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Engenharia Civil

Inovação subterrânea

Manta aplicada sobre tubulação de água ou esgoto garante economia na instalação

Desde os tempos dos antigos romanos, os primeiros a utilizar estruturas enterradas, a engenharia sempre investiu no desenvolvimento de materiais para uso no subsolo. Hoje, sob nossos pés, funcionam uma série de serviços, como água, esgoto, telefonia e eletricidade, entre outros. São milhares de quilômetros de tubulações, das quais se pode facilmente imaginar o grau de importância econômica e social de suas funções. No entanto, a técnica de execução empregada para instalar essas obras obteve poucos avanços ao longo da história. Se for considerado o que ainda está para ser implantado em infra-estrutura subterrânea, nas telecomunicações e mesmo na eliminação de postes e o conseqüente aterramento de fios, é bem-vinda a notícia de um novo tipo de instalação de tubulações mais barato e mais raso, desenvolvido no Laboratório Geossintéticos do Departamento de Geotecnia da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de São Paulo (EESC/USP). O objetivo do grupo de pesquisadores, coordenados pelo professor Benedito de Souza Bueno, foi reduzir ao máximo as cargas sobre as tubulações, permitindo instalações mais próximas à superfície, sem o perigo de peso excessivo e com a possibilidade de utilização de dutos mais flexíveis.

Resistente e durável
Chamada de projeto Geovala, a técnica utiliza materiais geossintéticos — produtos manufaturados à base de poliéster ou polipropileno, formados por mantas e grelhas de alta resistência e durabilidade — sobre as valas subterrâneas, criando um espaço vazio onde é instalada a tubulação. Assim, todo o peso fica distribuído para fora da área da vala, que fica livre do excesso de carga. A proposta nãoé desenvolver novos tipos detubulações, mas modificar a maneira como elas são instaladas, com a utilização dos mesmos geossintéticos usados na construção de estruturas de arrimo em solo reforçado, lagoas de contenção de resíduos, impermeabilização e drenagem. Benedito Bueno, que é engenheiro civil, acredita na técnica como uma importante e inovadora solução para a instalação dos condutores subterrâneos. Ele é o orientador da tese de doutoradoVala para Acomodação de Estruturas Enterradas e Processo de Acomodação de Estruturas Enterradas, desenvolvida na EESC/USP pelo pesquisador Paulo Márcio Viana com bolsa da FAPESP.

A técnica é apropriada tanto para ser usada em tubulações feitas com metais mais específicos, como é o caso das aplicadas em oleodutos e gasodutos, quanto em tubulações em policloreto de vinila (PVC) e polietileno de alta densidade (PEAD), indicadas para uso geral. O material empregado na tubulação pode ser de qualquer natureza, porque a inovação, neste caso, se encarrega de minimizar ou mesmo eliminar as cargas verticais na região da vala, que é coberta pelo geossintético antes de ser aterrada. O peso da terra sobre a manta, que absorve as cargas verticais como se fosse uma membrana tracionada mas permite a passagem de elementos líquidos, como a água da chuva, faz com que o produto crie uma envergadura sobre o vazio na vala, livrando a tubulação do excesso de peso. Livres desse excesso, as tubulações podem ser maiores, menos espessas e, conseqüentemente, mais flexíveis. Se por um lado tubos mais largos ganham em flexibilidade, por outro aumentam também os riscos de deterioração do material. Porém, quanto menor as cargas sobre a tubulação, mais seguro é o sistema, pois, com maior resistência à pressão das cargas nos tubos, a vala pode ser mais rasa — de 1,5 metro para apenas 0,5 metro de profundidade —, o que torna a instalação menos onerosa, entre 30% e 40%, segundo cálculos de Bueno. Verifica-se ainda o benefício ambiental, porque a técnica ajuda a diminuir a possibilidade de vazamentos e de contaminação do solo.

Técnica apurada
A elevada capacidade dos materiais geossintéticos em sustentar cargas de tração foi o que inspirou os pesquisadores da Escola de Engenharia de São Carlos a empregarem o produto, que vem sendo cada vez mais utilizado em obras de contenção pelas empresas de engenharia civil e geotécnica. Ele possui excelente desempenho, aliado a um custo-benefício considerado extremamente favorável, sobretudo quando aplicado em grande escala. A possibilidade de aumentar a vida útil das valas com maior rapidez na execução de obras de condutos enterrados a custos menores é uma combinação que Bueno espera ser suficiente para despertar o interesse de empresas pelo Geovala.

Durante quatro anos, todas as possibilidades de pressões de solo foram testadas e registradas pelos pesquisadores, com variação nos tipos de tubos empregados, tipos de solo e de cargas, numa modelagem física em verdadeira grandeza. Os resultados foram compilados por meio de uma simulação por computador, em softwares de modelagem numérica. Também foram realizados testes em grandes dimensões, sobre uma laje de reação, em uma caixa de aço de 2 metros de altura por 1,8 metro de largura, onde foi enterrado um tubo de 400 milímetros de diâmetro e 2 metros de comprimento, reproduzindo uma série de situações que simulavam condições reais de uso. Depois de aterrada a vala e instalado o geossintético, foi também aplicada uma sobrecarga, simulando pesos extras, representando veículos ou obras na superfície. Após o dimensionamento das cargas e a variação do peso do próprio solo, pôde-se selecionar o tipo de geossintético mais adequado a cada caso.

A Geovala aplica-se a qualquer tipo de uso, como coleta de esgotos, gás, óleo ou fiação elétrica e de telefonia, e as profundidades podem ser aplicadas de acordo com as condições ambientais e a capacidade do geossintético utilizado, que pode variar, dependendo do tipo de solo e material empregado nas tubulações. Outra vantagem apontada pelos pesquisadores da Geovala, nos casos de tubos monitorados internamente para detectar vazamentos ou problemas de corrosão, é a possibilidade de se fazer esse monitoramento externamente, o que ampliaria também a segurança das estruturas enterradas. Como o processo permite a criação de um vazio onde o tubo repousa, podem se instalar sensores com registro remoto nesse espaço para medir as características mecânicas do tubo.

Escala industrial
A técnica desse novo tipo de aterramento de tubulação teve uma patente depositada no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI) com financiamento do Núcleo de Patenteamento e Licenciamento de Tecnologia (Nuplitec) da FAPESP. Segundo Bueno, a técnica é inédita no mundo e já despertou o interesse de empresas dos setores público e privado, que atualmente negociam o direito de aplicação da técnica. Como os produtos empregados já são produzidos em escala industrial e estão disponíveis comercialmente, a expectativa dos inventores é que o aumento do uso desses materiais com a tecnologia Geovala faça cair o preço do geossintético e das tubulações.

Os projetos
1. Condutos enterrados: redução de esforços sobre a estrutura (nº 98/07444-0); Modalidade Linha regular de auxílio à pesquisa; Coordenador Benedito de souza Bueno — EESC/USP; Investimento R$ 151.218,97
2. Geovala — uma solução técnica para reduzir tensões verticais em tubulações enterradas (nº 01/13245-4); Modalidade Programa de Apoio à Propriedade Intelectual; Coordenador Benedito de Souza Bueno — EESC/USP; Investimento R$ 6.000,00

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