shiosawa – Sterlily; Investimento R$ 147.890,00 e US$ 18.494,75