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Óptica

Imagem tridimensional

Protótipo de TV 3D dispensa o uso de óculos especiais

José Lunazzi / UnicampA tecnologia televisiva em três dimensões (3D) é um dos grandes atrativos da Copa do Mundo da África do Sul para os torcedores que não tiverem a oportunidade de viajar e assistir aos jogos nos estádios sul-africanos. Vinte e cinco partidas do torneio – inclusive as três do Brasil na primeira fase da competição – estão sendo transmitidas em 3D, a mesma que conquistou milhões de espectadores mundo afora com a exibição do filme Avatar nos cinemas. A exemplo da superprodução dirigida por James Cameron, o telespectador precisa usar óculos especiais para ver as partidas em imagens tridimensionais, que dão a sensação de profundidade e relevo. No futuro, entretanto, especialistas estimam que a tecnologia 3D não será mais refém desse incômodo artefato no rosto, que gera desconforto e causa cansaço visual e dores de cabeça em algumas pessoas – sem falar no problema de higiene em compartilhar óculos no cinema. Em vários países estão sendo desenvolvidas pesquisas visando à criação de uma TV tridimensional que dispense o uso de óculos especiais. No Brasil, essa tecnologia ganha formato nos estudos de pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Liderados pelo professor Jose Joaquin Lunazzi, eles desenvolveram vários protótipos de um televisor tridimensional que exibe imagens holográficas. A holografia é uma imagem em três dimensões formada por um filme, chamado de holograma, gravado por meio de feixes de laser incididos sobre uma pessoa ou objeto. Na reprodução, utiliza-se laser ou luz branca.

“Nossa tecnologia, batizada de Holo TV, pretende liberar o uso de óculos e oferecer total conforto de visão. Ela não tem semelhança com sistema nenhum existente no mundo, mesmo em se tratando de protótipos”, explica Lunazzi. “Trata-se de imagens projetadas sobre telas quase transparentes, em que a falta de visão do suporte gera uma figura fantasma que as torna semelhantes às holográficas. A cena filmada pode ser vista sem óculos com a suavidade e a naturalidade de um holograma”, diz. Um dos pioneiros no país no estudo da holografia, Lunazzi iniciou suas pesquisas para a criação de uma TV tridimensional em 1984. Dez anos depois conseguiu apoio da Fapesp e adquiriu uma filmadora, um projetor, um filme holográfico, um aparelho de laser e uma objetiva fotográfica. Com esses instrumentos constituiu um sistema de geração e reprodução de imagens holográficas. Em 1988 apresentou o primeiro protótipo de seu televisor 3D holográfico.

Fora da tela
Assim como os aparelhos dotados da tecnologia 3D tradicional, que exigem o uso de óculos especiais, as TVs tridimensionais holográficas também projetam imagens para fora da tela, mas ainda precisam de certos ajustes para serem colocadas no mercado. Centros de pesquisa, como o Instituto de Tecnologia de Massachusetts (MIT), empresas de alta tecnologia, como a húngara Holografika, e grandes fabricantes de aparelhos eletrônicos trabalham para construir modelos comerciais. No ano passado, a fabricante holandesa Philips realizou testes de um televisor 3D que dispensava o uso de óculos, mas exigia que o telespectador se sentasse numa posição fixa diante do aparelho, sob risco de ver as imagens embaralhadas. Por conta dessa limitação, o desenvolvimento foi interrompido. O aparelho utilizava uma tecnologia conhecida como autoestereoscopia, em que as lentes da tela do aparelho criam múltiplas regiões alternadamente em frente à própria tela. Essa mesma tecnologia foi usada pela fabricante coreana Samsung em um protótipo mostrado ao público em janeiro deste ano durante a Consumer Electronics Show (CES) 2010, maior feira de eletrônicos do mundo, realizada em Las Vegas, nos Estados Unidos. Mais recentemente, em abril último, a empresa japonesa VMJ apresentou, numa feira de tecnologia em Tóquio, uma TV de 65 polegadas que exibe produções 3D sem a exigência de óculos. O protótipo possui sobre a tela uma espécie de película cheia de fendas, que leva o olho a ver uma imagem diferente, dando a noção de profundidade. A tecnologia fez sucesso, mas precisa vencer alguns obstáculos para se tornar comercial, como a redução de custo de produção e a dispensa da exigência de o telespectador permanecer em determinadas posições em relação ao visor para ver a imagem corretamente – mesma barreira enfrentada pelos modelos da Philips.

Jose Lunazzi / UnicampA tecnologia criada na Unicamp, de acordo com Lunazzi, não padece dessa dificuldade. “A pessoa pode mudar de posição quando quiser sem perder a ilusão da tridimensionalidade”, garante. Isso se deve à descoberta de um princípio óptico chamado de codificação-decodificação de profundidade por difração da luz. “Esse princípio foi desenvolvido por mim ao voltar de uma exposição de holografia na Alemanha, em 1984, e foi divulgado em um artigo na revista Optical Engineering, em 1990. Desde então não foi aplicado por ninguém. Temos avançado em nossas pesquisas, mas até agora só conseguimos criar imagens tridimensionais monocromáticas, sem cor nem brilho.” No começo do ano passado, Lunazzi escreveu, em conjunto com três colegas de seu grupo, um novo artigo na revista Optics Letters, descrevendo o sistema criado por eles, que tem uma tela de 30 por 60 centímetros. Um detalhe importante da tecnologia é que a tela, transparente e feita de filme fotográfico com sais de prata de alta resolução, é iluminada obliquamente de lado – diferentemente das telas convencionais que são iluminadas por trás ou pela frente. Esse aspecto é fundamental, segundo o pesquisador, para que o processo aconteça e o telespectador tenha liberdade de movimento sem perda da ilusão tridimensional das imagens.

Lunazzi já apresentou sua tecnologia em congressos realizados no Japão, China, Estados Unidos, Coreia do Sul e países da Europa. “A Holo TV tem caráter experimental, de protótipo. É útil para incentivar a pesquisa no mundo e mostrar que podemos ter pesquisa tecnológica de ponta no Brasil.” No estágio atual, ela poderia ser usada em estandes promocionais de empresas em feiras. Em 2008, pesquisadores da Samsung visitaram o laboratório de Lunazzi, no Instituto de Física da Unicamp, para conhecer uma nova técnica de holografia por dupla difração de luz branca sem a intermediação da lente existente na Holo TV. Mas não foi fechado nenhum acordo. O pesquisador acredita que a viabilidade comercial de sua TV tridimensional passe por uma parceria com um grande fabricante mundial de eletroeletrônicos que se interesse em investir nessa pesquisa.

O projeto
Geração de figuras e imagens tridimensionais (nº 93/02501-1); Modalidade Auxilio Regular a Projeto de Pesquisa; Co­or­de­na­dor Jose Joaquin Lunazzi – Unicamp; Investimento R$ 23.874,65 (FAPESP)

Artigo científico
LUNAZZI, J.J. et al. Holo-television system with a single plane. Optics Letters. v. 34, p. 533-35 (2009).

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