A capa desta edição trata de um assunto a princípio conhecido por todos, a importância da dieta equilibrada das gestantes e dos bebês para que estes cresçam saudáveis. A obviedade do tema, porém, é apenas aparente. Sempre se soube que recém-nascidos amamentados só com leite materno nos seis primeiros meses de vida, filhos de mulheres que se alimentaram corretamente durante a gravidez, têm grande chance de se tornarem menos suscetíveis às doenças. O que não se conhecia e foi revelado por pesquisadores que trabalharam em estudos populacionais em países em desenvolvimento é que há um período específico em que os pais devem agir para diminuir o risco de transformar uma criança saudável em um adulto obeso. Esse espaço de tempo foi chamado de mil dias de oportunidade. Trata-se dos 270 dias da gestação somados aos 730 dos dois primeiros anos de vida em que os cuidados com a dieta devem ser constantes. O relato é do editor de ciência, Ricardo Zorzetto, a partir da página 16.
Um tema mais espinhoso é tratado pelo editor de política científica e tecnológica, Fabrício Marques. Ele conta os embates entre o Ministério do Meio Ambiente e cientistas que dependem de coletas de espécies retiradas da natureza para fazer pesquisa (página 28). Para cada trabalho é preciso pedir autorização, que, em alguns casos, pode levar anos para sair. As razões do ministério são de ordem legal, já que atua para evitar o contrabando da biodiversidade brasileira. O excesso de rigidez burocrática acaba por emperrar linhas de pesquisa em todo o país, embora haja a promessa de se diminuir as exigências. Quem decide não esperar pelos trâmites excessivamente demorados ou não cumpre com rigor o que é exigido recebe multas pesadas que chegam frequentemente a milhões de reais.
Na editoria de tecnologia voltamos às boas notícias: o Instituto de Física da Universidade de São Paulo já tem um novo acelerador de partículas funcionando, segundo relata o editor Marcos de Oliveira (página 66). Os testes iniciais do mícrotron, que acelera elétrons até perto da velocidade da luz, começaram em agosto. O equipamento foi projetado e construído por pesquisadores brasileiros. Com ele será possível fazer pesquisa básica e com finalidades médicas, como estudos sobre a interação entre radiação e corpo humano. Também em tecnologia, destaque para uma nova ferramenta biotecnológica que permitirá usar marcadores moleculares para identificar os animais – no caso, bovinos – com predisposição genética para ter carne mais macia, de acordo com reportagem de Evanildo da Silveira (página 70). O trabalho ganha importância quando se sabe que o Brasil tem o segundo rebanho do mundo – o primeiro está na Índia – e é o segundo maior produtor de carne, atrás dos Estados Unidos.
A relação entre o Brasil e o automóvel é o tema da principal reportagem da editoria de humanidades, escrita pelo editor Carlos Haag (página 80). Ele conta que, por décadas, o carro foi transformado em força motriz do progresso nacional e fonte de poder e hierarquização. Segundo os pesquisadores entrevistados, mesmo que fosse um bem de consumo ao qual apenas uma parcela ínfima da população tinha acesso, o carro mobilizou a atenção dos poderes públicos e largas fatias do orçamento em prol do asfalto nas cidades e das estradas. Essa origem da introdução do automóvel no Brasil tem efeitos até hoje, já que o frequente comportamento tão pouco civilizado observado no trânsito das cidades brasileiras resulta do fato de todos se sentirem superiores aos pedestres apenas por estarem no volante.
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