imagem: nature
Transportadas pelas hemácias, as células vermelhas do sangue, as moléculas de hemoglobina são feitas de quatro subunidades, cada uma contendo um íon de ferro que reage facilmente com outros elementos químicos, especialmente com átomos de oxigênio. Isso faz da hemoglobina a principal difusora do oxigênio pelos tecidos do corpo.
Quando porém essa proteína sai das hemácias, ela se separa em dois dímeros (cada um com duas subunidades), deixando os íons de ferro muito expostos. Altas concentrações de hemoglobina nessa forma podem ser tóxicas. O problema é mais agudo nos rins, onde há a tendência de essa molécula se acumular por ser a função do órgão depurar o sangue. Também sofrem com esse distúrbio os pacientes de certas doenças hereditárias e portadores do parasita da malária, cujas hemácias são constantemente rompidas e liberam excesso de hemoglobina no plasma.
O organismo humano tem um mecanismo natural para eliminar o excesso dessa proteína. Há em circulação no sangue outra proteína, a haptoglobina, que se liga aos dímeros de hemoglobina, envolvendo e neutralizando seus íons de ferro. Esse complexo hemoglobina-haptoglobina (Hb-Hp) por sua vez é retirado do sangue por células denominadas macrófagos. Essas células fazem isso por meio de proteínas chamadas receptores CD 163. Através da ligação a locais específicos, os receptores “fisgam” e retiram os complexos Hb-Hp da circulação sanguínea.
A estrutura átomo por átomo da hemoglobina é conhecida desde 1959, quando pesquisadores conseguiram crescer um cristal da macromolécula e observar como ela interfere na pas-sagem de raios X, fenômeno conhecido como difração. Mas até recentemente não havia sido possível fazer o mesmo com a haptoglobina e o complexo Hb-Hp. “A dificuldade principal era a forma peculiar da haptoglobina, difícil de cristalizar”, explica Oliveira.
Sob coordenação do biomédico Soeren Moestrup, da Universidade de Aarhus, Dinamarca, os pesquisadores iniciaram em 2006 a busca pela condição ideal para purificar e cristalizar as substâncias desejadas. O esforço aliou diversas técnicas bioquímicas e biofísicas. Oliveira colaborou na análise de como os raios X são espalhados pelas moléculas em solução aquosa. A técnica permitiu a confirmação de que o formato das moléculas cristalizadas é o mesmo daquelas dissolvidas em água. As estruturas em alta resolução obtidas mostram como a haptoglobina se forma a partir de duas subunidades (em azul-claro e azul-escuro na figura), conectadas de uma maneira nunca antes vista em proteínas. Mostram ainda como se forma o complexo Hb-Hp e este se liga aos receptores CD 163.
Artigo científico
ANDERSEN, C.B.F. et al. Structure of the haptoglobin–haemoglobin complex. Nature. v. 489. 20 set. 2012.