O texto mais antigo cujo autor é conhecido ganhou uma tradução em inglês moderno, acessível aos leitores comuns. Há pelo menos 50 anos já se sabia que o primeiro autor conhecido da história era uma mulher. Ocorre que os textos eram guardados a sete chaves, disponíveis apenas para poucos estudiosos. Agora, uma analista junguiana aliou-se a especialistas na antiga civilização assíria, oriunda da Mesopotâmia, e traduziu pela primeira vez os escritos da sacerdotisa Enheduanna, filha do rei Sargon, que viveu há cerca de 4 mil anos na cidade de Ur, atual sudeste do Iraque. Enheduanna foi a mais alta autoridade religiosa na Mesopotâmia por volta de 2300 anos a.C.. Seus textos, escritos na linguagem cuneiforme (em forma de cunha, gravada em tábuas de barro), são poesias em homenagem a uma deusa chamada Inanna, adorada pela sacerdotisa.
O material vem sendo estudado de modo esparso desde sua descoberta, no começo do século 20. Com a ajuda de especialistas na cultura e língua da Mesopotâmia da Universidade da Califórnia, em Berkeley, Estados Unidos, a psicóloga Betty DeShong Meador reconstruiu os poemas linha por linha. O resultado é uma poesia repleta de luta, agonia, êxtase e louvor. E o mais surpreendente: há mais de 4 mil anos, uma mulher já escrevia sobre uma representação feminina como poucos o fizeram depois. “Na concepção de Enheduanna, a deusa Inanna abria novos caminhos para diferentes visões da mulher”, diz Betty, que publicou o livro Inanna, Lady of Largest Heart (University of Texas Press, Austin). Inanna é mostrada de maneira profundamente humana, como uma mulher feroz e cruel, mas também amorosa e doce. “Ninguém na religião ocidental toca nesse ponto como ela.”
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